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CULTURA

Superliga Europeia: o futebol na era do capital monopolista

Diego Xavier, de Recife, PE*

“Criado pelos pobres roubado pelos ricos”: Faixa da torcida do Club Africain da Tunísia em amistoso contra o PSG em 2017

A notícia no final do domingo (18/04) da formação de uma liga com os 15 clubes mais ricos da Europa sacudiu o mundo do futebol. Durante anos os times já super ricos chantageavam a UEFA com a possibilidade de fazerem uma Liga a parte que tiraria das confederações o poder e daria aos clubes toda a grana e o controle sobre o campeonato.

A desigualdade no mundo do futebol vem se intensificando ao longo dos anos e as principais ligas vivem momentos de hegemonia absoluta. A temporada 2019/2020 marcou o Nono título consecutivo da Juventus na Itália, o Oitavo título consecutivo do Bayern de Munique na Alemanha, o Sétimo título em oito anos do PSG na França e aumentou a sequência de títulos de Barça e Real na Espanha, que neste século só foi interrompida pelo Atlético de Madrid em 2014. 

A Inglaterra é a única das grandes ligas onde os títulos são distribuídos de forma menos hegemônica e muito por causa dos petrodólares que escolhem novos ricos e batem de frente com as grandes potências. Chelsea e Manchester City são os melhores exemplos de times que ficaram ricos do dia para noite e saem acumulando títulos.

O que é a Superliga

Essa iniciativa é a junção dos seis clubes mais ricos da Inglaterra (Manchester United, Manchester City, Liverpool, Arsenal e Tottenham) os três da Itália (Juventus, Inter de Milão e Milan) e os três da Espanha (Real Madrid, Barcelona, Atlético de Madrid). Essa união visa criar uma liga européia que substitua a Champions League e tenha clubes fixos, tirando completamente o mérito esportivo para entrar nas competições.

A proposta é fazer campeonatos com 20 clubes, seriam mais três permanentes e cinco convidados por temporada, em jogos de meio de semana.

O anúncio foi feito junto com um plano de investimento de quatro bilhões de reais de um banco dos EUA. Fica nítido que tem dinheiro muito forte por trás desse empreendimento.

Futebol Monopolista

O futebol já vive um momento de concentração das suas riquezas, desde a Lei Buscam em 1995, que tirou o limite de estrangeiros por clube, os clubes europeus tiram os melhores jogadores de toda parte do mundo. Fortalecendo seus campeonatos locais em detrimento do esporte no mundo todo.

Esse movimento do futebol está inserido no capitalismo global, que internacionaliza suas marcas e concentra poder aumentando as desigualdades. Repete-se a lógica de mercado. Após a crise de 2008 a desigualdade global aumentou e com os clubes aconteceu o mesmo, times tradicionais entraram em decadência ou alguns até acabaram enquanto clubes com dinheiro de ditaduras do Golfo Pérsico ou de bancos de investimentos dos EUA lucram cada vez mais e empilham taças.

“Existem equipes tão pobres que só tem títulos”: Faixa da torcida do Rayo Vallecano em jogo contra o Real Madrid

Essa reprodução da lógica capitalista se espalha por todos os continentes, pois é possível observar como times de Brasil e Argentina já se tornaram muito mais ricos que seus vizinhos e os títulos da Copa Libertadores estão sendo decidida quase exclusivamente por eles.

Assim como os grandes mercados globais os times já não são mais dos seus torcedores locais. O Manchester United para os Glazzers, família dona do clube, não é mais um time fundado pela classe operária de Manchester e sim um produto a ser vendido seja para um vizinho de Old Trafford ou para pessoas na Ásia ou América Latina. Esses grandes capitalistas, que também são donos de outras franquias em esportes pelo mundo, preocupam-se apenas com o lucro que aquele clube dará no final do mês deixando de importar todo o resto. A Inglaterra é a única das grandes ligas onde os títulos são distribuídos de forma menos hegemônica e tem seus aspectos específicos que expressam de uma outra maneira a presença do capital no futebol.

FIFA E UEFA

Vale destacar que as entidades que controlam o futebol não são pobres coitadas nessa história, muito pelo contrário, a UEFA sempre cedeu às reivindicações dos times ricos e ano após ano vem ajudando a ampliar o fosso entre as grandes ligas para as ligas menores.

A FIFA por sua vez segue o modelo criado por João Havelange de usar o futebol para ampliar mercados e conseguir sempre mais recursos para entidade. Vale lembrar que a Copa de 2022 será realizada no Catar, um país sem nenhuma tradição no futebol e com uma preparação pro torneio cercada de escândalos por questões humanitárias que segundo entidades já matou dezenas de trabalhadores.

Maradona usando camisa escrito “Dois Ladrões” e o rosto dos ex-presidentes da UEFA e da FIFA Platini e Blater

Reação de torcedores

A reação ao anúncio da Superliga foi imediata. Torcedores, jogadores, ex-jogadores e até o primeiro ministro britânico Boris Johnson foram contra a liga e já manifestaram que podem acontecer algumas retaliações se os clubes seguirem com a ideia.

Muitos clubes têm na sua história a marca de um futebol popular, o Atlético de Madrid ostenta uma faixa que diz “Orgulhosos de não sermos como os outros” em clara crítica ao Real Madrid que sempre esteve ligado aos poderosos na Espanha. A reação por parte dos colchoneros foi muito direta contra a participação do time na Liga.

Na Inglaterra Liverpool e Manchester são duas cidades operárias que sempre teve no futebol uma importante forma de identidade e por isso a reação dos torcedores dói muito forte contra essa forma de “matar o futebol” expressão que se popularizou em faixas e dizeres ma internet.

Enquanto escrevia esse texto já mudanças aconteciam e já há rumores de que a Superliga não vai andar, mas é importante destacar que a luta por um futebol popular em toda parte do mundo é fundamental para que torcedores de todo planeta não fiquem reféns de um clubinho de ricos que brincam como querem com o esporte mais popular do mundo.

Protesto da torcida do Liverpool na frente do estádio do Leeds onde o time jogou nessa segunda feira 19/04

*Diego Xavier é professor e militante da Resistência/PSOL

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