Com tiranos não combinam brasileiros, brasileiros corações
Hino ao 2 de Julho
‘Daqueles governadores de ‘paraíba’, o pior é o do Maranhão’. Essa frase foi somente mais uma dos absurdos ditos por Jair Bolsonaro na sexta-feira, dia 19 de Julho. Flagrada por um câmera da TV Brasil em uma conversa informal do presidente com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.
Talvez após ter ficado três dias sem falar por conta de um dente retirado, Bolsonaro voltou inspirado, e como dizemos aqui em Alagoas, com a metralhadora de merda completamente carregada. O capitão da reserva tem uma imensa capacidade de falar besteiras, absurdos e destilar preconceitos em uma velocidade que continua impressionando.
Porém, a frase de Bolsonaro na conversa com Onyx tem um diferencial a mais, se comparada com todos os absurdos ditos na conversa com jornalistas estrangeiros.
Primeiro porque mostra um completo desrespeito institucional da relação entre o presidente da República e os governadores das unidades federativas nordestinas, ao ponto, que ele acredita que pode falar aquilo que bem entender diante de centenas de câmeras e jornalistas.
Mas o mais grave foi que o Bolsonaro mostrou todo seu preconceito contra o povo nordestino. Para que não sabe, no Rio de Janeiro, “paraíba” é uma forma pejorativa para se falar dos nordestinos de forma geral. Bolsonaro chegou no Palácio do Planalto e levou para lá o preconceito, o racismo e o machismo. O presidente do país é um militar de pijama, que representa a famosa figura do homem valentão que é ao mesmo tempo a encarnação do cidadão de bem. E destila em suas falas seu ódio e seu preconceito.
Bolsonaro fala do Nordeste e dos nordestinos com certa raiva. Ao lado do preconceito que faz com que acredite que os nordestinos sejam “burros”, que “não sabemos votar”, que “precisam de ajuda”, e que seríamos “atrasados”, existe também rancor nas palavras de Bolsonaro.
É sempre bom lembrar que no processo eleitoral do ano passado, o Nordeste apresentou resultados bem diferentes do restante do país. Na nossa região o candidato da extrema-direita foi derrotado nas urnas. E hoje as cidades nordestinas são as capitais da resistência contra o atraso do governo Bolsonaro.
Foram nas ruas de Olinda e de Maceió que ecoaram no carnaval os gritos e cantos contra o presidente. O espírito do movimento Ele Não estava novamente nas ruas durante aqueles primeiros dias de março. Em Salvador e em Fortaleza os atos em defesa da educação e contra as medidas do governo foram gigantescos e históricos. Em Recife e São Luís a vontade de barrar a reforma da previdência colocou milhares de pessoas nas ruas.
Enfim, do litoral ao sertão. Da capital ao interior. Em todos os nove estados nordestinos a resistência contra a extrema-direita e contra o governo é majoritária e cresce a cada dia. O Nordeste é uma pedra no sapato do bolsonarismo, nos sonhos autoritários do ex-capitão, e nos desejos de lucro da burguesia brasileira.
As eleições e o peso do PT
A título de recordação e análise, no primeiro turno, Bolsonaro teve 26% de votos na nossa região. Ciro por sua vez teve 17%. E o candidato do PT, Haddad, 51%. Ou seja, se dependesse do Nordeste, Haddad havia sido eleito no primeiro turno.
No segundo turno das eleições o resultado foi ainda mais impressionante. Ao final da disputa, Bolsonaro teve 30,3%, e Haddad 69,7%. O PT venceu em 98,6% das cidades nordestinas. Foram vitórias em 1771 dos 1794 municípios nordestinos.
Algumas coisas explicam o porquê da ampla vitória do petismo na região nordestina. Primeiro é preciso reconhecer o óbvio. Houve um imenso impacto na vida econômica e social das pessoas da região durante os anos de governo do PT. Programas sociais e investimentos públicos, como por exemplo, Luz para todos, FIES, PROUNI, Bolsa Família, Mais Médicos, mudaram a vida das pessoas. A cada R$ 1 real investido por meio de investimento público na região, gerava para a economia o retorno de R$ 1,6 em circulação.
