Vladimir Putin foi reeleito com 87% dos votos no dia 17 de março, na Rússia. Um amplo setor da esquerda mundial sente-se entusiasmada com sua retórica supostamente antiimperialista. Ao mesmo tempo as organizações LGBTQ+ são declaradas extremistas. Na Rússia ocorreu uma derrota histórica com a restauração capitalista. Sendo hoje um país capitalista e imperialista. Putin não é um herói do proletariado. Ao contrário, representa os interesses de uma burguesia russa. O projeto de poder de Putin pode significar mais uma grande derrota para a classe trabalhadora mundial. A vitória de Putin é uma expressão da derrota da classe trabalhadora que não conseguiu ao longo das últimas décadas construir uma alternativa de poder do proletariado para a Rússia. Perdemos por W.O. .Precisamos decifrar o fascínio que o fascismo exerce sobre parte da esquerda desavisada.
Os impactos do “Putinismo” podem chegar até mesmo nas eleições municipais no Brasil. Aldo Rebelo tem sido anunciado como possível candidato a vice-prefeitura de São Paulo, na chapa do atual prefeito Ricardo Nunes (MDB). Aldo Rebelo tem uma trajetória que tem origem no stalinismo. Tendo sido formado na militância na esquerda, e um quadro do PCdoB. Quando Aldo Rebelo foi ministro da Defesa do Governo Dilma teve posições que não honravam a combatividade do Partido que lutou no Araguaia. Rapidamente Rebelo fez um giro ideológico, e hoje apoia o Bolsonarismo. Mas o fenômeno ocorrido com Aldo Rebelo é um perigo que paira em toda a esquerda. Reflete uma característica desta “década de 20”.
O Stalinismo tem uma longa tradição de conduzir o proletariado para derrotas. Stalin forneceu petróleo para que Mussolini tentasse invadir a Etiópia. Stalin fez um pacto com Hitler para dividir a Polônia. O pacto Ribbentrop-Molotov foi firmado em agosto de 1939. Em 2 de setembro de 1939, Trotsky foi profético ao afirmar:
“A ocupação da Polônia está agendada neste calendário para o outono de 1939. Em seguida: Iugoslávia, Romênia, Bulgária, França, Bélgica … e depois, por fim, no outono de 1941, a ofensiva é começar contra a União Soviética.”
Os fatos ocorreram exatamente conforme o previsto. Neste período os nazistas tomaram quase toda a Polônia, e criaram o Gueto de Varsóvia. Stalin acreditou tanto neste pacto que Goebbels1 teria dito que ele agia diante de Hitler como um coelhinho hipnotizado por uma serpente2. Mesmo Stalin tendo sido avisado do ataque nazista, ele negou-se a aceitar a realidade. Deixando as fronteiras abertas para o ataque nazista de 21 de junho de 1941.
A traição histórica de Stalin ter se aliado a Hitler, e ter sido conivente com o Gueto de Varsóvia, está dentro de uma lógica interna. O raciocínio do stalinismo sempre foi do “socialismo num só país”. Stalin nunca teve como estratégia a revolução permanente e o internacionalismo proletário. Ao contrário, sua lógica era da declarar o poder da “Mãe Rússia”. Isto leva o stalinismo para uma lógica interna da geopolítica. Tal lógica é antagônica ao marxismo, que tem como pressuposto defender a paz entre os povos e a guerra entre as classes.
Grandes fatos históricos costumam se repetir, primeiro como tragédia, depois como farsa. A farsa na atualidade é equiparar a Rússia de hoje com o que foi a União Soviética. A União Soviética era um Estado Operário, com toda a degeneração da burocracia Stalinista, ainda assim não existia uma burguesia que explorasse o proletariado. Hoje a Rússia é capitalista, mais do que isto é uma potência nuclear imperialista. O neofascismo olha para Putin com muita simpatia e admiração. Sendo notória a boa relação de Putin com Trump, com a fascista francesa Le Pen, Mateo Salvini da Itália, Victor Orban da Hungria, dentre outros. Que os fascistas estejam todos admirando Putin não é novidade. O que pode gerar alguma surpresa é a esquerda cair neste encanto.
