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TEORIA

Memórias de um Cientista Brasileiro

por Marco Aurélio Mello

Um dos mais proeminentes cientistas e intelectuais brasileiros, Boris Vargafitg, lança na semana que vem, na Livraria Tapera Taperá, em São Paulo, um livro de memórias que, ao contrário de outros, não se apega ao passado, nem a personalismos. Lida com conflitos humanos, com a dinâmica das relações sociais e – principalmente – com a perspectiva política.

A narrativa não tem esse compromisso, mas é quase cronológica. O ponto de partida é a fuga dos pais, judeus perseguidos na Europa, para a América do Sul. Segue-se a infância e adolescência no Brasil, a militância, comunista e trotskista, a prisão e o exílio na Europa depois do Golpe Militar, que acaba de completar 60 anos sem festa, sem repúdio e sem indignação.

Boris tem clareza das ideias que defende e o faz com objetividade e concisão. Ele ainda encontra tempo no convívio para a ternura, o afeto e a escuta, qualidades raras nos intelectuais sempre tão afeitos aos livros e às ideias.

Este meu testemunho é de quem teve o privilégio de colaborar com o livro que começou a ser escrito pouco antes da pandemia e atravessou, não sem angústias, o período em que o país quase voltou como farsa ao tempo trágico do regime militar. Ameaça que – por enquanto – está afastada mas latente no horizonte.

Com a palavra, o professor Boris:

“Começamos a escrever em dueto, Marco e eu, e fomos interrompidos pela pandemia. Pus-me a escrever só, sem adotar uma narrativa linear, período após período, preferindo, ao evocar pela primeira vez um evento ou um tema, abri-lo no tempo, e assim  avançar.”

O título provém de uma  frase de Trotski, que diz: ‘Conhecer as causas racionais do que ocorre e encontrar seu lugar é a primeira obrigação de um revolucionário. E é também a maior satisfação pessoal …’. O livro tem três eixos: o primeiro cobre minha infância e família, os amigos, as leituras e influências afetivas e intelectuais e as viagens construtivas graças a uma situação familiar peculiar; o amadurecimento pessoal resultou do ingresso na militância de esquerda, provocada pelo suicidio de Vargas em 1954. O segundo eixo me levou ao movimento trotskista, que preencheu um “imperativo categórico”, enriqueceu meus conhecimentos e abriu possibilidades intelectuais imprevistas. O terceiro eixo me conduziu à biomedicina, ao Instituto Pasteur e, no final da trajetória, à USP. Meu balanço final é positivo; se não construímos a sociedade do futuro, sua perspectiva continua presente.”