Morreu no último dia 30 de agosto, aos 91 anos, Mikhail Gorbatchóv, último secretário-geral do PCUS (1985-1991) e primeiro e último presidente da URSS (1990-1991). A morte de Gorbatchóv já era esperada há algum tempo, visto que pelo menos desde 2011 ele vinha enfrentando uma série de problemas de saúde relativamente graves, ligados à idade avançada. Pelo que se sabe dos boletins médicos divulgados, Gorbatchóv tinha problemas cardíacos, renais, de coluna e diabetes.
Logo após a morte do ex-líder soviético, a imprensa liberal de todo o mundo cantou odes à sua obra, lembrando seus esforços por “acabar com a guerra fria” e para implementar uma democracia de tipo ocidental no território da ex-União Soviética. Por sua vez, os meios stalinistas e putinistas o descreveram como um traidor e vende-pátria, que teria sido o principal responsável pela desagregação da “Rússia histórica” e, em última instância, culpado pela guerra fratricida que ocorre no presente momento no território ucraniano.
Passados 30 anos do fim da URSS, a morte de Gorbatchóv nos permite uma reflexão mais aprofundada sobre seu papel no desmantelamento do Estado soviético e na tragédia civilizacional que assolou a Rússia durante os anos 1990, e cujas consequências vivenciamos até hoje.
Mikhail Sergueievitch Gorbatchóv nasceu em 1931 no Cáucaso Norte (sul da URSS) em uma família camponesa típica. Aos 10 anos, o garoto enfrentou 6 meses de ocupaçãpo nazista na região, enquanto seu pai lutava na guerra. Com 15 anos começou a trabalhar de tratorista em uma fazenda coletiva e aos 19 se tornou aspirante a membro do PCUS por recomendação de professores e do diretor da escola em que estudava. Em 1950 ingressou na Universidade Estatal de Moscou para estudar Direito. Em 1952 foi finalmente aceito no PCUS e em 1955 conclui com louvor a faculdade, sendo designado para trabalhar na região de Stavropol, também no sul da URSS. Gorbatchóv teve uma típica carreira de burocrata soviético e partidário, primeiro nas estruturas da Juventude Comunista, depois subindo a escada do próprio PCUS, até que em 1971 chegou ao Comitê Central do PCUS, sob a proteção dos então poderosos Iuri Andropov (KGB), Mikhail Suslov (trabalho ideológico) e Andrei Gromiko (relações exteriores). A chave para a ascenção meteórica de Gorbatchóv foi seu trabalho à frente da agricultura da região de Stavropol, onde obteve colheitas expressivas.
Em 1978, Gorbatchóv foi eleito para o Secretariado do CC do PCUS, mudando-se com a família para Moscou e em 1980 já era membro do Politbureau do CC do PCUS. Foi nessa condição que, em 1985, após a morte de Konstantin Tchernenko, Andrei Gromiko propôs seu nome para secretário-geral do PCUS, ou seja, chefe supremo do Partido e do Estado. Gorbatchóv teve sua nomeação confirmada em 11 de março de 1985 em uma reunião do Politbureau do PCUS.
Mikhail Sergueievitch tinha então 54 anos e era um dos mais jovens e dinâmicos membros da alta cúpula soviética. Herdou um país em crise, que vinha de pelo menos 20 anos de estagnação política e econômica, sendo dirigido por uma nomemklatura cuja média de idade não baixava dos 70 anos.
Mas o pior era a crise econômica. A economia soviética perdera dinamismo. Há anos que o ascenso econômico do pós guerra havia se encerrado e o parque industrial e agrícola no enorme país se encontrava em um atraso técnico profundo, com sua produtividade muitíssimo atrás dos centros mais dinâmicos do capitalismo mundial. Gorbatchóv começou promovendo uma renovação dos quadros dirigentes soviéticos. No início de 1987 a renovação atingira 70% dos membros do Politbureau, 60% dos secretários regionais e 40% dos membros do CC.