Na Alemanha houve um racha no partido Die Linke (A Esquerda). Sahra Wagenknecht, uma parlamentar eleita pelo Die Linke, encabeçou a ruptura do partido. O motivo da ruptura foi pelo fato do grupo de Sahra ser a favor de Putin na Guerra na Ucrânia. O grupo passou a assumir uma postura contra os imigrantes, contra o que chamam de “cultura do cancelamento“. Embora supostamente mantenha uma linha de esquerda nas pautas econômicas, mas retrocede bruscamente nas pautas relativas às opressões. Uma pesquisa indica que dentre os apoiadores do partido Alternative für Deutschland (AfD), o partido de extrema direita, 61% deles olham com simpatia para a formação do partido de Sahra Wagenknecht. O mundo real é feito de muitas relações dialéticas, sendo provável que Sahra esteja certa em grande parte quando critica o seu antigo partido, Die Linke , por capitular a OTAN. Sendo necessário que a esquerda tenha uma firme postura de denúncia contra a OTAN. Entretanto, a solução proposta por Sahra não só não resolve o problema como cria novos problemas.
A Restauração do Capitalismo foi uma derrota histórica para a humanidade. Pois houve um retrocesso civilizatório. Como reflexo surgiram ideologias confusas, que buscam misturar um resgate de um passado imaginário da Rússia, com teorias neo-nazistas. Neste contexto surge um grupo denominado “Nazi-Bolchevique”, cujo símbolo é uma foice e um martelo com uma estética similar da suástica nazista.
Um dos principais expoentes desta ideologia, nazista, é Alexander Dugin, que se apresenta como um Rasputin de Putin. A verdade é que Dugin usa esta suposta influência sobre Putin mais como marketing do seu charlatanismo messiânico do que isto refletiria a realidade. Ao parecido como o que Olavo de Carvalho fez com o Bolsonarismo, criando uma marca rentável com a sua realidade paralela. A grande questão que se apresenta é que este charlatanismo provoca um efeito na realidade, e muitas pessoas desavisadas caem nesse conto.
Dugin busca capitanear os socialistas para que apoiem o neofascismo, como demonstrou no manifesto, de 1997, com o título: Fascismo – Sem fronteiras e vermelho. As supostas teorias geopolíticas defendem um hegemonismo russo, onde a Rússia seria o grande expoente “Euroasiático”. Sua utopia reacionária defende “um mundo multipolar”, onde vários blocos imperialistas dividiriam o mundo, quase como o mundo retratado pelo escritor George Orwell no livro 1984.
A Geopolítica é uma forma de ver o mundo dos olhos do imperialismo. Um dos principais expoentes é Halford Mackinder, que formula a teoria de Heartland3, em 1904. A região considerada estratégica para o domínio imperialista seria exatamente a Europa Oriental, bem como o controle do mundo partindo do controle do que depois vem a se chamar “Euro-Ásia”. Este tipo de estudo surge no momento em que há a escalada do imperialismo e que resulta na 1ª Guerra Mundial. A Alemanha Nazista usa como argumento para a guerra exatamente a necessidade do controle do “Lebensraum”. Este conceito nazista de que a Alemanha precisaria de um “espaço vital”. Portanto, a teoria que Dugin desenvolve no início dos anos 2000 do Eurasianismo é uma continuidade do Lebensraum nazista.
