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BRASIL

Dez anos do acesso à água e ao esgotamento sanitário como um direito humano essencial

Igor Dias*, de Goiânia, GO
Fernando Frazão/Agência Brasil

Hoje, 28/07, faz 10 anos da aprovação da Resolução n° 64/292 da ONU que reconhece o acesso à água potável e o saneamento como um direto humano essencial. Esse é um marco importante, mas o debate sobre como garantir isso no Brasil ainda está muito atrasado sendo o atual cenário de ataque ao saneamento público e mesmo depois de uma década, a população mais carente ainda espera a validade desse direito na prática.

Quando a Resolução n° 64/262 foi aprovada em 2010, a legislação brasileira vigente no que tange o saneamento era a lei 11.445/2007. Naquela altura era fruto de um debate entre representantes do setor público e privado ainda hoje não experimentada em sua plenitude, já que os investimentos do setor de saneamento geralmente carecem de décadas para ter retorno. Os contratos entre empresas de saneamento e municípios geralmente têm validade de 30 anos, por exemplo. A validade integral da lei 11.445/2007 durou menos que esses contratos e o novo Marco Legal do Saneamento, que faz grandes alterações nessa lei obrigando uma maior participação da iniciativa privada no saneamento, foi aprovado 13 anos depois da legislação até então vigente. 

A pandemia de COVID-19 realçou a desigualdade no acesso ao saneamento básico quando colocou a higiene como uma das principais formas de prevenção ao contágio pelo vírus. A partir daí evidenciamos que qualquer pessoa que não tenha acesso ao saneamento básico de qualidade pode fragilizar toda a sociedade, já que, no caso da proliferação do vírus, todas as formas de barrá-lo pode significar, segundo vários especialistas, a diminuição no número de mortes. 

Dentro desse cenário observamos que o acesso ao saneamento básico não se resume a ter água encanada nas residências, é preciso observar as populações em situação de rua, que têm esse direito negado, as pessoas que em seus locais de trabalho não têm acesso aos serviços para urinar, defecar e realizar sua higiene pessoal e ainda aqueles que não tem condições financeiras de pagar a execução da ligação domiciliar para conexão as redes ou a tarifa regular dos serviços.

A lei 11.445/2007 já previa mecanismos para minimizar alguns desses problemas como a tarifa social, que cabe destacar, faltava ser mais clara e mais inclusiva quanto aos critérios de elegibilidade que, ao deixar por conta das empresas de saneamento, impõe requerimentos além do quesito baixa renda. O marco anterior, assim como o novo, tem dificuldades de apontar saídas além daquelas que englobam o acesso via sistema de distribuição de água. A aprovação do novo Marco Legal do Saneamento recente não impacta de maneira contundente a tarifa social, mas prevê que a lógica do lucro em detrimento da vida seja imperativa no saneamento. Ela ainda ameaça o subsidio cruzado, mecanismo de financiamento de investimentos que drena o lucro das grandes cidades para os pequenos municípios que geralmente são os que mais carecem de universalização. A aprovação do PL 4162/19 pelo Congresso Nacional é um ataque muito forte aos direitos humanos a  água e ao saneamento pois obriga a entrada da iniciativa privada no setor distanciando ainda mais os investimentos necessários no saneamento brasileiro, que são aqueles onde as populações são mais carentes e em pequenos povoados onde o retorno financeiro dos investimentos é demorado e não pode ser garantido pela tarifa.

Celebrar o aniversário de 10 anos da declaração do direito humano à água potável e ao saneamento é lutar para derrubar o veto de Bolsonaro ao artigo 16 do PL 4162/2019 que o tornou ainda mais nocivo ao saneamento público brasileiro quando foi suprimido do texto a parte que dava prazo de renovação dos contratos de prestação de serviço das estatais até março de 2022. É lutar também para que governadores e prefeitos rompam com a logica do lucro e promovam investimentos nas empresas estatais rumo a universalização do saneamento nas comunidades mais pobres e carentes. A luta pelo direito humano à água passa por derrotar a política genocida de Bolsonaro para o setor e colocar a vida acima dos lucros!

 

*Igor Dias é diretor do STIUEG (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas de Goiás).