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BRASIL

Reforma administrativa, sindicatos e eleições municipais: haja confusão!

Coletivo TSTs Cariri, de Juazeiro no Norte, CE
três trabalhadores estão escalando uma construção, segurando em cabos de aço. Eles usam capacetes e botas. Um deles olha em direção à câmera.
Jason Goh/Pixabay

No dia 28 de outubro, Dia Nacional de Luta em Defesa dos Serviços Públicos, organizações dos trabalhadores de todo o país, cada uma a seu modo, protestaram contra a PEC 32/2020, que prevê a reforma administrativa do governo Bolsonaro – mais um aceno da ultradireita ao mercado que penaliza a população, destrói o funcionalismo público e mantém privilégios para poucos aprofundando mais ainda desemprego e renda da classe trabalhadora.

As classes sociais constroem seus sujeitos políticos coletivos. Tais sujeitos (partidos, sindicatos, associações, etc) nada mais são que uma união permanente de indivíduos de uma determinada classe, fração ou grupo social com a função de defender seus interesses imediatos. O sindicato é um instrumento de luta dos trabalhadores contra a exploração capitalista. Existe porque a sociedade capitalista é dividida em classes sociais, entre explorados e exploradores. Existem lutas e organização sindicais praticamente desde que existe o capitalismo buscando a melhoria de vida e de trabalho, por salários dignos, pelos direitos humanos, pela democracia, pela igualdade, pela paz, pela vida, por justiça, por dignidade.

O Sintest-Ce, o primeiro sindicato de técnicos de segurança do trabalho do país, legalizado em 1986 no pós-ditadura militar-empresarial (1964-85) também expressou timidamente, por meio de sua direção, apoio a petição pública contra a reforma administrativa postando um link nas suas redes sociais. Contudo, essa mesma direção sindical vem chamando a categoria de profissionais para votar nas próximas eleições municipais em um candidato da direita. O argumento completamente descabido é que o tal candidato seria um profissional da categoria. É sobre essa contradição que queremos nesse artigo elaborar alguns apontamentos.

Os sujeitos políticos e as (contra)reformas

Num mundo em que registramos uma dinâmica capitalista assentada no aumento cada vez maior do emprego informal, da disseminação dos contratos precários e do crescimento do desemprego, a atuação dos sindicatos, juntamente com outras formas de organização coletiva, são fundamentais para barrar a política de austeridade dos patrões e do Estado que busca, sem precedentes, reduzir direitos e dificultar o acesso aos benefícios da proteção social dos que vivem do trabalho.

E para a classe trabalhadora e suas organizações é nítido como água que a política do atual governo Bolsonaro tem o objetivo de precarizar serviços públicos, atacar a soberania nacional com a entrega de setores estratégicos, retirar direitos dos servidores e mudar profundamente o papel do Estado no Brasil. E no escopo das (contra)reformas do bolsonarismo, a administrativa é brutal – pretende acabar com o serviço público da forma como conhecemos hoje e modifica totalmente as relações de trabalho, atingindo todas as esferas do funcionalismo. As derrotas que estamos vivenciando neste último período devem nos servir de lição.

Todas as conquistas populares inscritas na Constituição Federal de 1988 vem sofrendo ataques desde o governo Collor (1990-1992), momento no qual  o funcionalismo sofreu furiosa ofensiva e foram privatizadas 18 empresas. Com Itamar Franco (1992-1994), as privatizações continuaram, com destaque para a venda da siderúrgica CSN e da Embraer. Já Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) colocou em prática o mais audacioso plano de desestatização da economia, com a privatização de grandes empresas e áreas econômicas importantes que estavam sob controle estatal. Entre 1991 e 1996, as empresas federais privatizadas fecharam 39.631 postos de trabalho, o que equivalia a 32,6% do total das vagas que mantinham. Foi durante o governo do tucano que se iniciou a reforma administrativa e seu maior ataque foi a Emenda Constitucional 19/1998, que alterou o regime jurídico único dos servidores públicos, permitindo a contratação pelas regras da CLT e criou ainda o chamado contrato de gestão. A alteração no regime da administração pública produziu uma drástica mudança, possibilitando, a partir daí, a redução do quadro de servidores; a contenção dos gastos públicos sob a repetida alegação da crise fiscal; introduziu o mecanismo da demissão voluntária; limitou as despesas com pessoal e ampliou as condições para a contratação temporária.

