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BRASIL

Com Zuleide Queiroz o PSOL cresce no Crato e apresenta uma alternativa de esquerda e socialista para a cidade

José Pereira de Sousa Sobrinho*

Zuleide amarelo), com mulheres da coletiva Sementes

Amor coragem!
Que é o alicate cortando a cerca de qualquer pastagem

15 de novembro de 2020, parece o fim, mas era somente um novo recomeço. Os olhares e sorrisos são uma mistura de euforia e ansiedade, o misto de sensações após 45 dias de uma campanha intensa. Levada por um coletivo, que conseguiu agregar uma diversidade de lutadores e ativistas, gerou um caldo de experiências e concepções que nos dão uma luz sobre o lugar e o tempo de nossas lutas. 

Os olhares revezavam entre os sorrisos e as telas dos celulares, sobraram xingamentos ao site do TSE paralisado. Demoramos a descobrir sobre o ataque dos hackers, possivelmente de extrema direita, que tentava deslegitimar o processo eleitoral ante uma já prevista derrota de bolsonarismo . Quando finalmente a disputa virtual se resolveu, o resultado surpreendeu alguns, mas o sentimento geral de vitória se deve ao melhor resultado da esquerda socialista na história do Crato. 

Os 6.956 votos em Zuleide Queiroz e Juciel Lima do PSOL em 2020 é uma votação muito expressiva para a esquerda na cidade e na região, representa por si um aumento um crescimento político importante quando comparado o resultado de 2018 quando Zuleide Queiroz candidata a deputada Federal obteve 14.993 votos, dos quais 3.893 desses votos no Crato, com uma ampliação de 78,6% da votação na cidade. Os números de 2020 são ainda mais importante quando comparados com os números da história recente da esquerda na cidade, como os resultados de Cacá Araújo (PCdoB) em 2016 com 1.819 (2,83%) e da própria Zuleide Queiroz em 2004, ainda no PSTU, com 288 (0,51%) votos. O resultado de 2020 fica próximo a campanha de Marcus Cunha de 2012 que alcançou 7.315 votos, 11,15%, com o PT sem coligação. Exemplos bem diferentes da campanha de Zé Ailton, que, sendo prefeito, abandonou o PP, partido de direita, para concorrer a reeleição com o maior orçamento de todas as campanhas, coligado com 10 partidos entre os quais se faz presente a direita, com aval do governador e dos Ferreiras Gomes. 

Os números de Zuleide Queiroz do PSOL, do Coletivo Sementes, com 1.257 votos, e de seu Expedito Guedes, 185 votos, indicam um crescimento gigantesco do partido na cidade, acompanhando a tendência nacional que se dá desde 2016. Apesar da votação do partido não ter sido o suficiente para alcançar o quociente eleitoral de 3.607 votos, o resultado é vitorioso pelo alcance da campanha e seu significado político por demarcar que a nível local o PSOL também está em dinâmica de crescimento, ocupando um importante espaço da esquerda na cidade. O significa político expressa também um voto que representa o desejo de mudança pela esquerda, com um projeto dos explorados e oprimidos, com independência de classe, anticapitalista. Isso não se expressa somente nos números, mas pelo que representou a construção dessa campanha com adesão militante e especialmente pela unidade com o movimento negro e o movimento de mulheres. 

Apresentamos um programa socialista, feminista e antirracista para a cidade 

Foi uma campanha na qual se gastou muita sola de chinela. Em grupos, caminhamos por muitos bairros, muitas localidades e sítios da zona rural do Crato. De porta em porta apresentando candidaturas de trabalhadores e trabalhadoras com um programa anticapitalista, antirracista, antimachista, antilgbtóbico e co-socialista.  

Uma campanha politizada, que insistia em denunciar esse modelo econômico que concentra boa parte da infraestrutura num raio de cinco quilômetros ao redor do centro, nos bairros mais privilegiados da cidade, enquanto falta tudo em todo o restante da cidade. Indicamos que o estado, dominado por poucas famílias ricas da região sempre esteve a serviço dos mais ricos, da burguesia regional. Que nosso projeto era inverter essa realidade e governar com os trabalhadores da cidade priorizando os bairros que mais precisam. Não é qualquer coisa que quase sete mil pessoas aderiram a um programa de esquerda, socialista e de clara oposição ao governo de extrema-direita.  

No meio da pandemia, muitas aderiram a campanha, sim, muitas. Foi uma campanha onde as vozes das mulheres negras estiveram bastante presente. Desde o Coletivo Sementes, formado por Ivaneide Severo, Luana Ricarto, Jessica Lorena, Verônica Isidoro e Valéria Carvalho, que foram as 11as mais votadas entre as candidaturas para vereadores, as mais votadas entre as candidaturas mulheres. Até as diversas apoiadoras que se somaram e construíram o cotidiano da campanha, militando no enfrentamento a lógica conservadora que nega o espaço das políticas para as mulheres. 