Existe uma retórica “Duginista” permeando os círculos da esquerda. Assim estão se proliferando porta-vozes de Putin dentro dos meios da esquerda no mundo. Em geral, há em comum um grande apreço por teorias da conspiração. Uma fixação por “fontes secretas no Deep State”. Uma teoria que exclui a luta de classes dos cálculos políticos. Creditando todas as manifestações populares a movimentos secretamente organizados por agências de inteligência, como a CIA. O influencer de redes digitais Pepe Escobar, do Brasil 2474, é uma expressão dos seguidores de Dugin em português. Não por acaso este mesmo defendeu o charlatanismo da cloroquina, que faz campanhas contra a vacinação, assim como os bolsonaristas. Em que pese seu discurso seja absolutamente desprovido de qualquer seriedade. Ataca sempre seus desafetos por “esfera atlanticista politicamente correta”. Ecoando um discurso “politicamente incorreto”, chamando toda a luta contra as opressões de “cultura de cancelamento” ou “identitarismo”. Entretanto, sua retórica atrai uma horda de seguidores “Putinistas”. O seu discurso equipara-se ao bolsonarismo quando fala do “globalismo” e das teorias da conspiração. Ocorre que a pregação semi-fascista dentro dos canais da esquerda tem um objetivo de canalizar uma parte da militância de esquerda para apoiar o fascismo.
Os “Putinistas” alegam combater o “Atlanticismo”, que seria o bloco de poder dos EUA, Inglaterra, França e Alemanha, representado pela OTAN. Ignoram o papel imperialista da Rússia e da China hoje.O imperialismo Russo-Chinês é um imperialismo “desafiante”, que efetivamente é antagônico ao imperialismo hegemônico dos EUA. Pode-se fazer um paralelo histórico com a Primeira Guerra Mundial. Onde o chamado “Atlanticismo” seria exatamente o imperialismo hegemônico de então representado por Inglaterra e França. Do outro lado, como imperialismo desafiante estavam Alemanha, o Império Austrohúngaro e o Império Otomano. A posição dos socialistas, como Lênin, Trotsky e Rosa Luxemburgo, foi de lutarem contra a Guerra Interimperialista e defender a paz entre os povos. Entretanto, a coerência histórica do raciocínio da esquerda, que abraça Putin, levaria à conclusão de que Lênin estaria errado. E o certo teria sido apoiar os Impérios Centrais da Tríplice Aliança. Voltando aos tempos atuais, combater o imperialismo dos EUA e OTAN não significa uma adesão ao imperialismo da Rússia e China.
Cabe destacar que o imperialismo russo tem limites. Putin usa grupos mercenários para praticar uma pirataria imperialista. Por meio do grupo Wagner existem operações em países africanos. A Rússia exporta capitais, explorando outros povos no seu entorno. Entretanto, cabe destacar que efetivamente a OTAN exerce um cerco contra a Rússia. Buscando impor o imperialismo dos EUA nas mesmas regiões. Da elevação da exploração surgem montanhas na Rússia, que para além dos Urais, são as montanhas da concentração de capitais. Entretanto, tais montanhas ainda não conseguem seu lugar ao sol diantes dos Alpes do imperialismo dos EUA. O proletariado deverá trilhar seu caminho com um rio no vale dos despossuídos, confrontando as rochas de ambas as montanhas. Pois todas as montanhas de capitais acumulados impedem a paisagem da planície do socialismo, com a economia planificada e a distribuição igualitária das riquezas.
Por entre caminhos tortuosos, alguns ativistas honestos podem terminar se perdendo, trilhando o caminho seguido por Aldo Rebelo. Um grupo com traços neo-fascistas denominado Nova Resistência é um dos grupos que reivindicam Dugin no Brasil. Este grupo entrou no PDT, e passou a promover eventos exatamente com Aldo Rebelo. Assim como Aldo Rebelo, Ciro Gomes também passou a criar conteúdo para o Bolsonarismo. As infiltrações “duginistas” podem ter ocorrido no PDT, PCO e PCB. O movimento que ocorreu com Aldo Rebelo, que foi do stalinismo ao bolsonarismo, deve ser compreendido dentro de um contexto global. Não se trata de um caso isolado, nem de um problema pessoal. O perigo que existe é de um amplo setor da esquerda ficar suscetível às ideias fascistas.
Existe uma aproximação ideológica dos stalinistas com Putin. Neste contexto há uma pressão que empurra muitos socialistas para posições próximas ao fascismo. Sendo necessário que a esquerda tenha uma política de enfrentar diretamente todas as formas de infiltração fascista. Com o fascismo não cabe debater nem argumentar, só cabe combater para arrebentar politicamente.
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