Pouco se sabe, mas a primeira iniciativa econômica de Gorbatchóv não foi a perestroika, mas sim a “uskorenie”, que pode ser traduzida como “aceleração”. Como o nome sugere, a “aceleração” não buscava mudar as bases econômicas do país, mas apenas obter um melhor rendimento do trabalho com medidas paliativas, principalmente o incentivo ao interesse pessoal no trabalho, o combate ao desperdício e a luta contra o burocratismo e outros fenômenos que impediam o desenvolvimento dinâmico da sociedade. É desse período, por exemplo, a famosa campanha governamental contra o alcoolismo e suas consequências. Ao fim e ao cabo, a “aceleração” levou a uma desorganização ainda maior da economia e ao aprofundamento da crise econômica e social. No final de 1986, 25% das empresas não cumpriram o plano estatal e o déficit orçamentário subira para 17 bilhões de rublos e continuava a crescer. O governo reconheceu o fracasso. Estava aberto o caminho para a perestroika.
A perestroika
“Perestroika” quer dizer “reconstrução”, “reestruturação” ou até mesmo “reorganização”. O termo surgiu como verbo pela primeira vez em maio de 1985, quando, em uma visita a Leningrado, Gorbatchóv, em discurso ao coletivo partidário da cidade, declarou: “Pelo visto, camaradas, todos nós precisamos nos reorganizar (reestruturar). Todos!”. Mais tarde, em janeiro de 1987, o Pleno do CC do PCUS adotava a política da perestroika, que deveria significar: “a democratização de todos os aspectos da vida da sociedade soviética”, reforma de todas as instituições políticas e, sobre essa base, a construção de um novo modelo de sociedade, o “socialismo com rosto humano”. O primeiro passo seriam novas eleições para os Soviets de todos os níveis com a participação de vários candidatos, o que deveria ser, de agora em diante, regra da sociedade soviética. Na esfera econômica, a perestroika deveria significar maior autonomia às empresas e sua atuação segundo os princípios da livre concorrência.
Interessante observar que, no início da perestroika, Gorbatchóv negava qualquer possibilidade de uma volta ao capitalismo. Ao contrário, a perestroika era apresentada todo o tempo como um “retorno a Lênin”:
No Ocidente há diversas interpretações da perestroika, inclusive nos EUA. Existe o ponto de vista de que foi necessária devido ao estado desastroso da economia soviética e que significa o desencanto com o socialismo e uma crise de seus ideais e fins últimos. Nada poderia estar mais longe da verdade, sejam quais forem os motivos ocultos de tal interpretação.
A perestroika, naturalmente, foi em grande parte incentivada por nossa insatisfação com o rumo que as coisas estavam tomando em nosso país nos últimos anos. Mas foi muito mais inspirada pela consciência de que o potencial do socialismo não tem sido utilizado totalmente. (GORBATCHEV, s.d., p. 9)
Justificativas à parte, o fato é que em junho de 1987 foi aprovada a Lei de Empresas, que deveria entrar em vigor a partir de 1º de janeiro de 1988. A lei definia as novas funções dos ministérios de cada um dos ramos da indústria como sendo de elaboração da estratégia geral de desenvolvimento do setor, além da definição da parte estatal do plano anual. A mesma lei definia que os pedidos estatais não deveriam ultrapassar 85% da produção da empresa. Tudo que a empresa produzisse acima do pedido estatal poderia ser vendido a preços de mercado. As empresas podiam agora estabelecer relações diretas entre si, sem o intermédio da “Gosplan” (Plano Estatal, uma espécie de ministério do planejamento). A lei também previa a gradativa diminuição do percentual estatal da produção. Com o desenvolvimento ainda incipiente do mercado, cerca de 30% das empresas tornaram-se deficitárias, passando a buscar pedidos estatais a qualquer custo.
No âmbito internacional, Gorbatchóv também passou à ofensiva política e ideológica. Em vários países foi editado seu livro Perestroika – novas idéias para meu país e o mundo, cuja idéia central estava na superioridade dos valores humanos universais com relação aos valores de classe. O imperialismo imediatamente percebeu para onde apontava a perestroika de Gorbatchóv e lhe prestou amplo apoio. O simpático secretário-geral, que conversava com o povo e falava de paz, se tornou o xodó da imprensa mundial, embora nos bastidores a pressão por mais concessões econômicas, militares e políticas por parte da URSS continuassem (é conhecida, por exemplo, a postura duríssima de Reagan nas conversações de paz com Gorbatchóv em Genebra em 1985).