Nossa campanha também foi um “momento de escuta”, de ouvir o desalento do povo trabalhador do Crato e, muitas vezes, de ouvir seu ceticismo com a política. Não um ceticismo crítico e de revolta que leva a ação, mas, ao contrário, um ceticismo individual que conduz a imobilidade. Por vezes era difícil explicar que todos que estavam ali era por motivação militante, por acreditar em um projeto coletivo. Prevalecia em diferentes lugares uma leitura da política como puro negócio, que nega a tudo e a todos, inclusive, que os trabalhadores podem ter um projeto independente, demonstrando como as organizações de classe, movimentos ou sindicatos, não conseguem chegar aos diversos recantos da cidade. 

Por vezes, a política se mostra, em toda sua dureza e secura, por imagens que mostram nosso povo trabalhador e negro abandonado, sem água, energia, saneamento, saúde, educação. São imagens desoladoras. Em outros momentos, a secura da política vinha em palavras, quando nas regiões dos sítios, onde cercas reais e invisíveis eram descritas denunciando a exploração e a opressão cotidiana. Isso fazia das palavras arame farpado, falas que rasgavam nossas peles e cortavam nossas gargantas. Por fora éramos silêncio, por dentro sangrávamos todos com a dura realidade do povo do campo. 

Nossa presença que parecia ajudar a quebrar longos silêncios diante de uma realidade de abandono e desesperança, no entanto, nos apresentava também, em cada lugar, pessoas que insistem em resistir, que entendem que a luta coletiva é a única saída. A mesma palavra que fez cortar e sangrar, agora cura, nos enche de esperança. Por fora silêncio, por dentro grito de palavras de ordem deslumbrando lutas futuras. Assim, sentíamos e sentimos que nossa presença fortalecia a todos e todas. Da mesma maneira, a disposição de luta de jovens, mulheres e homens renovava nossa crença que outro mundo é possível. Nesse momento a campanha deixava de ser simplesmente campanha, já não éramos mais candidatos e eleitores, agora éramos camaradas, convertidos em coletivo, acreditando juntos em um outro mundo, comungando na hóstia da esperança, de ideia comuns, alguns comunistas, mas com certeza todos e todas camaradas. 

Essa é nossa maior vitória. O legado dessa campanha é a convicção de que o PSOL, o movimento de mulheres e o movimento negro saem dela muito maiores do que entraram. Mostramos que coletivamente podemos levantar, esperançar e reagir para desconstruir uma estrutura imposta aos trabalhadores, às mulheres, às negras e negros. Essa campanha foi o primeiro passos de muitos para construir uma organização de nossa classe. Queremos transformar esses quase sete mil votos, em sete mil vozes e multiplicar esse número na luta cotidiana nos territórios. Por terra, educação, água, trabalho, liberdade, por nossas vidas, por um futuro. O PSOL quer ser somente uma ferramenta dessa luta, o alicate que ajudará a cortar as cercas ou serrar as correntes invisíveis que nos prendem. Para isso é muito importante: 1) dar continuidade a nossa unidade com os movimentos de mulheres e o movimento negro; 2) dar continuidade ao trabalho de organização dos trabalhadores iniciados durante a campanha nos diferentes territórios. A militância do PSOL deve continuar nos territórios sendo um apoio à organização e resistência dos trabalhadores, mulheres, negros, negras e dos LGBTs. Para tanto, precisamos 3) fortalecer o PSOL como organização militante, como espaço de debate político e ação coletiva, ampliando nossa capacidade de atuação e mobilização junto aos trabalhadores e trabalhadoras.

O resultado eleitoral já foi uma grande vitória – os quase sete mil votos e a votação do coletivo são expressivos –, mas o fim das eleições é somente o começo de uma nova fase de nossa luta. Queremos cada vez mais fazer do PSOL no Cariri o lugar onde os lutadores se encontram para juntos semear esperança num futuro diferente, sem exploração, sem opressão, para fortalecer em cada um de nós a certeza de que esse mundo é possível. O PSOL é uma ferramenta para nossa organização coletiva, serve para nos dar coragem e “Coragem, amor, coragem, […] para caminhar, pular cerca, catraca, cortar a repressão; dançar na rua, subir ladeiras; chutar bomba da opressão” porque nossa “coragem é assim; rebelde, ousada; passa por cima do tudo e do nada e quando se junta com amor; ela é o que é de mais revolucionária […]”. Coragem, amor, coragem, desapega dessa ideia “fudida de propriedade”, “coragem, amor, coragem pra derrubar as dores que perseguem esses dias; derrubar a apatia, a mais-valia e claro o presidente”, coragem, amor, coragem para lutar pelo Socialismo e pela liberdade, coragem, amor, coragem, “que coragem é assim rebelde, […] e quando se junta com o amor ela é que e mais revolucionária” (Pedro Bomba). 

Coragem, amor, filie-se e venha construir o PSOL! 

 

*Militante do PSOL e da Resistência.