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BRASIL

Renato Feder, convidado por Bolsonaro ao MEC, comparou escola com lanchonete

Vinícius Prado, de Curitiba, PR
Geraldo Bubniak/ANPr

Renato Feder é indicado pelo presidente Bolsonaro para o Ministério da Educação

Após a desastrosa indicação que Carlos Decotelli para o Ministério da Educação, o presidente Jair Bolsonaro convidou para o MEC um nome que já havia sido cotado anteriormente. Renato Feder, CEO da Multilaser Feder, pode desembarcar em Brasília com a experiência de um ano e meio a frente da Secretaria de Estado da Educação do Paraná, um histórico de ataques aos servidores, precarização das condições de ensino e entregas de orçamento público ao setor privado.

Além de ser um dos donos da Multilaser, gigante do setor de informática e empresa que em 2014 financiou movimentos contra o governo do PT, Renato Feder é um dos herdeiros do grupo Elgin, um império empresarial que, há mais de 60 anos, atua na área de refrigeração, aquecimento solar, entre outros. Bolsonaro está entregando o Ministério da Educação nas mãos de um legítimo representante do andar de cima. Feder não só atua a serviço dos interesses da grande burguesia, como faz parte dela.

Renato Feder defende uma lógica ultraliberal não só na sua concepção sobre educação, como em sua concepção sobre Estado. Ele deixa isso muito claro no livro que escreveu com seus sócio na Multilaser Alexandre Ostrowiecki, “Carregando o Elefante Branco: como livrar-se das amarras que impedem os brasileiros de decolar”. Neste livro, Feder e Ostrowiecki defendem a total privatização da educação, fim de maioria dos ministérios, inclusive do MEC e de Ministérios Militares.

Assim como é melhor que uma empresa privada frite hambúrgueres do que o governo, o mesmo ocorre no caso de uma escola

De uma forma bastante rasteira, como os livros de auto-ajuda de prateleiras de rodoviárias, em seu livro, o possível ministro privatista compara a escola com uma lanchonete. “As razões para privatizarem-se escolas e universidades são basicamente as mesmas já expostas: a iniciativa privada é intrinsecamente mais eficiente na gestão de qualquer coisa. Assim como é melhor que uma empresa privada frite hambúrgueres do que o governo, o mesmo ocorre no caso de uma escola.” (p. 119)

Em artigo publicado em 2018, no portal Esquerda Online, “Renato Feder: Quem é e o que pensa sobre educação o secretário do Governo Ratinho Júnior, no PR” podemos ver os principais trechos do que defende o novo ministro da Educação como política pública para a educação. Em suma, Feder parte de uma análise de que a culpa de todos os problemas educacionais são de responsabilidade dos e das professoras, faz afirmações em que aponta como problema o fato de os estudantes terem aulas com “professores semianalfabetos”, e ainda aponta, sem nenhuma referência de fonte de dados, como aliás é todo seu livro, que os jovens que procuram licenciatura eram os piores alunos na escola, e que isso explica a má qualidade dos professores que temos na educação básica atualmente.

Após um diagnóstico que culpabilizar os e as professoras, e não reconhece a presença de outros trabalhadores da educação no processo educacional, Feder e Ostrowiecki apontam como solução uma total submissão do sistema público de educação a lógica do mercado, isso se daria inicialmente a partir de uma política de Vouchers, onde o governo daria o crédito para os pais escolherem qual escola colocar seus filhos, mas as escolas poderiam cobrar taxas para além da verba recebida através de voucher, ou seja, continuaríamos tendo escolas de excelência para os filhos da elite, e escolas cada vez mais precárias para os filhos da população mais pobre, afinal quanto mais a escola economizar maior será seu lucro.

Mas no próprio livro os autores apontam que a política de Voucher deve ser aplicada em todos os níveis de ensino como uma política transitória, pois o grande o objetivo deve ser o de entregar todo o sistema de ensino, da educação infantil a pós-graduação ao setor privado, e caberia ao poder público apenas fiscalizar e ranquear as instituições de ensino para que a população possa saber quais são as melhores a se escolher.

Desde que seu nome começou a ser ventilado para o MEC, Feder já foi questionado algumas vezes sobre este livro e as políticas ali defendidas. O novo ministro tem afirmado repetidamente que se trata de algo que escreveu muito jovem e que já não pensa daquela forma. Porém, em momento algum explicou quais as posições que mudaram, e o que ele defende sobre isso agora.

PROCESSOS NA EDUCAÇÃO DO PARANÁ

Sua atuação a frente da Secretaria de Educação do Paraná nos mostra que, se alguma coisa mudou na forma de pensar do Renato Feder, pode ter sido na forma de atuar, mas não na concepção de educação e Estado. Em um período de um ano e meio a frente da SEED-PR, Feder implementou inúmeras políticas de ataque aos servidores e à educação pública. Sob sua gestão foi extinta a carreira dos e das funcionárias de escola e aprovada a terceirização destes serviços, contrariando um histórico de atuação com software livre a gestão Feder assinou parcerias  com multinacionais, ainda tivemos demissões de professores temporários, cortes em verbas para as escolas, entre outros ataques.

Porém a grande propaganda de Feder sobre sua gestão é a partir do sistema de aulas remotas. A SEED-PR gastou mais de 22 milhões de reais sem licitação para implementar um sistema sem nenhum planejamento, sem debate com a comunidade, onde mais de 60% dos alunos não conseguem ter acesso e que até o momento tem servido apenas para entregar milhões do orçamento público as empresas “amigas” de Feder e Ratinho. Utilizaram a pandemia para avançar nas implementação de políticas ultraliberais na educação do Paraná.

Feder e Alexandre Ostrowiecki  são parceiros também em um processo por sonegação de ICMS. Segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro e de São Paulo, a Multilaser sonegou mais de 22 milhões de reais em impostos aos dois estados, e por isso os empresários são alvos de processo. Mas, aparentemente, responder processo é um requisito para fazer parte do governo Bolsonaro.

Com Feder no ministério Bolsonaro faz um aceno ao mercado e ao centrão ao mesmo tempo, pois indica alguém altamente comprometido com a submissão das políticas educacionais a lógica do mercado e ao mesmo o novo ministro vem apadrinhado pelo principal governador do PSD, um dos principais partidos do centrão, que recentemente já havia ganhado o Ministério das Comunicações de presente do Bolsonaro.

Dificilmente aparecerá um ser humano mais abjeto que Abraham Weintraub em qualquer cargo público desse país, mas do ponto de vista de ataque à educação pública Renato Feder já demonstrou que pode ser muito pior que Weintraub. Pois, enquanto o ex-ministro estava preocupado com sua guerra cultural contra os comunistas, a China, o STF, o Congresso, o novo ministro já demonstrou na sua atuação no Paraná que sabe muito bem articular com os demais poderes para aprovar suas políticas, e esse será seu foco. Sai um “soldado do Olavismo” e entra um “soldado do capital”.

 

**Vinícius Prado é trabalhador da educação, historiador, mestre em educação pela Universidade Federal do Paraná e pesquisador na área de políticas educacionais. Produz o canal Papo de Classe no Youtube.

 

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