Por: Fanny Spina, de Florianópolis, SC
Nós lésbicas temos no mês de agosto um período para refletirmos sobre a nossa resistência e existência numa sociedade capitalista construída em cima do racismo, machismo e do patriarcado, onde mulheres que amam mulheres é contravenção. Usar o termo visibilidade tem relação direta com o apagamento histórico, político, social e cultural que nos atingem, pois enquanto contraventoras nos empurraram para os armários. Aproveitar esse dia da visibiliade é gerar debate para que não sejamos mais invisibilizadas e escondidas, por isso resolvi trazer essas reflexões para o debate da militância e ativismo das lésbicas.
Dentre as muitas questões que são invisíveis, a violência é uma das que mais assusta. Nós sabemos individualmente e através dos relatos das próximas a nós, entretanto nenhum dado da violência lesbofóbica é colhido e estudado para a criação de políticas públicas. Por exemplo, é sabido que os estupros corretivos, tentativa para fazer as lésbicas “corrigirem” sua sexualidade, acontecem, mas quando denunciados não são compreendidos como uma violência específica e acabam sendo invisibilizados. Então, a partir disso, não temos um acolhimento apropriado e nem uma forma de combater tal violência, pois ela acaba se tornando invisível. Mas, é necessário ter certeza de que a violência lesbofóbica se endurece quando se é negra e periférica sujeita à violência policial. Por isso, não podemos esquecer o que aconteceu com Luana Barbosa.
Falar de saúde para nós mulheres lésbicas é sempre um constrangimento, muitas vezes dentro dos consultórios deixamos nossa sexualidade de lado para evitar os possíveis julgamentos morais. Primeirament,e porque a saúde da mulher se constituiu historicamente como mera saúde da reprodução, e saúde sexual focada no sexo heterossexual. Pensando em nossa saúde sexual uma coisa é evidente, muitas de nós não sabem como ter um sexo protegido e seguro, tanto pela falta de conhecimento, quanto pela falta de produtos para nossa proteção. Diante disso, surge uma lenda: que nós não pegamos e nem transmitimos DSTs. Isso é grave e só mostra como ainda não temos direitos iguais à saúde sexual.
Nossa sexualidade sempre vive na corda bamba entre o nojo e o fetiche. Seja na rua, na balada, no baile, ou no trabalho sempre estamos sujeitas aos olhares de desprezo, ou assédio. Uma vez que o assediador sai dos olhares e passa para a ação com o famoso “posso participar também?”, ao ser rejeitado tem nojo da nossa sexualidade, isso porque no imaginário masculino hétero o homem é sujeito fundamental para o sexo. Esse imaginário é muito alimentado pela indústria pornográfica, que infelizmente é uma das principais referências sobre sexo para jovens, isso porque temos uma educação moralista que evita o debate sobre a sexualidade, fazendo com que a pornografia ocupe esse lugar.
Nos últimos tempos, o debate sobre representatividade vem crescendo entre LGBTs e negras e negros, ela é de fato importante para nossa autoestima e reconhecimento, entretanto ela tem se tornado cada vez mais uma ferramenta de marketing para atingir nichos, do que algo significativo que transforme o nosso dia a dia. Por mais pantanosa que seja essa discussão, temos que fazer o questionamento: qual tipo de representatividade que queremos? Aquela que nos enxerga como meras consumidoras, ou aquela das lésbicas que nunca se calaram na luta por nossos direitos? Aquela que disputa nosso interesse consumidor é a mesma que nos explora em empregos precarizados, como o telemarketing.
Por fim, é preciso dizer que o nosso resistir e existir transgride cotidianamente as bases do capitalismo, e por isso nós temos que nos afirmar na luta política pela transformação da sociedade, pois enquanto este sistema estiver em voga, nossa liberdade para viver e nossa sexualidade sempre serão minadas, sendo permitidas somente para aquelas que são classe elitizada. É preciso lutar por uma sociedade socialista onde nossas diferenças não sejam fator para a desigualdade.
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