Antes o Nordeste era totalmente invisibilizado durante governos anteriores. O peso do PT na região tem a ver com o fato de o partido e em especial a figura de Lula, serem lembrados como aqueles que olharam pela primeira vez para a região. Se alimentar três vezes ao dia, e ter em casa eletrodomésticos, e comida até o fim do mês, faz toda diferença na vida de milhões de pessoas, que passaram a ter isso após Lula subir a rampa do planalto.
No interior, as expansões dos Institutos Federais, e criação de novas Universidades Federais, a Transposição do São Francisco, causam um impacto imensamente positivo na vida cotidiana das pequenas e médias cidades do interior nordestino. Qualquer pessoa que passar por essas cidades e conversar com cidadãos reais do Brasil profundo pode observar isso.
Os trabalhadores nordestinos mostraram uma consciência de classe, ao perceber o que estava em jogo nestas eleições. Eleger Bolsonaro significaria perder os avanços que vinham sentindo na região, seria votar em um candidato que abertamente falava em retirar direitos trabalhistas. Nós não queremos perder o que conquistamos, por isso fazemos do Nordeste a região da resistência no país.
O papel dos governadores petistas e a reforma da Previdência
Apesar do sentimento anti-bolsonaro ser majoritário na região e do PT ainda ter uma influência gigantesca sobre a classe trabalhadora, o papel dos governadores petistas nas principais pautas nacionais tem sido uma verdadeira tragédia.
Ficará para a história que os governadores do PT no Nordeste estiveram junto com o governo Bolsonaro na destruição da aposentadoria. O papel que Wellington Dias, governador do Piauí, foi pessoalmente vergonhosa. Ele parecia mais um membro do governo buscando negociar com outros governadores da região o apoio a reforma, do que um governador de um partido de oposição e que ainda é o maior do país.
Wellington Dias e Camilo Santana, governador do Ceará, iam semanalmente a Brasília. Implorar para que estados e municípios fossem incluídos no relatório da reforma. Uma traição aos movimentos sociais e aos eleitores.
Outro petista que tem comprido um papel vergonhoso é o governador da Bahia, Rui Costa. Rui, logo no primeiro dia do ano, declarou “que faria de tudo para ajudar o governo federal”, e assim tem feito. Seu governo sofreu uma importante greve estudantil e dos professores das universidades estaduais do estado, que denunciavam o sucateamento da educação feito pelo governo baiano. Houve um contingenciamento de verbas no valor de R$ 110 milhões. Durante a greve Rui afirmou que não deveria ser tratado como tabu a cobranças de taxas em universidades públicas. Rui, tem sido em especial, um inimigo do direito à vida da juventude negra. O governador apoia por exemplo o pacote “anti-crime” de Sérgio Moro, além de apoiar um modelo de segurança muito similar ao do bolsonarismo, focado no assassinato de suspeitos antes da averiguação, e óbvio esses suspeitos são negros e pobres.
Nordeste insurgente
Foi aqui no Nordeste que no início do século XIX, a Confederação do Equador se levantou e propôs uma República contra o atraso do império. Na Bahia, em 1835 ocorreu a histórica Revolta dos Malês. No Ceará, quatro anos antes da Lei Áurea, a escravidão foi derrubada por conta da luta negra e abolicionista. O Arraial de Canudos resistiu sobre estas terras. E nelas também surgiu e se levantou o Quilombo dos Palmares. A resistência, a luta popular, o desejo por igualdade, o combate contra a injustiça, fazem parte de gerações de nordestinos, e do cotidiano de nossa gente.
O Nordeste é linha de frente contra o retrocesso que hoje Bolsonaro representa. Com toda certeza, o histórico insurgente de nosso povo, junto com o orgulho e o sentimento de ser nordestino, estarão juntos nos movimentos contra a extrema-direita e a retirada de direitos. A vanguarda que surge na luta contra esse governo, representa isto e traz a vontade de superar e ir além do que foram os anos do PT. A lições do golpe, do governo Temer e das eleições de 2018, assim como os limites da política de conciliação, ficam como ensinamentos para essa vanguarda.
No fim, é sempre bom reafirmar. Jair Bolsonaro é um imbecil. E Nordeste é gigante e muito maior que seu preconceito.
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