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BRASIL

A prisão do vice-presidente do Condepe e os nossos desafios

Por: Safira Oliveira, assistente social e Coordenadora Geral da Associação de Servidores e Servidoras da Defensoria Pública do Estado de São Paulo

Acordamos nesta terça-feira (22) com a notícia da prisão temporária do vice-presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), Luiz Carlos dos Santos, por suposto envolvimento com o Primeiro Comando da Capital (PCC), que teria resultado em falsas denúncias de violência praticada por agentes do Estado.

A prisão de Luiz Carlos declara definitivamente o período de criminalização dos movimentos sociais e da militância política, o que nos provoca a necessidade de união, solidariedade e autoproteção entre aqueles e aquelas que lutam por uma sociedade livre.

Luiz Carlos é notório militante da área de defesa dos direitos humanos e no Condepe é o relator da Comissão de Violência e Letalidade Policial. No passado, já precisou ser inserido no Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas (PROVITA), justamente por lutar contra a violência policial e pela apuração de chacinas ocorridas no estado de São Paulo. O Condepe referiu ter analisado cada processo de relatoria de Luiz Carlos no Conselho, sendo que todos eles se tratavam de denúncias consistentes.

Na Operação Ethos, policiais adentraram a sede do Condepe (com mandado judicial) e apreenderam documentos e um computador de uso coletivo dos/as conselheiros/as. Tal situação pode colocar em mãos policiais informações sigilosas como de pessoas incluídas no PROVITA, em situação de ameaça e, ou denunciantes da violência policial, dos/as conselheiros/as e relatórios do Condepe sobre violência e letalidade policial. O Condepe oficiou os poderes competentes solicitando o sigilo das informações.

Esse acontecimento representa mais uma tentativa de desestabilizar a confiança da sociedade nos órgãos, entidades e movimentos sociais de defesa dos direitos humanos. Recentemente, após anulação do júri do massacre do Carandiru, o desembargador Ivan Sartori sugeriu que as entidades de defesa dos direitos humanos receberiam verbas do crime organizado. Ontem mesmo (22) a “bancada da bala” pediu na Assembleia Legislativa a abertura de CPI para investigação do Condepe e de seus conselheiros/as, além de solicitar alteração no modelo de escolha do/a ouvidor/a da Polícia do Estado de São Paulo, cargo ocupado e indicado pela sociedade civil, que não pode ser preenchido por policiais ou ex-policiais e que tem como função representar os interesses da sociedade em casos de irregularidades cometidas tanto pela Polícia Civil, quanto pela Polícia Militar.

Não podemos nos silenciar diante de mais essa forte investida contra as entidades e movimentos sociais de defesa dos direitos humanos, fundamentais e sociais. Faz-se urgente o tempo de ultrapassarmos os nossos limites e nos unirmos naquilo que nos faz iguais: a defesa intransigente de uma sociedade livre, digna e humana. Quem fará a nossa defesa seremos nós mesmos/as. Presenciaremos em breve a ampliação das acusações e prisões de integrantes de movimentos sociais, sindicalistas e membros de entidades de controle social. De que lado ficaremos?

Confira a nota do Condepe:

Nota do CONDEPE – Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana

Com relação à prisão temporária do Conselheiro Luiz Carlos dos Santos, Vice-Presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo – CONDEPE, no âmbito da operação Ethos, vimos esclarecer que:

1. O Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo – CONDEPE, criado pela Constituição Estadual Paulista, constituído por representantes da sociedade organizada, eleitos por entidades de base, sendo sua composição ainda integrada por representantes do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, do Governo do Estado de São Paulo, da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, Ministério Público do Estado de São Paulo, Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de São Paulo e Defensoria Pública do Estado de São Paulo, tem, dentre outras, a função institucional de receber, apurar e acompanhar denúncias de violações de direitos humanos;

2. O Conselheiro Luiz Carlos Santos é membro eleito do CONDEPE, indicado pela entidade CODE (Conselho Defesa Direitos Humanos de Cotia e Região), tendo sido eleito Vice-Presidente pelos membros do Conselho. Possui reconhecida trajetória de contundente defesa dos direitos humanos. Nos últimos anos, tem se dedicado a denunciar práticas de violência policial, a cobrar apuração das chacinas no Estado de São Paulo, bem como a apontar violação de direitos no sistema prisional;

3. Ao contrário do que se tem afirmado, nenhuma denúncia de violação de direito humanos apresentada pelo Conselheiro Luiz Carlos se mostrou inconsistente, sendo todas devidamente embasadas em processos administrativos e posterior apuração;

4. Nesse sentido, causou-nos surpresa a prisão do Conselheiro Luiz Carlos. Como defensores de direitos humanos, reiteramos o princípio fundamental da presunção da inocência;

5. O CONDEPE se coloca à disposição do Poder Judiciário para contribuir com a rigorosa apuração da verdade dos fatos, sem prejulgamentos;

6. Informamos que computador e documentos do CONDEPE, que guardam informações sigilosas acerca de pessoas que denunciam violação de direitos humanos, foram apreendidos. Exigimos a garantia da integridade institucional do Conselho, a preservação dos dados e manutenção do sigilo das informações;

7. Em um momento de ascensão de discursos e práticas que violam os direitos humanos, reafirmamos o papel do CONDEPE na defesa do Estado Democrático de Direito, das liberdades constitucionais, do direito à livre expressão e manifestação, refutando quaisquer intenções de criminalização dos movimentos sociais e dos defensores dos Direitos Humanos.

São Paulo, 22 de novembro de 2016
Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo

Foto: Reprodução TV Globo