O 30M serviu para não termos dúvidas do potencial de mobilização do movimento estudantil em todo o Brasil. Diferentemente do 15M, nesta quinta-feira não houve greve nacional das trabalhadoras e trabalhadores da educação, o centro da convocação veio de nós, estudantes.
De acordo com a centralização da UNE, rolaram ações em 183 cidades de 22 estados mais o Distrito Federal. Do interior às capitais, há uma energia em expansão entre a juventude, movida por uma ampla diversidade. Nas ruas, nossas faixas e cartazes não se limitam a defesa da educação pública: falamos da tragédia que significa o bolsonarismo para o meio ambiente, do caos na saúde pública, da importância do investimento em ciência e tecnologia, nos opomos a disseminação da lógica belicista, ao racismo que visa desestruturar as ações afirmativas e também gritamos contra o fim da previdência social e a política econômica de Paulo Guedes.
Não podemos esquecer que estamos numa luta de longo prazo, mas comemorar as vitórias pontuais é sempre bom. Ganhamos a batalha das ruas em maio e agora devemos nos preparar para os embates de junho, que tendem a ser mais duros e por isso nos obrigam a analisar com cuidado os elementos que compõe o novo quadro do xadrez político.
O novo perfil dos domingos verde-amarelos
Superamos em termos quantitativos o 26M, mas não devemos subestimá-los. Os domingos verde-amarelos já passaram por diversas metamorfoses desde o start golpista de Aécio Neves em outubro de 2014. O último mostrou que a liderança agora está nas mãos de movimentos neofascistas e com uma base social abertamente favorável ao fechamento do Congresso e do STF. É o bolsonarismo puro que defende os tiros de Witzel contra igrejas e escolas no Rio de Janeiro e não se abala com o envolvimento da família presidencial com as milícias. São aqueles que defendem que a oposição vá para a Ponta da Praia (local de desova de corpos durante a ditadura), como disse Bolsonaro em seu último discurso de campanha.
A crise do governo foi respondida com radicalização pelo setor mais fiel ao presidente e isso deve nos deixar em alerta máximo, pois eles contam com o apoio das forças repressivas do Estado, além da milícia digital de fake news que, tragicamente, forma a opinião de algumas centenas de milhares de pessoas.
Autoritarismo institucional e a repressão represada
A busca pelo diálogo com a população tem sido a marca das nossas ações de rua. É esse o principal elemento que impediu os governos federal e estadual de usarem a repressão direta nas ruas em larga escala, pois estamos conquistando apoio popular.
Porém, o governo ataca por diversos flancos. Ontem foi publicado o Decreto 9.756, que proíbe instituições federais de terem seus próprios sites e exige que o conteúdo divulgado passe por aprovação prévia do governo. Se somarmos isso às declarações do MEC incentivando a denúncia contra professores e estudantes, vemos como o governo se utiliza da máquina estatal para coagir institucionalmente e, ao mesmo tempo, mobilizar sua base social.
A declaração sobre a “balbúrdia” aliada a ação da milícia digital, que divulgou imagens de conteúdo pornográfico depreciativo sobre as universidades, foi uma tentativa de criar o álibi da repressão direta ao movimento, mas deu errado graças a reação de milhares de estudantes que mostraram o que realmente faziam nas salas de aula e laboratórios de pesquisa.
Cabe a nós continuar construindo ações que dialoguem nas ruas e abram as portas das universidades, escolas e institutos federais ao povo. A única forma de derrotar a inevitável ofensiva repressiva é jogar todas as fichas em ações massivas que despertem simpatia popular.
A oposição neoliberal quer nos usar como linha auxiliar
Desde a posse de Bolsonaro, toma corpo uma oposição neoliberal no Brasil, capitaneada pela mídia corporativa, principalmente através da Rede Globo e da Folha de São Paulo. Eles concordam com a agenda econômica de Paulo Guedes e cia, mas possuem diferenças com a agenda conservadora do fundamentalismo evangélico e com o caráter despótico do clã. Não são contra os ataques a democracia, do contrário, apoiaram toda a trama golpista, porém, perderam protagonismo nas negociatas políticas e espaço na formação da opinião pública.
Por mais que estejam dando espaço destacado a luta estudantil, não são nossos aliados. A cobertura escandalosa do 26M foi a prova disso: esconderam as reais intenções dos manifestantes para inflar um falso apoio popular a reforma da previdência e defender o pacote racista para a segurança pública.
Na primeira oportunidade, eles jogarão o movimento estudantil para os leões, ao passo que também trabalham para construir jovens lideranças palatáveis com a força da sua narrativa, a exemplo de Tabata Amaral, anti-bolsonarista, porém, liberal.
Com paciência e estratégia, lutemos para ser maioria
Nos últimos anos, fizemos ações grandiosas como as centenas de ocupações contra a PEC 55, um momento incrível de resistência e auto-organização, mas, insuficiente para derrotar Temer. A lição que fica é que sozinhos não conseguimos vencer. Precisamos articular nossas demandas com o movimento sindical e parar o Brasil em 14 de junho para criar condições de emparedar o governo.
Também é necessário usar e abusar de criatividade política para disputar a consciência da população que sobrevive do trabalho informal ou está desempregada, dos que vivem nas periferias distantes das universidades, enfim, nossa luta deve mirar o objetivo de construir forças sociais suficientes para tornamo-nos maioria na sociedade, especialmente nas classes populares, onde o governo derrete mais rápido. Não será um processo rápido, mas é preciso construí-lo e isso passar por dar consistência programática ao nosso movimento. Nossa difícil missão é convencer a população, contra o bolsonarismo e a oposição neoliberal, que só com um programa que inicie pela ampliação dos direitos sociais e a defesa das liberdades democráticas é que o Brasil sairá da crise.
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