Em seu discurso, realizado nesta manhã na Assembleia Geral da ONU, Bolsonaro não escondeu quem são seus grandes inimigos: a esquerda brasileira e os povos indígenas. Confira um pouco do discurso do presidente, dirigido para a sua base, de extrema direita.
“Socialismo”
Bolsonaro abriu seu discurso agradecendo a Deus por sua vida e que falando apresentaria à ONU um “novo Brasil”, que seu governo surgiu para frear o avanço do socialismo no Brasil, modo como equivocadamente caracteriza os governos do PT. Na mesma esteira, disse que os médicos cubanos viviam em regime de escravidão no nosso país e fez uma analogia da presença deles no Brasil com os espiões enviados por o que chamou de “ditadura cubana”, valorizando, então, o Golpe de 1964. O Presidente também falou sobre o governo da Venezuela como uma ditadura socialista e sobre a missão que o Brasil tem de impedir o avanço do socialismo nos outros países da América Latina, criticando a existência falaciosa do Foro de São Paulo.
Usou esse discurso para justificar a aproximação do Brasil com países que se consolidaram como democracias e reivindicou a abertura do mercado brasileiro, que, segundo ele, passou a integrar as cadeias globais de valor, firmou os acordos Mercosul – UE e Mercosul – UEFTA, e está em negociações avançadas para ingressar na OCDE.
Amazônia
Após criticar duramente um suposto avanço do socialismo na América Latina, Bolsonaro focou seu discurso na proteção ambiental. Reivindicou a indígena Ysani Kalapalo, falou que a Amazônia está praticamente intocada e que o Brasil é um dos países que mais protege o meio ambiente e que as queimada ocorridas na Amazônia decorrem do tempo seco e são praticadas por indígenas, devido aos seus hábitos e cultura.
Atacou a mídia nacional e internacional, que, segundo ele, provocam ataques sensacionalistas, que foram responsáveis por despertar um sentimento patriótico no governo brasileiro, já que é um equívoco dizer que a Amazônia é patrimônio nacional e o pulmão do país. Disse também que países questionaram diretamente a soberania brasileira – em alusão à conduta de Macron, Presidente da França -, tentando impor ao Brasil uma sanção na reunião do G7, e agradeceu Donald Trump por ter impedido que isso ocorresse. Nominou essa postura de “colonialista”.
Povos indígenas
Sobre os povos indígenas, Bolsonaro afirmou que 14% das terras brasileiras são demarcadas e que os indígenas devem ter os mesmos direitos que o restante da população, motivo pelo qual a área demarcada não será aumentada.
Nesse momento, em um dos pontos mais graves de seu discurso, atacou nominalmente o Cacique Raoni, líder caiapó e seu opositor político, dizendo que ele é utilizado como massa de manobra, já que há movimentos e ONGs que, segundo ele, tratam indígenas como “homens das cavernas”.
Afirmou que os indígenas não querem ser “latifundiários pobres em terras ricas” e citou os casos das terras Ianomâmis e Raposa Serra do Sol, que são ricas em minério, dizendo que os interesses internacionais de proteção são, na realidade, de exploração, e não de proteção a seres humanos.
Leu a carta do Grupo de agricultores indígenas do Brasil, que conferia poder à liderança Ysani Kalapalo para representá-los na Assembleia Geral da ONU e encerrou a leitura dizendo que “acabou o monopólio do Sr. Raoni”.
Defendeu, por fim, uma política de tolerância zero para a criminalidade, o que inclui os crimes ambientais, ressaltou a ideia de soberania nacional para proteção da Amazônia, rechaçou ameaças, e disse que o país está pronto para aproveitar nosso potencial sustentável.
Perseguição a ativistas e prisão de Lula
Bolsonaro defendeu a liberdade de expressão, religiosa e de imprensa, mas falou que nosso país não será abrigo para “terroristas disfarçados de perseguidos políticos”. Nesse momento, reivindicou a extradição de Cesare Battisti e de outros perseguidos políticos que aconteceram durante o seu governo.
Disse que os presidentes brasileiros que o antecederam, os quais nominou de “socialistas”, desviaram dinheiro para projetos socialistas no mundo, mas que, graças a um juiz que “graças a um juiz que é símbolo do Brasil, Sérgio Moro”, foram perseguidos e punidos.
Liberdade religiosa
O presidente defendeu que as pessoas não podem ser perseguidas por sua fé, e, apesar de não falar abertamente sobre a perseguição à cristãos, enfatizou que missionários estão sofrendo violências em todo o mundo.
Política externa
Com relação à política externa, Bolsonaro defendeu a participação do Brasil nas políticas de paz da ONU e ressaltou que o Brasil pode contribuir com o treinamento e capacitação das tropas. Além disso, enfatizou a relação do governo brasileiro com Israel, agradecendo pelo apoio prestado nos recentes desastres do país, Estados Unidos, Mundo Árabe e Ásia, com foco na China.
Ideologia de gênero
Bolsonaro finalizou seu discurso dizendo que o Brasil está se reerguendo, que por muito tempo nos deixamos seduzir por sistemas ideológicos que dominaram nossos meios de comunicação, escolas e universidades. Enfatizou que essas ideias provocaram a destruição da família, levaram a ideologia de gênero às crianças e expulsaram Deus das casas. Deixaram, em sua visão, um rastro de morte, ignorância e destruição.
Relembrou que levou uma facada, que falsamente atribuiu a um militante de esquerda e disse que cabe à ONU derrotar a ideologia, citou uma passagem bíblica (João, 8; 32), e disse que as Nações Unidas precisam atuar sem apagar as soberanias em nome de um interesse global abstrato.
Por fim, reiterou que esse é um novo Brasil e agradeceu pela sua vida “pela graça e honra de Deus”.
No discurso, muito ódio e a ideia de um “novo Brasil”
Bolsonaro justificou o seu autoritarismo como uma necessidade abstrata de combater o avanço do socialismo. Além disso, elegeu como seus inimigos os povos indígenas e seus territórios, e, de forma criminosa, direcionou seu ataque ao Cacique Raoni, liderança indígena histórica, que sempre se posicionou criticamente ao seu governo.
Criticou a atuação das ONGs brasileiras e internacionais, defendeu a prisão do Lula e saudou Sérgio Moro, que disse ser o “símbolo do Brasil”.
Sob o ponto de vista internacional, defendeu a abertura do mercado brasileiro e os acordos multilaterais, e demonstrou que Estados Unidos e Israel são seus aliados prioritários, acenando também para a China. Ao mesmo tempo, em nome da soberania nacional, atacou os governos da França e da Alemanha por sua postura com relação à Amazônia.
Não se esqueceu de defender os ideais cristãos, ao citar a bíblia, defender uma concepção específica de família e ideia falaciosa da “ideologia de gênero”.
A ideia do “novo Brasil” apresentada por Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU é de um país que restringe as liberdades democráticas, tem forte peso do cristianismo, é inimigo dos movimentos sociais e dos povos originários, defende a ideia da soberania nacional, mas acena a abertura de seu mercado para as transnacionais atuarem livremente. Bolsonaro não está errado em dizer que apresentou um “novo Brasil”, só esqueceu de dizer que o “novo Brasil” é o país do neo-fascismo.
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