Eu queria ficar em casa amanhã, mas infelizmente não posso.
Resolvi escrever esse texto em face da polêmica que cresceu na esquerda sobre ir ao atos amanhã ou não, a partir da publicação do texto do Luiz Eduardo Soares e do vídeo do Emicida.
Primeiro, que eu já iria em função do meu trabalho, de fotografar e registrar a história, mas se esse não fosse o meu trabalho, eu iria mesmo assim. E abaixo eu justifico os motivos debatendo ponto a ponto com os principais argumentos que surgiram sobre não ir:
1° Argumento – “Nossos protestos vão aumentar a contaminação e contribuir para as mortes de COVID-19”.
Sobre isso, os protestos estão sendo organizados para ter distanciamento social. Pelos menos essa é a dinâmica do protesto organizado pela Frente Povo Sem Medo em conjunto com outras organizações em SP, e também em Brasília. Mas ainda se não fosse organizado dessa forma, quero falar da realidade no DF: AQUI JÁ NÃO TEM MAIS ISOLAMENTO SOCIAL. Ontem saí para fotografar mais um ato (em frente à Fundação Palmares, organizado pelo movimento negro) e o que vi foi a volta à “normalidade”. Trânsito em horário de pico, estacionamentos lotados, shoppings cheios, as comerciais do plano piloto também cheias. Metrô e ônibus? Cheios, sujos e sem sanitização.
No dia de hoje, sábado, em um shopping como o Park Shopping, chegam a circular 12 mil pessoas. Quer aglomeração pior que essa? Com as pessoas respirando ar de ar-condicionado? O fato é que, com a reabertura do comércio levada a cabo por Ibaneis, as pessoas voltaram a circular normalmente, independente da nossa vontade de que se mantenha o isolamento social. Para que o isolamento social aconteça, é preciso um Estado forte atuando nesse sentido, para que o comércio fique fechado e as pessoas mais socialmente vulneráveis recebam um auxílio decente para se manterem. Só está em isolamento social quem ainda tem o privilégio de ficar em casa, com a possibilidade de fazer compras pela internet. No DF, a classe média que trabalha no serviço público federal e estadual, ainda pode ficar em casa fazendo seu home office, mas já tá saindo pra rua para outras coisas. Ontem o que vi foram os barzinhos já reabertos com gente bebendo na calçada. Já na periferia, a realidade já é difícil há algum tempo. Boa parte da população tá fazendo seu corre pra se manter, porque 600 reais não dá para pagar aluguel, luz, água, gás e comida. Boa parte da população não tem comida na mesa nem água limpa na pia, pois falta saneamento básico na maior parte dos lares brasileiros. Então não é um ato de rua, com distanciamento social, que vai fazer o contágio explodir, mas sim a irresponsabilidade do Governo Federal e do Governo Estadual.
[Para quem quer participar do ato, mas não quer ir a pé, também vai ter carreata no Eixo Monumental.]
2° Argumento – “Bolsonaro vai usar os atos da esquerda como pretexto para dar um golpe”
Bolsonaro não precisa de gente de esquerda na rua para dar um golpe. Ele já deu. E só os desavisados não perceberam e acham que ainda estamos sob normalidade democrática. Já são 3 mil militares ocupando cargos de livre nomeação no governo, fora 9 ministros militares. É uma composição de militares no executivo maior do que na época da ditadura. Mas e se ele usar atos de rua para fechar o Supremo e o Congresso? Vejam, para fechar essas instituições, Bolsonaro não precisa da esquerda na rua. Precisa apenas que esses órgãos levem adiante a cassação da chapa no TSE ou mesmo o processo de Impeachment.
3° – “Vai ter infiltrados nos atos, vai ter quebra quebra, e vão acusar a gente de terrorismo para instalarem o Estado de Sítio”.
Certamente os órgãos de inteligência e repressão que estão aparelhados por Bolsonaro e a familícia (PF, ABIN, PM, Exército, Força de Segurança Nacional) vão trabalhar para a desestabilização dos atos. Não há dúvidas que eles querem o caos. Mas esse trabalho aconteceria mesmo se os atos fossem após a pandemia, bastando apenas ser atos contra o governo. E se ficarmos reféns dessa lógica NUNCA poderemos convocar atos de rua.
A ÚNICA coisa que pode parar a escalada autoritária do regime é o povo na rua. SÓ. MAIS NADA. Sempre, na história, sem exceção, só povo na rua derrubou regimes autoritários.
A MAIOR ARMA DO FASCISMO É O MEDO QUE ELE PROVOCA EM NÓS. PRECISAMOS SUPERAR ESSE MEDO.
4° – “Melhor esperar o Congresso ou o STF fazerem alguma coisa e deixar o Maia, o Dória, o Witzel brigando com o Bolsonaro, do que a gente apanhar na rua. Os liberais que se lasquem”.
Só pensa assim quem confia plenamente nessas instituições (Congresso e STF). Elas só se sentirão à vontade para tomar decisões mais drásticas (Cassação da chapa ou Impeachment) se houver uma grande mobilização à favor, não só no Twitter ou no Facebook, mas nas ruas. Dória, Witzel, Crivella, Brunos Covas e outros governadores e prefeitos, estão confortáveis em suas mansões, de onde nunca dispensaram suas empregadas (a casa grande e senzala continuou a todo vapor na pandemia), trabalhando na reabertura, que já anunciaram que vão fazer.
Em suma, a hora de reagir é agora, depois pode ser tarde.
De todo modo, se você não pensa em ir, não tente desmobilizar quem vai 😉
Se você não vai, você pode protestar de outra forma: faça panelaço na hora do ato na sua cidade, grite Fora Bolsonaro para todos os vizinhos ouviram, coloquem pano preto na janela, façam textão contra Bolsonaro nas suas redes sociais e encham a paciência dos poucos bolsominions da sua família, defendendo quem for no ato.
Só não caiam na narrativa golpista do governo de desmobilização dos atos.
*O artigo representa a opinião da autora e não necessariamente do Esquerda Online.
Comentários