No verão de 1987 foi anunciada a política de abertura democrática, denominada glasnost, palavra que pode ser traduzida como “publicização” ou ainda “transparência”. Essa política incluía um sensível enfraquecimento do regime de censura, a libertação de vários dissidentes, além de outras medidas de cunho democrático.
O outro pilar fundamental da perestroika, além da liberalização das relações entre as empresas estatais, era a introdução concreta da propriedade privada no mercado soviético, o que foi obtido com a assim chamada Lei das Cooperativas, promulgada em julho de 1988. Essa lei liberava a criação de cooperativas, ou seja, empresas privadas controladas por coletivos, no âmbito do comércio e serviços. O que aconteceu na prática é que as cooperativas começaram a comprar mercadorias a preços estatais e a revendê-las a preços exorbitantes.
Como resultado da desregulamentação da economia, a dívida externa da URSS atingiu 40 bilhões de dólares em 1988, chegando a 57,6 bilhões em 1990. O déficit orçamentário atingiu 11% do PIB e a dívida pública passou a corresponder a 2/3 da renda nacional. A URSS começou a caminhar rapidamente em direção a se tornar uma semi-colônia econômica.
Consequências mais profundas da perestroika
O mais importante da perestroika não foram as medidas em si, mas o fato de que essas medidas desencadearam um processo no seio da sociedade soviética que já não era possível controlar. Ao liberalizar a economia, Gorbatchóv libertou o mais faminto dos monstros, o kraken capaz de destruir toda e qualquer conquista do socialismo: o apetite burguês e pequeno-burguês da população em geral e da burocracia em particular.
Note-se que a perestroika de Gorbatchóv, apesar de seu longo alcance estratégico, tinha algo de tímido: não previa a privatização da propriedade estatal. Podia-se criar novas empresas, mas não se podia comprar uma empresa do Estado. Pois foi exatamente esta bandeira que um setor da burocracia começou a levantar contra Gorbatchóv: Privatização!
Essa demanda se expressou no conflito entre Gorbatchóv, dirigente do Estado soviético, e Boris Ieltsin como representante de um setor da burocracia que não tinha tempo a perder, criticava Gorbatchóv por sua indecisão e exigia um plano concreto e ainda mais ousado de transição ao mercado. Assim, a “questão nacional” na URSS se alimentava tanto de uma opressão real, exercida por grão-russos contra as nacionalidades oprimidas por séculos a fio, como também de manobras realizadas pela direção das repúblicas em busca da gigantesca propriedade estatal. É conhecida a frase de Ieltsin, em seu estilo grosseiro típico, “Peguem o tanto de soberania quanto possam engolir”, dita por ele em um discurso em Kazan em agosto de 1990, referindo-se à demanda por soberania nacional.
Assim, para usar uma imagem de Marx, Gorbatchóv se parecia ao mago que já não conseguia controlar as forças que despertara. Aconteceu com ele exatamente o que previra Trotski em 1936 em seu clássico A revolução traída (1991, pg. 10-11):
A questão formulada por Lênin “Quem vencerá?” diz respeito à correlação de forças entre a URSS e o proletariado revolucionário mundial, de um lado, e às forças inimigas internas e o capital mundial, de outro. Os sucessos econômicos da URSS permitem fixar-se, movimentar-se, armar-se e, quando preciso, recuar e esperar, em uma palavra, manter-se. Mas pela sua própria essência, a questão “Quem vencerá?”, não só no sentido militar, mas sobretudo no sentido econômico, se põe perante a URSS num plano mundial.
A intervenção militar é perigosa, mas a intervenção das mercadorias baratas no comboio dos exércitos capitalistas seria incomparavelmente mais perigosa. (grifo nosso)
Todo o alerta feito por Trotski em A revolução traída vai nesse sentido: o maior crime da burocracia soviética é que, com sua política de desenvolvimento econômico nacional isolado, desperta os ânimos restauracionistas internos à própria sociedade. Ou seja, a justa demanda por soberania ou mesmo independência nacional era instrumental para Ieltsin e o setor burocrático que ele representava.
