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BRASIL

Banco Mundial recomenda salário mínimo menor para a juventude

Alexandre Aguena*, de Niterói (RJ)

O Banco Mundial divulgou um relatório no mês de março recomendando políticas para elevar a produtividade da economia brasileira, que estaria crescendo em marcha lenta. A lenta retomada da economia traz para o primeiro plano reclamações como “alto custo Brasil” e “leis trabalhistas rígidas”. As tímidas conquistas sociais obtidas pelos trabalhadores, como as leis trabalhistas, vão sendo retiradas. Dizem que é necessário, acima de tudo, salvaguardar o emprego e para isso, é preciso modernizar e flexibilizar as regras de contratação.

Em meio a uma série de políticas, que incluem redução do salário mínimo, fim do abono salarial e concessão de seguro-desemprego apenas em raríssimos casos, o Banco Mundial produziu um documento com políticas específicas para a juventude, batizado de “Competências e Empregos: Uma agenda para a juventude“, cuja principal medida é a criação de um salário mínimo legal com valor reduzido para jovens (até 29 anos). O documento busca exemplos bem sucedidos de locais onde esta política foi posta em prática, mas limita-se a relatar que, nos poucos países onde foi aplicado, o “resultado da experiência foi misto”. Ou seja, o Brasil serviria de laboratório para esta medida.

Jovens trabalhando sob condições adversas e recebendo abaixo do piso salarial são uma realidade no Brasil, ainda mais por conta dos efeitos do desemprego e das contrarreformas, da crise econômica e do golpe parlamentar. Atualmente, 55% dos jovens estão “desengajados” (nem estudam e nem trabalham ou estão no setor informal, ou só estudam mas estão atrasados). Este percentual foi de 62% em 2004 vinha caindo ou mantinha-se estável até 2015, quando voltou a subir.

O relatório aponta que da população ocupada entre os 18 e 24 anos, 49% estão em empregos informais (tabela 1), ou seja, praticamente a metade. A empregabilidade para os jovens também é adversa, a taxa de desemprego atinge quase 20% considerando a faixa de 15-29 anos.

Fonte: Competências e Emprego: uma agenda para a juventude: Banco Mundial.2018, p. 22.
Fonte: Competências e Emprego: uma agenda para a juventude: Banco Mundial.2018, p. 22.

 

Fonte: Competências e Emprego: uma agenda para a juventude: Banco Mundial,2018, p.23.
Fonte: Competências e Emprego: uma agenda para a juventude: Banco Mundial,2018, p.23.

Isso significa uma juventude ocupando posto irregulares, temporários e informais. Em 2015, a informalidade voltava a se aproximar do percentual de jovens com vínculo formal (tabela 2).

A solução apresentada pelo relatório é transformar uma maior exploração sobre a juventude em lei. Para isso, propõem um salário mínimo especial para os jovens, logicamente, abaixo do salário mínimo comum.

Ao mesmo tempo chamam a juventude a compactuar com destruição da regulamentação do trabalho e com as terceirizações, sob o verniz de “maior flexibilidade” para os horários de trabalho. Assim transformam derrotas em vitórias para “aumentar o emprego” entre os jovens e “reduzir a informalidade”. Ou melhor dizendo: formalizar a superexploração dos jovens.

Crescimento do Apartheid social
Cruzando com dados da PNAD contínua do IBGE(3) não é muito difícil de concluir que no Brasil a proposta do Banco Mundial para a juventude tem um público alvo específico: a juventude negra. Agrupando os dados por raça percebe-se que há uma clara desigualdade. Pessoas que se declaram negras enfrentam taxas de desemprego mais altas.

No último trimestre de 2017, enquanto a taxa de desocupação para brancos era de 9,5%, para negros era de 14,5%.

Fonte: IBGE: PNAD, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, PNAD Contínua.
Fonte: IBGE: PNAD, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, PNAD Contínua.

Quanto ao rendimento médio também há um abismo. No  quarto trimestre de 2016, auge da crise, o rendimento médio do trabalhador negro era de R$ 1.461 enquanto de um trabalhador branco R$ 2.660, segundo a PNAD Contínua:

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, PNAD Contínua.
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, PNAD Contínua.

Segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas, as mulheres negras, moradoras de cidades do interior do Norte e Nordeste, com até 24 anos e com menos de quatro anos de estudo são as mais vulneráveis ao trabalho informal. O discurso do Banco Mundial pode parecer mais tentador para essa juventude. Porém, ao invés de garantir emprego digno para todos e todas, independentemente de cor ou raça, democratiza-se postos de baixa remuneração, temporários e sem direitos.

Baratear o custo da força de trabalho pelos métodos mais criativos não é algo moderno. A utilização do trabalho infantil e juvenil na indústria sob condições precárias, também, não é algo do capitalismo moderno. O motivo é simples: ao invés de pagar um salário digno para uma trabalhadora ou trabalhador sustentar a si próprio e sua família, os benfeitores da indústria contratam a família inteira com salários menores. Ganham mais braços para trabalhar a menor custo unitário e, para o bem de todos, garantem o sustento da mão de obra para hoje e para o futuro.

O problema é que a juventude de hoje será os trabalhadores plenos de amanhã, que trabalharão sob novas condições com a consolidação da reforma trabalhista. Com menor regulamentação, salários menores e piores condições. A juventude precisa de um horizonte de futuro digno, algo difícil de vislumbrar com a ofensiva sobre os direitos trabalhistas e de aposentadoria. Até mesmo o presente está em risco, já que pagar menos pela contratação de jovens está virando política pública.

* Alexandre Aguena é estudante de Economia da Universidade Federal Fluminense (UFF) e militante do coletivo Afronte!

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