É urgente um mundo novo
Um vírus se espalha pelo mundo. Em seis meses, mais de 10 milhões de pessoas infectadas, mais de meio milhão de mortes. O que explica em tão pouco tempo sermos obrigados a olhar para o mundo sobre uma nova perspectiva? Uma eventualidade? Imprevisível? Órgãos de saúde já previam a iminência de pandemias. Continuam prevendo que suas existências serão ainda mais comuns. Um alerta é feito há anos pela ciência: conforme a exploração da natureza avança fruto do desmatamento feito pelas indústrias, o agronegócio, a monocultura, a pecuária e a exploração animal em escala industrial, a temperatura média do planeta cresce ocasionando assim a existência de doenças inicialmente transmitidas por animais que perderam seus habitats naturais. O coronavírus é produto de um mundo em degradação, onde a relação da humanidade com a natureza é ditada pelo lucro. É produto da lógica que rege as relações de produção, reprodução e sociais. É produto de uma sociedade onde o lucro está acima da vida, de qualquer vida, menos daquelas que fazem parte de uma minoria privilegiada que se beneficia dessa lógica.
A origem e as consequências do coronavírus têm nome: capitalismo. Ouvimos falar de “novo normal”, de novas relações, de mudanças. Mas nada disso nos serve enquanto vivermos em um mundo onde aqueles que podem se protegem, dentro de casas bem estruturadas, onde tem ao seu dispor a manicure e a empregada que é obrigada a deixar o filho à própria sorte para passear com o cachorro da patroa. E para aqueles que não podem, só resta a preocupação de como continuar sobrevivendo.
Vivemos em uma realidade em que 1% da população global detém a mesma riqueza dos 99% restantes. Em que os privilégios de uma minoria são conquistados às custas da maioria. Maioria essa que têm classe, cor, gênero, rostos, nomes, sobrenomes: são as muitas Mirtes, empregada doméstica, mãe solo. Os muitos George Floyd, trabalhador, negro, assassinado pela polícia. Os muitos entregadores, trabalhadores precarizados, sem direitos trabalhistas. Os muitos jovens desempregados, sem perspectiva de futuro. As muitas mulheres responsáveis pelo cuidado com os filhos, os idosos, as casas. As muitas Marielles, que plantaram semente em todos nós. Somos muitas e muitos, e é por meio de nossas vidas que os super ricos mantém suas riquezas.
O coronavírus evidencia que ele pode não escolher quem adoece, mas o capitalismo, permeado pelo racismo, o machismo, a LGBTIfobia e a exploração da América Latina e da África que dura mais de 500 anos, já escolheu quais as vidas que não importam.
Para fazer valer tudo isso, colocam sobre nós, no poder, aqueles que se acham donos do mundo e da política. Que podem mandar e desmandar. São os responsáveis por representar os interesses da minoria e fazer “passar a boiada”. E são nos momentos de maior crise que surgem suas piores versões. Versões que trazem consigo as ideologias mais perversas que esse sistema produz e que estão presentes na história como aqueles que atentam contra a vida e a liberdade. Fascismo. Ditadura. O passado tenta se repetir no presente, disfarçado de novidade.
Recai sobre a nossa geração o maior peso de uma crise que não fomos nós que criamos. O peso de ocupar postos de trabalho cada vez mais precários, pois garantir direitos para nós, diminui os lucros deles. De um genocídio que cada vez mais aumenta as mortes dos jovens, pretos e pobres. De um mundo em destruição. De trazer no corpo o alvo da violência. De não poder ser plenamente quem queremos ser. De uma educação em decadência. O peso de sentir nosso futuro roubado.
Eles tentam tirar nossos sonhos, nos colocam na beira de um abismo, querem nos fazer acreditar que não temos escolha. Pois dizemos: Basta! Cansamos de ter a vida roubada. O peso não só traz dor, traz também luta. A luta para dizer que não aceitamos mais servir aos privilégios dos 1%. Em todo mundo a juventude se levanta e não se cala. Em cada luta ecoam gritos de uma geração indignada. #BlackLivesMatter, #TsunamiDaEducação, #AbortoLegalYa, #FueraPiñera, #NãoExistePlanetaB… lutamos no presente, por um outro futuro.
As fronteiras não impedem que, em cada país, em diferentes continentes, esteja presente em cada grito a evidência de que é urgente um mundo novo. Não é possível termos direito a uma vida diferente, enquanto a nossa existência se basear exatamente em uma lógica de funcionamento em que nem todos podem ter direito a vida, e dentre os que têm, poucos acumulam tanto, enquanto muitos têm tão pouco. Queremos um mundo diferente. Se o capitalismo tenta nos destruir, é hora de afirmarmos que somos anticapitalistas, porque nossos sonhos não cabem nesse sistema.
Queremos um mundo novo onde o trabalho seja mecanismo de transformação da sociedade e libertação da humanidade, e não objeto de exploração de nossos corpos. Onde não existam fronteiras, muito menos diferença entre países que só foi possível e se mantém até hoje, pela extração de riquezas das nossas terras através do extermínio dos povos originários e da escravidão. Onde a relação entre humanidade e a natureza se paute pela integralidade e o respeito consciente, compreendendo que toda degradação da natureza nos afeta diretamente, pois somos parte dela.
Um mundo onde as opressões historicamente construídas desapareçam, pois a estrutura será outra. Onde a cor da pele não seja determinante para saber quem mais morre. Onde ser mulher não seja sinônimo de estar mais suscetível a diversas violências. Onde poderemos amar quem for e ser quem quer que seja.
Um mundo onde a economia seja planejada e sirva a toda a sociedade. Onde a educação, a saúde e serviços essenciais sejam bens comuns e não tratados como mercadoria.
Um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres. Onde possamos ver que realmente a vida é bela, e que para isso a nossa geração e as futuras a limpem de todo mal, de toda opressão, de toda a violência e possam gozá-la plenamente.
A disputa por um mundo novo começa agora. Esse é um manifesto para ação, um chamado à organização. Nossos inimigos são fortes, mas eles não são invencíveis. Sem nós, eles não são nada, então tomemos deles tudo que é nosso. Esse deve ser nosso horizonte. Cada disputa de mentes e corações para um mundo novo é um ganho para um projeto coletivo. Sonho que se sonha junto, é realidade.
Nós do Afronte! convidamos você a lutar conosco por um mundo novo. Dia 15 de agosto iremos realizar um encontro virtual com várias discussões. Faremos ecoar por todos os cantos do país, que é urgente um mundo novo.
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