Das críticas ao burocratismo, opressão nacional e falta de democracia, Ieltsin passou logo ao verdadeiro plano, o chamado “Plano dos 500 dias”, elaborado por um grupo de economistas soviéticos ligados a Chicago e que visava realizar a transição ao capitalismo (então dizia-se apenas “ao mercado”) em um prazo de 500 dias, com o centro na privatização da propriedade estatal. O fim da URSS e a renúncia melancólica de Gorbatchóv em 25 de dezembro de 1991 abriu caminho para que Ieltsin implementasse sua política. E as consequências nós vimos ao longo dos anos 1990: crise, fome, desemprego, máfia, frio, oligarcas e ao final… Putin.
Gorbatchóv à luz da História
O crime de Gorbatchóv não consiste exatamente em ter “vendido a URSS” aos Estados Unidos em alguma negociação secreta, como afirmam as teorias conspiracionistas stalinistas e putinistas. Não. Negociações secretas certamente aconteceram, mas isso não foi o essencial. O que Gorbatchóv fez, o fez fundamentalmente à luz do dia. Gorbatchóv deu início a um processo que viria não apenas a derrubá-lo, mas a destruir a maior conquista da classe trabalhadora soviética em toda a sua história. Novamente, tudo aconteceu como previu Trotski (1991, p. 208):
A queda do regime soviético causaria inevitavelmente o colapso da economia planificada e, assim, a abolição da propriedade estatal. O elo obrigatório entre os trustes e as fábricas se romperia. As empresas mais favorecidas seriam entregues a si próprias; poderiam tornar-se sociedades por ações ou adotar qualquer outra forma transitória de propriedade, por exemplo a participação dos operários nos lucros. Os kolkhozes se desagregariam de imediato, de forma ainda mais fácil. Assim, a queda da ditadura burocrática atual, sem a sua substituição por um novo poder socialista, significaria a volta ao sistema capitalista com uma baixa catastrófica da economia e da cultura.
Essa “baixa catastrófica da economia e da cultura” a vimos bem nos anos 1990.
Ao que tudo indica, Gorbatchóv desejava uma reforma controlada do sistema econômico e político, aos moldes do que vinha acontecendo na China desde 1978, com as “quatro modernizações” de Deng Xiaoping. No sonho de Gorbatchóv, construiria-se uma economia mista, com um setor estatal forte, um planejamento genérico e reativo e um regime político de relativas liberdades democráticos. Mas só mesmo em sonho. Gorbatchóv ignorou o fato de que os mecanismos do capitalismo, por menores e mais insignificantes que sejam, uma vez libertos dentro de uma sociedade, tendem a englobá-la totalmente. Novamente, recorremos a Trotski (2005, p. 224-224):
Ao longo da sua carreira, a sociedade burguesa mudou muitas vezes de regime e de castas burocráticas sem modificar as suas bases sociais. Preservou-se da restauração do feudalismo e das corporações pela superioridade do seu modo de produção. O poder estatal foi capaz tanto de cooperar com o desenvolvimento capitalista como por freios nele. Mas, em geral, as forças produtivas, baseadas na propriedade privada e na concorrência, desenvolveram-se por conta própria. Por outro lado, as relações de propriedade estabelecidas pela revolução socialista estão ligadas indissoluvelmente ao Estado. O predomínio das tendências socialistas sobre as pequeno-burguesas está assegurado, não pelo automatismo econômico – ainda estamos longe disso – mas pelas medidas políticas da ditadura. O caráter da economia depende, pois, inteiramente do caráter do poder do Estado.
Foi esse “automatismo econômico” característico do capitalismo que foi ignorado por Gorbatchóv e que acabou sendo a origem de sua ruína. Os marxistas também chamam esse mecanismo de “anarquia da produção”. Ele se opõe pelo vértice à racionalidade do planejamento socialista promovida pelo Estado. Esse é o segredo do vertiginoso crescimento e prosperidade observados em todas as sociedades que fizeram sua revolução socialista e planejaram a economia. Por isso dizemos que a propriedade estatal, o planejamento econômico e o monopólio estatal do comércio exterior são os três pilares econômicos do socialismo.
