A fotografia que está circulando nas redes de um senhor deitado em uma maca, respirando com auxílio de oxigênio do lado de fora de um hospital público nos dá a real dimensão da situação da pandemia no Rio Grande do Norte nesse momento. Assim como na maior parte do país, a realidade da crise sanitária no estado é de total descontrole. Estamos vivenciando todas as características de uma crise humanitária. O sistema público de saúde está em colapso. Desde o mês de fevereiro a ocupação dos leitos críticos e de UTI para Covid-19 está acima de 93,32%.[1]. Existe hoje 05/04/2020, 51 pacientes que aguardam a liberação dos poucos leitos de UTI disponíveis. Os hospitais estão lotados, mesmo as unidades de pronto- atendimento nos bairros, e muitas prefeituras ligaram o sinal vermelho para a possibilidade de falta de oxigênio nos hospitais.
Esse é o reflexo das altas taxas de contaminação no estado que crescem de forma constante desde novembro do ano passado e mais acentuadamente com o início das férias, festas de final de ano e, principalmente com o carnaval, datas em que o governo estadual e prefeitura não adotaram nenhuma medida de restrição a circulação de pessoas, como é possível verificar no gráfico 1
GRÁFICO 1- Média Móvel de casos de Covid-19 no Rio Grande do Norte – 01/04/2020 a 01/03/2021
Disponível em https://bigdata-covid19.icict.fiocruz.br/
A média móvel no número de infectados durante o carnaval ultrapassou até mesmo o pior momento da pandemia no ano passado, que se deu em meados de julho. Isso acabou por ser determinante na quebra dos piores números na média móvel de mortalidade por Covid-19 do ano passado conforme pode ser visto no Gráfico 2
GRÁFICO 2- Média Móvel de óbitos da Covid-19 no Rio Grande do Norte – 01/04/2020 a 01/03/2021
Disponível em https://bigdata-covid19.icict.fiocruz.br/
A média móvel no número de mortos por Covid-19, neste março último foi pior que o dia mais letal da Covid-19 no ano passado, 41,86 nesse contra 41,56 mortos no ano passado. O que difere as duas ondas é a velocidade com que atingimos esse pico. Enquanto no ano passado foram necessários quatro meses para atingirmos esse pico, esse ano o fizemos na metade do tempo.
Nesse sentido, segundo projeções realizadas pela Universidade de Washington para o Brasil e também para o Rio Grande do Norte, se nenhuma medida mais restritiva for realizada, a média móvel no número de óbitos pode até dobrar até maio, saindo do patamar de 41 mortos por dia, para beirar os oitenta mortos, como mostra o gráfico abaixo:
GRÁFICO 3 – Projeção dos óbitos por Covid-19 para o Rio Grande do Norte até 21 de junho de 2021
Disponível em: https://covid19.healthdata.org/brazil/rio-grande-do-norte?view=total-deaths&tab=trend
No melhor dos cenários, com o uso disseminado de máscaras e restrição de circulação de pessoas, chegaremos ao pico por volta do dia 24 de abril, com 60,67 média móvel do número de mortos/dia. No cenário atual, chegaremos ao pico no dia 08 de maio chegando aos 69,67 de média móvel de mortos por dia. Já no pior cenário, que é o de livre circulação aos períodos pré-covid, chegaremos ao pico em 11/05 com média móvel de 76,29 mortos/dia.
Mesmo com esse quadro dramático, somente no dia 20 de março a governadora Fátima Bezerra (PT) suspendeu o ineficiente toque de recolher noturno, decretando novas medidas restritivas que foram válidas até essa segunda-feira, cinco de abril, para tentar aumentar o isolamento social e diminuir o contágio. Dentre as medidas estavam: o fechamento do comércio não essencial e a imposição de que bares e restaurantes só atendam por delivery. Porém, cedeu a pressões de setores empresariais mantendo fábricas e hotéis funcionando. O prefeito de Natal, Álvaro Dias (PSDB), que sempre incentivou de forma irresponsável o uso de tratamento precoce com Ivermectina para confrontar-se com o governo estadual, chegou a editar um novo decreto permitindo a abertura das escolas privadas, academias e celebração em templos religiosos, mas devido a pressão do Ministério Público e da opinião pública acabou recuando. Está claro que o prefeito de Natal faz joguete com a vida da população, alinhando-se ao governo federal através de um discurso demagógico e anti-científico, para agradar grupos conservadores da sociedade potiguar e posicionar-se em oposição ao governo Fátima, vislumbrando as eleições de 2022.
