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Colunas

Vamos falar sobre o sequestro do ônibus na Ponte Rio-Niterói

Reprodução

André Freire

Historiador e membro da Coordenação Nacional da Resistência/PSOL

Muito já se falou sobre o sequestro do ônibus na Ponte Rio-Niterói, a execução do sequestrador por um atirador de elite da PM e a lamentável e oportunista comemoração protagonizada pelo atual governador do RJ, Wilson Witzel (PSC).

Alguns, inclusive na esquerda, preferiram destacar um suposto êxito da operação policial, que ela se enquadrou dentro de protocolos internacionais de segurança, que a execução Wilian Augusto da Silva, 20 anos, se justificou pelo risco de vida a que os refens estavam submetidos.

Longe de defender uma ação criminosa, um sequestro de um ônibus e a ameaça a vida de vários trabalhadores inocentes (39 pessoas estavam dentro do coletivo), o assunto merece uma reflexão que busque ser bem mais abrangente.

Não se pode analisar o fato desta segunda-feira de forma isolada, fora do contexto existente no Rio de Janeiro. Sem negar as particularidades da operação de ontem, existe um conjunto a obra: a terrível e letal política de segurança pública do governador Witzel.

Os dados divulgados pelo Instituto de Segurança Pública (ISP) e pelo Observatório da Segurança (ligado a Universidade Cândido Mendes) são alarmantes: 881 mortes realizadas por agentes do Estado (policiais), apenas no primeiro semestre deste ano.

Estes números representam um recorde absoluto, se comparados com os dados dos últimos 17 anos. Em relação ao mesmo período do ano passado, houve um crescimento de 14,6% das mortes gwradas diretsmente por policiais.

E o que mais chamou a atenção sobre a localização das cerca de 5 mortes diárias ocasionadas por operações policiais: nenhuma destas ações de agentes do Estado, que geraram mortes, aconteceram nas vastas áreas da capital e Região Metropolitana controladas pelas milicias. Um escárnio.

Na semana passada, 6 jovens estudantes, alguns já trabalhadores e praticantes de esportes, todos sem antecedentes criminais, foram assassinados pelas chamadas “balas perdidas”, durante operações policiais irresponsáveis, realizadas em regiões próximas a favelas e periferias, durante horário de grande circulação de pessoas.

Esses assassinatos de jovens inocentes deixaram o governador em uma situação defensiva, pois cresce o questionamento popular a sua política de segurança pública.

Portanto, a comemoração feita por Witzel, quando desceu do helicóptero na Ponte Rio-Niterói também não foi casual, uma reação impensada.

Na verdade, ela expressa a busca oportunista de se valer de um morte para tentar justificar a sua política genocida: uma verdadeira declaração de guerra contra a população das favelas, especialmente com o extermínio diário da juventude pobre e negra das periferias.

Os verdadeiros alvos de Witzel e Bolsonaro

Essa politica de atacar o problema de segurança pública com ampliação da violência policial e da letalidade contra os mais pobres não é nova no RJ, e em todo o país.

Ela vem sendo aplicada por todos os governos anteriores, em maior ou menor grau, sempre fracassando em seus objetivos anunciados.

Sua consequencia é a geração de mais violência, inclusive contra inocentes. O que se pode verificar, rapidamente, observando os estudos e dados disponíveis sobre a área de segurança pública.

Se o caráter racista e de classe social presente na política de segurança pública não chega ser uma novidade, chama a atenção sua intensificação qualitativa no governo Witzel. O atual governador se tornou o principal porta-voz, defensor e uma espécie de “garoto-propaganda” desta política de extermínio do povo negro e dos mais pobres.

A política de Witzel casa perfeitamente com a politica defendida por Bolsonaro ao nível nacional. O atual governador era um desconhecido na política fluminense, só se elegeu na esteira do votação de Bolsonaro no RJ.

Os dois são expoentes atuais de um projeto de extrema-direita, com fortes traços neofascistas, que busca construir um país ainda mais injusto, brutalmente desigual e violento.

O papel da esquerda socialista não deve ser tecer comentários pontuais sobre as ações da polícia. Mas sim, apontar o caráter ultra reacionário dessa política de segurança pública, buscando apresentar saídas programáticas para este grave problema e apostando sempre na mobilização e organização popular para resistir a política atual.

Qualquer discussão sobre o grave problema da violência e suas consequências deve começar por discutir a necessidade de medidas mais estruturais.

O problema não será resolvido com medidas paliativas, que acabam gerando ainda mais violência. Seguimos acreditando que a solução deve começar partir de 3 caminhos:

.  Uma ampliação dos investimentos sociais em áreas sensíveis como: educação, saúde, geração de empregos, saneamento, práticas de esporte e de incentivo a cultura, em todo o Estado, especialmente nas favelas e regiões periféricas.

. A discussão no Congresso Nacional sobre a urgente desmilitarização da polícia: o fim da atual PM e a construção de uma polícia civil única, com controle externo da sociedade e movimentos sociais e democráticos.

. Abrir  a discussão em toda a sociedade brasileira sobre a proposta de descriminalização das drogas, caminho que vem sendo trilhado, nos últimos anos, por vários países. A chamada guerra drogas já foi perdida a muito tempo e quem mais perde são os mais pobres e os inocentes.

Esse caminho é absolutamente oposto as políticas atuais aplicadas pelos governos de extrema-direita e também defendida pela maioria corrupta e reacionária do Congresso Nacional.

Portanto, não se trata de ter expectativas nestes espaços de poder. Não há caminhos fáceis e nem atalhos: a saída é apostar na discussão coletiva, na organização e mobilização dos explorados e oprimidos.

Derrotar os governos Bolsonaro e Witzel nas ruas.