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EDITORIAL

Aleppo: «Quero viver livre e dignamente. E isso é um crime para o regime de Bashar»

Publico originalmente em A l’Eccontre em 13/12/2016

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Homens jovens que fugiram de Aleppo foram conscritos forçadamente nas “tropas de choque” do regime contra os “bolsões de resistência” em Aleppo Oriental

Pela Redação de A l’Encontre

Segunda-feira (12) e terça-feira (13), as milícias controladas pelo regime iraniano – os Guardiões da revolução, o Hezbollah, as milícias vindas do Iraque – e as forças especiais da ditadura de Bashar el-Assad, apoiados diretamente pelos bombardeios da aviação russa, retomaram, distrito após distritos, a maioria de Aleppo Oriental graças a uma barragem de fogo que não cessou de crescer. Sabe-se de forma documentada que os bombardeios com bombas de fósforo, ou seja, obuses incendiários, fizeram vítimas civis, queimadas em plena rua.

Jovens rebeldes que se recusavam a ir para as zonas controladas pelos serviços especiais, pela polícia e pelo exército da ditadura. Nas redes sociais, confessavam seu medo de ser presos, torturados e executados. Efetivamente, informações coincidentes sobre tais abusos foram confirmadas, as que se acrescentam a conscrição forçada – documentadas pelos jornalistas que se encontram em Aleppo Ocidental – de homens jovens que fugiram de Aleppo nas brigadas pró-regime e enviados para a primeira linha de combate contra os últimos bolsões mantidos pela rebelião.

Os que se recusaram são “entregues” aos serviços especiais do regime, os Moukhabarat, que mataram cerca de 40.000 pessoas desde 2011.

Omar Ouahmane, correspondente da France Culture, reuniu vários testemunhos difundidos neste 13 de dezembro, em seu jornal das 7h: «Mondher passou os últimos cincos anos de sua vida testemunhando primeiro a repressão do regime de Bashar el-Assad, e depois os horrores da guerra civil. Para esse jovem pai de família, é melhor morrer do que voltar para as zonas controladas pelas forças governamentais. Ele declarou “ Não posso ir para as zonas controladas pelo regime”.

As pessoas são torturadas e mortas em grande número lá. É o regime que assassinou centenas de milhares de pessoas. Não terá nenhuma piedade. »Permanecer nos bairros rebeldes de Aleppo, quaisquer que sejam as consequências, é também a escolha que fez Mohammed para quem a liberdade não tem preço: «Por que não vou para a parte sob controle do regime? Porque eu seria preso. Quero viver livre e dignamente. E isso é um crime para o regime de Bashar. Centenas de pessoas que decidiram ir para as zonas controladas pelo regime hoje são consideradas como desaparecidas e esse seria também o meu caso. Alguns foram recrutados à força no exército do regime. E outros estão presos. » O único crime desses ativistas é o de ter testemunhado os abusos do regime sírio. »

Raphaël Pitti – u, ex-médico militar francês que cuidou, junto com outras pessoas em Aleppo, da formação de pessoal médico, os Praticantes da União das associações sírias de socorro médico, tendo estado sempre em contato com o pessoal médico presente no que resta da zona rebelde – declarava no dia 13 de dezembro ao jornalista Eric Biegala que as forças ditas legalistas “queimaram famílias dentro de suas casas. Eles executaram de forma sumária trinta crianças perto do cemitério. No hospital Al-Hayat mataram o conjunto do pessoal médico, bem como os doentes que estavam naquele hospital. As pessoas estão aterrorizadas. »

Os «boinas vermelhas »: de Grozny a Aleppo
No momento em que a aviação de Putin multiplica seus bombardeios: «as unidades especiais chechenas foram enviadas para a Síria, para realizar uma missão de ‘polícia militar’ e fazer a segurança da base aérea russa situada na província de Latakia. Dezenas de soldados que se preparam para embarcar em uma pista apareceram em um vídeo tornado público no dia 6 de dezembro e difundida, na quinta-feira, por um site ligado ao ministério da defesa e pela mídia russa», como relatado por Isabelle Mandraud no Le Monde de 10 de dezembro de 2016.

A experiência de Grozny – uma cidade que foi destruída e cuja população « rebelde » foi reprimida por métodos idênticos aos utilizados na Síria e em Aleppo – está sendo reciclada. Segundo o que diz Isabelle Mandraud: «A presença de militares chechenos na Síria constitui de fato um símbolo, como parecia sugerir um Tweet da embaixada russa nos Estados Unidos que foi publicado em outubro. Acompanhado de fotos recentes de Grozny, devastada pelos bombardeios russos no começo dos anos 2000 e depois reconstruída, a mensagem insistia no fato de que essa cidade, depois, tinha se tornado «aprazível, moderna e próspera”: “Não seria a solução que buscamos? John Kerry? Boris Johnson?”, foi escrito com a palavra-chave ‘Aleppo”.»

Aleppo oriental destruída, os caças Soukhoï, entre outros embarcados no porta-aviões Admiral-Kouznetsov, poderão bombardear a província de Idlib, a única saída que foi deixada para a população de Aleppo para tentar escapar do massacre.

A sinistra experiência de Grozny se repetiu aqui: em 2007, os « campos de refugiados », entre outros o de Tchernokosovo, serviram para «filtrar os resistentes”, em outras palavras, para torturá-los, executá-los ou exigir somas enormes para sua liberação. As práticas conjugadas dos Moukhabarat e dos « boinas vermelhas » chechenos – os últimos colocados formalmente sob o comando de Ramzan Kadyrov – poderão cometer novos crimes sob a cobertura da “luta contra o terrorismo».

A destruição de Aleppo Oriental e o martírio infligido à sua população não como único objetivo, segundo a fórmula atual da mídia, “retomar o controle do pulmão econômico da Síria». Para a ditadura de Assad e para os poderes políticos e militares que o enquadram (Irã, Rússia), trata-se de infligir uma derrota completa a uma das expressões, depois de 2012, do potencial que representou a «revolução síria» com suas estruturas locais que exigiam uma luta, uma resistência, depois uma sobrevivência das mais difíceis frente a uma contrarrevolução apoiada pela massiva intervenção aérea russa depois de outubro de 2015. É o que ressaltou, à sua forma, Brita Hagi Hasan, presidente do conselho local de Aleppo Oriental, nas duas conferências proferidas em Lausane e Genebra no dia 11 de dezembro.

(Redacão de A l’Encontre)

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aleppo / síria