Como esperado, as limitadas, mas importantes medidas restritivas de pouco mais de uma semana serviram apenas para estabilizar o quadro, com a diminuição pela metade da fila por leitos de UTI. Mesmo diante dessa situação de extrema gravidade, com as quatro regiões do estado com mais de 95% dos leitos de UTI ocupados (e na região do Seridó com 100% de ocupação) a governadora em uma reunião à portas fechadas com entidades empresariais decidiu que nessa segunda os serviços não essenciais voltassem a funcionar em todo o estado.
Ressalta-se que Junto com o agravamento da pandemia no estado, veio à piora das condições de vida da classe trabalhadora, sobretudo dos seus setores mais vulneráveis, como mulheres e a população negra. Segundo o IBGE, o desemprego bateu recorde no RN em 2020 (15,8%), a maior taxa dos últimos nove anos, bem acima da média nacional que foi de 13,5%.[2] Isso significa que cerca de 243 mil pessoas estavam desempregadas no estado, somado com 323 mil desalentados que deixaram de procurar emprego na pandemia. A consequência direta do crescimento do desemprego foi o aumento das famílias em situação de pobreza, pois com o fim do auxílio emergencial em dezembro, que beneficiava 580 mil domicílios em todo o estado, 314.417 pessoas voltaram a viver com apenas R$7,60 por dia. [3] Uma das faces mais cruéis dessa realidade foi o aumento da população de rua, pois muitas famílias não tendo condições de se alimentar e pagar o aluguel, foram obrigadas a viver nas ruas. Dados oficiais confirmam que o número de pessoas em situação de rua aumentou para mais de 1800 (somente as cadastradas) em todo o estado, a grande maioria na capital, que possui apenas um albergue, com 50 vagas, funcionado no centro da cidade. [4] Para piorar, seguindo os passos do prefeito tucano de São Paulo, Bruno Covas, que colocou pedras debaixo dos viadutos para impedir que pessoas dormissem, a Prefeitura de Natal vem adotando uma política higienista semelhante, ao expulsar dezenas de famílias do viaduto do Baldo, no momento mais crítico da pandemia. [5] Também chama atenção que, segundo pesquisa da OBVIO/RN, houve o aumento de 258,7% dos casos de violência doméstica e tentativas de homicídio contra as mulheres, exigindo a imediata ampliação da rede de proteção e apoio às mulheres diante da intensificação da crise social no estado. [6]
É primordial afirmar que o principal culpado por essa situação sanitária, econômica e social, sem sombra de dúvidas, é o governo Bolsonaro e sua política genocida que sempre negou a gravidade da pandemia e fez campanha para que os trabalhadores “escolhessem entre morrer de fome e morrer de Covid-19” empurrando-os, criminosamente, para as ruas e relativizando os protocolos de segurança. Porém, não podemos deixar de sublinhar que a nível estadual, medidas simples e eficazes que poderia ter um grande impacto no controle da pandemia não foram tomadas. O governo Fátima, por ter o apoio de importantes setores populares, tinha a obrigação de apresentar um conjunto de medidas sociais e econômicas que se diferenciasse radicalmente do governo Bolsonaro e do representante das velhas oligarquias, Álvaro Dias. É insuficiente se diferenciar apenas empenhando apoio à ciência e aos protocolos sanitários. O pedido vago de “fica em casa” nas propagandas na TV do “governo cidadão” sem oferecer as mínimas condições sociais para que as pessoas se protegessem contribuiu para desresponsabilizar o poder público e individualizar o problema.
Sob a liderança e coordenação do governo estadual, a máquina pública do estado e dos municípios poderiam ter se articulado para tomar, desde o início, uma serie de medias que poderiam ter causado grande impacto social, tais como: a distribuição permanente de máscaras adequadas à população, testagem em massa, auxílio emergencial local para os trabalhadores desempregados, autônomos e famílias que dependem dos programas assistenciais do governo, distribuição semanal de “kit merenda-escolar” às famílias dos alunos de escolas públicas, abertura de mais restaurantes populares nas periferias, suspenção do pagamento de alugueis para as micros e pequenas empresas, dentre outras medidas necessárias. Alertamos que ainda há tempo para que essas medidas sejam tomadas e muitas vidas sejam salvas.
