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BRASIL

Bolsonarismo intensifica ofensiva contra institutos de pesquisa

Henrique Canary
Fabio Pozzebom/Agência Brasil

Ministro da Justiça Anderson Torres

A luta do bolsonarismo por mudar o regime político por dentro dos próprios mecanismos do regime segue a todo vapor. Nesse sentido, dois fatos chamaram a atenção esta semana.

O primeiro foi a iniciativa do Ministro da Justiça Anderson Torres de investigar os institutos de pesquisa por suposta fraude na realização e divulgação das pesquisas eleitorais do presente pleito. Torres fez o pedido à Polícia Federal no dia 4 de outubro, com a justificativa de que vários institutos de pesquisa (em especial Datafolha, Ipec e Ipespe) publicaram levantamentos similares às vésperas da eleição e erraram as projeções muito acima da margem de erro declarada. Torres ignora o fato de que pesquisas eleitorais não são projeções, mas sim descrições das intenções de voto dos eleitores no momento da realização da pesquisa e que essas intenções podem mudar mesmo em um intervalo pequeno de tempo, como um ou dois dias, fato que parece ter ocorrido no primeiro turno das eleições.

A tentativa de perseguição contra os institutos de pesquisa foi secundada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), dirigido por Alexandre Macedo, homem ligado ao ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, do PP.

Ontem (13 de outubro) finalmente, o Ministro do STF e atual presidente STE Alexandre de Moraes determinou a suspenção das investigações do MJ (PF) e Cade contra os institutos de pesquisa. Em seu ofício, Moraes argumentou que a regulamentação das atividades dos institutos de pesquisa é prerrogativa exclusiva da Justiça Eleitoral e que portanto não cabe ao MJ ou Cade pedir investigação sobre o tema. Moraes encaminhou o caso à Corregedoria-Geral Eleitoral e à Procuradoria-Geral Eleitoral para que se investigue o pedido de investigação. Interessante desdobramento. Moraes afirmou ainda que os pedidos de investigação do MJ e Cade “parecem demonstrar a intenção de satisfazer a vontade eleitoral manifestada pelo chefe do Executivo e candidato a reeleição” e que tais medidas poderiam caracterizar “desvio de finalidade e abuso de poder por parte de seus subscritores”.

Assim sendo, pelo menos por enquanto, esse episódio parece ter encontrado algum desfecho. No entanto, essa não foi a única e provavelmente nem mesmo a mais grave iniciativa dos bolsonaristas contra o regime político nos últimos dias. O Presidente da Câmara dos Deputados Arthur Lira realizou na semana passada uma manobra que ainda pode ter sucesso e que visa criminalizar diretamente a atividade de pesquisa de opinião no país. Lira anexou a um projeto já em andamento (e que portanto não precisa passar por comissões ou receber o crivo de urgência por parte dos deputados) um texto que estabelece de 4 a 10 anos de prisão para quem publicar “nos 15 dias que antecedem às eleições, pesquisa eleitoral cujos números divergem, além da margem de erro declarada, em relação aos resultados apurados nas urnas”. Ou seja, se um instituto de pesquisa publicar um levantamento com um determinado cenário a 10 dias das eleições e houver uma reviravolta política e o cenário mudar, seus responsáveis podem ser penalizados, mesmo que não seja comprovado dolo (intenção), e trate-se de mero erro ou mudança de cenário. O texto, apresentado originalmente pelo líder do governo na Câmara Ricardo Barros (PP-PR), prevê que são passíveis de condenação o estatístico responsável pela pesquisa, o responsável legal do instituto de pesquisa e o responsável legal da empresa contratatante da pesquisa.

Até agora, o governo não conseguiu encaixar a votação na pauta, entre outras coisas, pelo baixo quorum na casa em função das eleições. De qualquer forma, Lira já afirmou em entrevista que, caso aprovado, o projeto não se submeteria à regra da anuidade, mas sim entraria em vigor imediatamente.

Esses dois fatos demonstram o que viemos afirmando em outros textos neste site: os modernos governos fascistas e neo-fascistas não chegam ao poder, regra geral, colocando tanques ou soldados nas ruas, mas sim pelos mecanismos democráticos tradicionais, como eleições e plebiscitos. Uma vez no poder, também não necessitam dar autogolpes. Basta mudar o regime político utilizando-se das ferramentas do próprio regime. As perseguições impetradas contra opositores não aparecem como perseguições políticas ou ideológicas, mas sim como mero combate a “crimes comuns”. Tal é o modus operadi do bolsonarismo e esse é o perigo que enfrentamos: o enraizamento deste movimento nos mecanismos de Estado e sua transformação em um regime longevo, estável e ainda mais destruidor e assassino.

 

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