A reforma administrativa atual é mais um passo da classe dominante no desmonte do Estado e como seus fiéis escudeiros os partidos seja da direita tradicional ou extrema direita estiveram sempre na linha de frente da atuação parlamentar na aprovação de todas as (contra)reformas – trabalhista, previdenciária, e agora, a administrativa. Igualmente, vale a pena lembrar o conjunto de revisões da legislação de segurança do trabalho patrocinado pelos grandes empresários. Cabe também recordar do uso de venenos e das queimadas criminosas na Amazônia defendidas pelo agronegócio. E esta semana o duro ataque ao SUS promovido pelo bolsonarismo. Importante dizer que todas as (contra)reformas se deram essencialmente por meio da ação de sujeitos políticos.

E seria uma ingenuidade pensar que não existem no Brasil partidos e parlamentares de direita e extrema direita que cumprem esse papel de representantes diretos da burguesia: PSDB, DEM, MDB, PP, PSL, PTC, Podemos, DC, PRTB, Avante, Republicanos, PSC, PMB, PROS, Solidariedade e Patriota (para não entrar na polêmica dos partidos que reivindicam ser de centro-esquerda ou até de esquerda). Imaginar que existem políticos atuando de forma individual sem ligações ou subordinação aos programas dos partidos é uma concepção irracional e muito perigosa.

No meio dessa confusão, é certo que desde a campanha à Presidência de Bolsonaro em 2018, houve adesão de algumas poucas categorias profissionais que se auto-identificam como micro empresários (caminhoneiros, camelôs, e outras categorias de trabalhadores autônomos precarizados) as pautas da extrema direita. Seria esse o caso da categoria dos profissionais de segurança do trabalho ou apenas certos dirigentes sindicais?

Os sujeitos políticos e a saúde e segurança dos trabalhadores

De fato, o quadro atual de avanço das forças que representam a burguesia nacional e o imperialismo, em escala global, mostra como tem sido duro para a classe trabalhadora construir alternativas de luta que mobilizem as suas representações políticas e sociais e o conjunto da população de modo a responder aos ataques promovidos pelo grande capital.

Há em curso uma ofensiva reacionária e os dados de saúde e segurança do trabalho não deixam dúvidas. Em média anual, a sinistralidade brasileira atinge cerca de 3 mil mortes e 5 mil acidentes com sequelas permanentes – são oito vítimas por dia, uma a cada três horas. Até 7% do total de registros de mortes no mundo são decorrentes de condições inadequadas do ambiente de trabalho. E um olhar mais próximo sobre cada um dos casos revelará também grandes doses de desprezo pela vida em detrimento do lucro.

Esse cenário de horror não nos deixa alternativa senão resistir. E resistir a essa deterioração das condições de trabalho e de vida só pode ser fruto de organização política feita coletivamente, de modo que o sindicato é mais do que nunca um ator fundamental.

Para tanto, é decisivo que todos os sindicatos, mas principalmente os que organizam aqueles que atuam para evitar acidentes, doenças e mortes no trabalho, como é o caso do Sintest-CE, incorporem demandas que extrapolam o local de trabalho, como as questões de classe, gênero e raça, de modo a promover o combate às discriminações, a luta contra todas as formas de dominação e opressão.

Opinamos que o Sinteste-CE e todos os sindicatos precisam estreitar sua relação com os movimentos sociais como o movimento negro, feminista, ambientalista, por moradia, luta pela terra e pelo Fora Bolsonaro. Portanto, a atual direção do Sintest-CE nos parece carecer de urgente revitalização, de modo a lhe restituir a capacidade de organizar os trabalhadores e, com isso, oferecer alguma possibilidade de resistência à atual ofensiva do capital. Cabe às direções sindicais compreender a necessidade de combater à ideologia neoliberal, de fazer uma defesa intransigente de direitos, que devem ser assegurados pelo Estado.

Em 15 de novembro, daqui a alguns dias, é essencial que as organizações da classe trabalhadora, principalmente os sindicatos, não orientem suas bases a votar contra a direita ultraliberal e o bolsonarismo neofascista. Vamos indicar o voto dos trabalhadores nos candidatos da esquerda comprometidos com a defesa dos direitos sociais e a valorização do serviço público. Nosso objetivo é derrotar o governo Bolsonaro e suas reformas que unem a extrema-direita e a direita tradicional. Eis um antídoto a toda essa confusão.

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cariri