Além disso, é preciso tomar medidas para proteger aqueles que trabalham nos serviços essenciais e precisam sair de casa, a começar por enfrentar o problema da superlotação do transporte público em Natal e região metropolitana, pois os trabalhadores convivem diariamente com o esse problema crônico, agravada pela redução da frota em circulação com a conivência da prefeitura de natal e do governo estadual. Os sucessivos aumentos no preço da passagem não repercutiram na melhoria do serviço. Assim, o transporte coletivo tem sido um potente propagador do vírus. É preciso romper com as máfias que controlam o sistema de transporte coletivo e enfrentar o problema de frente com a criação de uma empresa pública de transporte coletivo com passe livre para estudantes e desempregados e preços acessíveis para toda a população.
Os trabalhadores da saúde que estão na linha de frente estão trabalhando no limite. A atual situação da pandemia está impondo condições de trabalho cruéis para os trabalhadores da saúde no Rio Grande do Norte, principalmente os que estão na assistência direta aos pacientes com Covid-19. A iminente falta de insumos básicos como oxigênio medicinal, anestésicos e outros itens essenciais às UTIs, elevam ainda mais as condições de penúria no dia a dia dos trabalhadores da saúde que, além de já conviver com uma grande carga de trabalho e exaustão psicológica, podem ter que lidar com situações desumanas na assistência aos pacientes. Tudo resultado do desastre da condução desastrada do governo genocida que sequer garante itens essenciais para tratamento dos pacientes, assim como fez com as vacinas.
Além de enfrentar esta situação, é em meio à pandemia que o governo genocida e o Congresso Nacional embutiram na lei que recria o auxílio emergencial, o congelamento de salário dos servidores públicos, reduzindo ainda mais o poder de compra dos salários dos servidores da saúde. Tanto os servidores estaduais do RN, quanto os servidores da Capital, Natal, estão a mais de 10 anos sem reposição salarial. O mesmo ocorre com vários municípios da região metropolitana e interior do Estado. Na verdade o título de herói dado aos trabalhadores da saúde durante esta pandemia, não os poupou da política ultra neoliberal que aniquila o poder de compra dos trabalhadores e destrói os serviços públicos
Na educação a situação é de medo e falta de perspectivas. Nesse momento as escolas públicas estão fechadas e as privadas voltaram a funcionar presencialmente com o fim do decreto. As escolas públicas iniciaram o ano letivo funcionando com aulas virtuais. Dezenas de trabalhadores em educação já morreram de Covid-19 no RN, inclusive professores da rede privada que estavam trabalhando de forma presencial. Se não bastasse, em meio ao momento mais crítico da pandemia, a Câmara Municipal de Natal votou, em plenário virtual, um projeto estabelecendo a Educação como atividade essencial, atendendo ao setor da educação privada, com o objetivo de abrir essas escolas de qualquer maneira e pressionar pela abertura das escolas públicas. Fazem cortina de fumaça para esconder a realidade de abandono da maioria das escolas públicas que não receberam nenhuma readequação para preparar o retorno às aulas presenciais e os profissionais seguem sem vacinação. Importante frisar que as aulas remotas estão sendo reponsabilidade exclusiva dos professores, que usam seus aparelhos pessoais, internet e buscam cursos de aperfeiçoamento por conta própria. Sem falar o cenário de exclusão, tendo em vista que a maioria dos alunos não tem acesso às aulas por não possuírem acesso aos equipamentos e internet e nenhum auxílio foi ofertado nesse sentido. A última assembleia do SINTE aprovou que sem vacina a categoria não retornará às aulas presenciais e que uma greve sanitária poderá ser decretada em todo o estado.
Por um Lockdown nacional imediato!
Vacinação para todos já!
Auxílio emergencial de R$ 600 a todos que precisam! Auxílio emergencial com recursos do estado e municípios para complementar o nacional!
Distribuição de Kits de merenda escolar semanal em todas as escolas públicas do RN! Chip com pacote de internet para alunos e professores!
Estabilidade no emprego enquanto durar a pandemia!
Congelamento dos preços alimentos da cesta básica e dos combustíveis!
Suspensão dos aluguéis e contas de água e energia das famílias de baixa renda!
Auxílio financeiro imediato aos pequenos negócios, por meio de um programa de empréstimo dos bancos públicos!
Em defesa do SUS, dos servidores e dos serviços públicos!
Fora Bolsonaro! Impeachment já!
NOTAS
[2] http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/taxa-de-desemprego-bate-recorde-no-rn-em-2020/505712
[3] http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/sem-auxa-lio-314-mil-pessoas-voltam-a-misa-ria-no-rn/499017
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