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Colunas

Que o arco-íris ocupe a escola

Orgulho é resistência

Orgulho é resistência é a coluna LGBT do Esquerda Online, um canal livre e diverso de debates políticos e anticapitalistas para fortalecer as nossas ideias e a preparar no nosso movimento para as lutas que virão. Nossas existências, corpos, afetos e expressões são resistência!

Chegamos a mais um dia do Orgulho LGBTQIA+ quantas trabalhadoras da educação e estudantes vão desfilar seu orgulho dentro das escolas? Quantas aulas temáticas para discutir a diversidade de identidades de gênero e orientação sexual vão existir no dia de hoje? Será que o grêmio estudantil vai poder fazer um mural contando sobre a Revolta de Stonewall? Abordar a temática LGBTQIA+ nas escolas pode ser um trajeto muito complexo, mas é urgente entrarmos nesse enfrentamento! 

A escola tem sido campo privilegiado da disputa na pauta dos costumes, são diversos casos de perseguição a professoras, orientadoras, supervisoras por tocarem no debate da sexualidade, identidade de gênero e direitos humanos como um todo. Acusações como “doutrinação da ideologia de gênero”, “quer a destruição da família”, “isso é uma má influência para crianças e adolescentes”, entre outras têm sido recorrentes entre responsáveis, gestão escolar, secretarias de educação e parlamentares conservadores. Mas afinal, por que discutir questões de gênero e sexualidade na escola?

Em primeiro lugar, é importante pontuar que a escola é um lugar onde crianças e adolescentes vão conhecendo um pouco da vida em sociedade, principalmente no que diz respeito à convivência com o outro, também na construção da própria identidade. Neste sentido, se no espaço escolar não existe abertura para ensinar que seres humanos são diversos em sua etnia, modos de vida, corpos, orientação sexual e identidade de gênero, cria-se a ilusão da universalidade, em que a humanidade é fechada em um único pacote de atributos em comum, consequentemente se estabelece a falsa ideia das vivências e experiência alinhadas a essa universalidade e aquelas que divergem dessa expectativa. Isto acaba por gerar no cotidiano escolar aqueles que serão incluídos naturalmente e do outro lado quem terá que se adaptar/esconder ou quem será excluído, abrindo caminho para um conjunto de práticas hoje chamadas de bullying, que são preconceitos e violências praticadas no ambiente escolar. 

Quem trabalha em escola e coloca um pouco de atenção nas ofensas e xingamentos feitos em sala de aula percebe que são geralmente ligados a LGBTQIAfobia, racismo, capacitismo e pressão estética. Como intervir nestas situações, que produzem impactos profundos no desenvolvimento escolar e  bem-estar físico e psicológico de crianças e adolescentes, sem poder debater essas questões sociais na escola? 

As crianças e adolescentes LGBTQIA+ dependem de escolas que tenham direções e professoras mais progressivas para terem o básico de acolhimento, quando não há suas questões são constantemente negadas e invisibilizadas. 

Isso fica nitidamente evidenciado quando observamos as vivências de pessoas trans nas escolas onde é comum não terem seus nomes sociais respeitados, serem constrangidas em banheiros, entre outras situações que impactam diretamente o direito do acesso à educação, pois este cenário colabora para alta evasão escolar de pessoas trans.

Somado a isto, é necessário alertar que essa negação de direitos as pessoas LGBTQIA+ no campo da educação pode impactar profundamente a saúde mental, levando a sua consequência mais grave: o suicídio. Os levantamentos realizados por ativistas e pesquisadoras, como o Dossiê do Lesbocídio, o Relatório de Mortes violentas de LGBT+ e o Dossiê de Assassinatos e Violências Contra Travestis e Transsexuais, apontam que o suicído representa uma considerável parte das vidas LGBTQIA+ que tombam. 

Ainda é preciso considerar que segundo estudo realizado pelo Ministério da Saúde entre 2016 e 2021 houve um aumento do número de suicídios entre jovens e adolescentes na faixa etária de 10 a 19 anos. A escola pode ter um papel considerável e significativo na redução desses tristes índices se de fato passar a se constituir um espaço seguro para todas as pessoas em suas diversidades.

Mas infelizmente os tensionamentos produzidos a partir das disputas conservadoras na pauta dos costumes têm atuado de modo ostensivo para impedir que sejam construídas políticas públicas de proteção às crianças e adolescentes LGBTQIA+, logo eles que insistem no slogan “proteja as crianças”. 

Exemplo disso é o caso da orientadora Juliana Andozio em Florianópolis (SC) que por defender o direito de uma estudante trans usar o banheiro sem constrangimento, passa por um processo violento de perseguição incentivado por parlamentares da extrema-direita da cidade e quase perdeu o emprego, este é apenas um caso dentre centenas. 

Sem pudor, esses parlamentares ou influencers invadem escolas constrangem e violentam estudantes e trabalhadoras, é modus operandi deles viralizarem nas redes sociais cativando o público e eleitorado conservador. Inclusive, em um ano em que o debate sobre a violência nas escolas está tão em alta é necessário questionar o papel prestado por estes que invadem escolas para filmarem aula de professoras, destruírem murais, rasgarem faixas e até mesmo implodir eventos que tratam de diversidade, além de incentivarem abertamente a violência contra trabalhadoras da educação.

Quando essas propostas de políticas públicas para LGBTQIA+ nas escolas são pautadas no poder legislativo, o momento também é utilizado por esses políticos e influencers para barrar qualquer avanço e implantar o pânico moral, de que falar de sexualidade e identidade de gênero da escola é um perigo para crianças e adolescentes. Mas quem protege as crianças e adolescentes que não se enquadram na expectativa heterossexual e cisgênera? 

Esse é um cabo de força que educadoras e estudantes LGBTQIA+ e aliadas vem tensionando dentro das escolas para construção de espaços de acolhimento, proteção e conscientização, contribuindo para que a escola seja de fato um espaço que eduque para a vida em sociedade que respeite as diversidades. 

Essas iniciativas precisam ser apoiadas e incentivadas pelo movimento LGBTQIA+, sindical e estudantil fortalecendo a disputa na sociedade reforçando que debater gênero e sexualidade na escola é combater a violência (dentro e fora da escola), a evasão escolar e garantir a saúde mental. 

Sendo assim, é necessário voltar a reivindicar perante aos órgãos de educação a organização de instrumentos e políticas públicas que visem o combate à LGBTQIAfobia nas escolas, operando capacitações profissionais, cartilhas, revisões dos Projetos Políticos Pedagógicos das escolas e materiais didáticos. Outra necessidade existente é elaborar instrumentos que garantam o direito ao nome social para crianças e adolescentes nas documentações escolares ou a posterior retificação das mesmas, pois hoje essas garantias variam a depender das posições da gestão escolar. 

Que neste dia estudantes e trabalhadoras da educação possam comemorar o dia do Orgulho resistindo e ocupando o espaço escolar! Que possamos construir uma escola que inclua e proteja a todas crianças e adolescentes!