Gorbatchóv também não foi exatamente um “fraco”, como afirmam alguns críticos atuais. Quem faz essas críticas hoje admite, consciente ou inconscientemente, que era preciso apoiar o golpe de agosto de 1991 (para o qual, aliás, Gorbatchóv fez vistas grossas), já que era levado a cabo por um setor da burocracia soviética que desejava “acabar com a desordem no país” e preservar o Estado da desagregação. Se o apoio a uma figura como Ieltsin nunca foi admissível, também não era admissível afogar a revolta popular em sangue, como propunham os golpistas da junta militar GKTchP (Comissão Estatal de Situação Extraordinária).
Em que reside, portanto, todo o problema? Em nossa opinião, na teoria stalinista do socialismo em um só país. A burocracia soviética jamais admitiu a possibilidade de recorrer ao proletariado mundial para resolver a crise de isolamento e atraso da URSS. Preferiu introduzir o mercado na URSS (e consequentemente acabar com ela) do que internacionalizar a revolução. Os stalinistas de hoje precisam explicar essa contradição. Tudo se deveu a uma “traição” pessoal de Gorbatchóv? Mas como ele surgiu desde o seio da própria burocracia? Como a casta dirigente aprovou seu plano? Por que lhe prestou apoio? Inspirados por Stalin, os stalinistas de todas as matizes sempre defenderam que a missão do proletariado mundial se reduzia a apoiar a política externa e interna da URSS. Deu no que deu. Acusados de “apoiadores do imperialismo”, os trotskistas, por outro lado, sempre denunciaram que, em última instância, a política da burocracia soviética conduzia à restauração capitalista. O fato de que alguns trotskistas se confundiram da cabeça e comemoraram o fim da URSS como uma “grande vitória das massas” não anula esse posicionamente fundamentalmente correto (a postura objetivamente antidefensista de algumas correntes trotskistas seria um ótimo tema para outro artigo).
O crime de Gorbatchóv consiste em que, para resolver a crise estrutural da URSS, buscou aliados em Ronald Reagan, Margareth Thatcher e João Paulo II, ao invés dos trabalhadores de todo o mundo. Gorbatchóv foi coerente com a política adotada pela burocracia soviética ao longo de 60 anos e levou essa política até seu desenlace lógico. Quando percebeu o monstro que despertara, rapidamente mudou de discurso e jurou-lhe fidelidade: renegou o comunismo mais de três vezes, se declarou social-democrata, admitiu a necessidade de passagem total ao mercado, ainda que com um ritmo mais equilibrado. O monstro achou que era pouco e preferiu Ieltsin, que lhe prometia obediência absoluta e “economia de mercado em 500 dias”. E então vieram as privatizações, os “selvagens 90”, Gaidar, Tchubais, Berezovski e nasceu a “nova Rússia”.
Não se pode negar a Gorbatchóv inteligência, ousadia e uma boa dose de carisma. Se quisermos, até mesmo um pouco de boa vontade. Mas isso se refere fundamentalmente aos primeiro anos de poder. De 1988 em diante, o que vemos é um homem diminuído diante de gigantescos acontecimentos que ele mesmo provocou: manobrando, recuando, sobrevivendo. Sua natureza burocrática e a herança histórica do stalinismo não lhe permitiam mais do que isso. Por demais Gorbatchóv estava acostumado com as negociações pessoais, com a pompa e os respeitos que lhe prestavam no Ocidente e que culminaram no Prêmio Nobel da Paz em 1990. Não é à toa que ele será sempre lembrado pela Times, Forbes e Washington Post como um símbolo de “luta contra o comunismo e pela democracia”. Para os socialistas de todo o mundo, no entanto, sua imagem estará sempre associada à perda da maior conquista proletária da história e ao que existiu de mais reacionário no final do século 20.
Referências
GORBATCHEV, Mikhail. Perestroika: Novas ideias para o meu país e o mundo. São Paulo: Círculo do Livro, s. d. 300 p.
TRÓTSKI, Leon. A revolução traída: O que é e para onde vai a URSS. São Paulo: Editora Sundermann, 2005. 288 p.
________. Predannaia revoliutsia. Moscou: NII Kulturi, 1991. 256 p.
Comentários