Publicado em 16 de maio de 2021, em The Next Recession.
Tradução: Gabriel Dayoub
Os bombardeios da última semana aprofundam a calamidade vivida na Faixa de Gaza. Com 375 quilômetros quadrados, a região é o lar de aproximadamente 2 milhões de palestinos. Mais da metade deles são refugiados. Desde 2007, Israel e Egito impõem ao enclave um bloqueio devastador, estrangulando sua economia e privando seus habitantes de muitos insumos vitais, incluindo comida, combustível e remédios.
FIGURA 1: Faixa de Gaza: crescimento real do PIB e do desemprego, de 1995 a 2018.
O povo de Gaza vive confinado na pequena porção de terra e sujeito a um embargo terrestre, aéreo e marítimo. A entrada de mercadorias foi reduzida bruscamente e o comércio exterior, suspenso. Ao mesmo tempo, o acesso da população à água potável é limitado, não há fornecimento regular de energia elétrica ou mesmo um sistema de esgoto adequado.
A taxa de pobreza na Faixa de Gaza atingiu 80% durante os mais de dez anos de bloqueio israelense, segundo a Federação Geral de Sindicatos Palestinos. 77% das casas foram destruídas ou danificadas por ataques israelenses, desalojando e forçando o deslocamento de milhares de famílias, em meio a um precário e insuficiente projeto de reconstrução, de acordo com Anne Jellema, diretora da fundação humanitária holandesa Run4.
Os índices de desemprego e pobreza são péssimos na Cisjordânia. Mas a situação de Gaza é ainda pior. Ali, em 2018, o desemprego atingia dois terços da população jovem e a pobreza, medida nos baixíssimos parâmetros do Banco Mundial, 56% dos habitantes. Enquanto isso, na Cisjordânia essa taxa era de 19%. Além disso, a pobreza na Faixa de Gaza é muito mais profunda, com um “hiato” – a diferença entre a renda média dos pobres e a linha de pobreza – quase seis vezes o nível na Cisjordânia. Esses dados foram compilados em um abrangente relatório da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). [https://unctad.org/system/files/official-document/tdb67_d5_en.pdf].
FIGURA 2: Participação da Faixa de Gaza na economia palestina
Além do longo bloqueio egípcio, Gaza enfrentou três operações militares israelenses (2007, 2012 e 2014), causando muitas mortes e danificando gravemente a infraestrutura da região. Ao menos 3.793 palestinos foram mortos, em torno de 18.000 foram feridos e mais da metade da população foi forçada a deslocar-se, de acordo com o relatório da UNCTAD. Mais de 1.500 empresas da indústria e do comércio foram danificadas, assim como 150.000 casas e equipamentos públicos, incluindo instalações de fornecimento de energia, água e esgoto, hospitais, escolas e prédios governamentais.
O bloqueio custou aos palestinos de Gaza mais de 16 bilhões de dólares e empurrou mais de um milhão de pessoas para baixo da linha da pobreza em pouco mais de 10 anos. A análise da UNCTAD sugere que, caso a tendência de desenvolvimento da economia da região observada antes de 2007 tivesse sido mantida (veja o cenário 1 no gráfico abaixo), a taxa de pobreza em Gaza teria chegado a 15% em 2017, ao invés dos 56% atingidos. Enquanto isso, o hiato de pobreza estaria em torno de 4,2%, ao invés de 20%.
FIGURA 3: Faixa de Gaza: PIB per capita real estimado sob dois cenários
Entre 2007 e 2018, Gaza cresceu menos de 5% e sua contribuição para a economia palestina caiu de 31% para 18%. Em decorrência, o PIB per capita diminuiu 27% (a linha base do gráfico acima).
A economia de Gaza retrocedeu tanto na indústria quanto na agricultura: elas compunham 34% da economia regional em 1995, contra 23% em 2018. A fatia de pessoas empregadas nesses setores caiu de 26% para 12%. Essa condição prejudica qualquer desenvolvimento econômico ou capacidade de diminuir os índices de desemprego.
FIGURA 4: Economia de Gaza antes e depois da imposição do bloqueio (indicadores selecionados)
Em 2020, esse pesadelo foi agravado pela pandemia.
A UNCTAD estima que seriam necessários 838 milhões de dólares para puxar o povo de Gaza acima da linha da pobreza. Esse valor é 4 vezes maior que o montante necessário em 2007. Apesar disso, em 2018 o governo Trump cortou o financiamento da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA), agência da ONU responsável pelo apoio a 5 milhões de refugiados palestinos em Gaza, Cisjordânia, Líbano, Síria e Jordânia.
O economista da UNCTAD Richard Kozul-Wright comentou: “O corte de 200 milhões de dólares foi um grande golpe na economia palestina. …A menos que os palestinos da Faixa tenham acesso ao mundo exterior, é difícil ver algo além do subdesenvolvimento no destino Gaza”, …É realmente chocante que no século 21, dois milhões de pessoas possam ser deixadas nesse tipo de condição”.
*Publicado em 16 de maio de 2021 (https://thenextrecession.wordpress.com/2021/05/16/the-unending-nightmare-of-gaza/)
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