Pular para o conteúdo
BRASIL

Brasil tem mais de 11 mil mortes em 14 dias e segue com ritmo descontrolado

Gilberto Calil

O quadro reúne os dados dos 15 países com maior número de mortes registradas. Tomamos como referência principal o ritmo de crescimento do número de mortos, tendo em vista que o patamar de subnotificação dos casos no Brasil inviabiliza qualquer comparação da evolução do número total de casos. Entendemos que o cálculo do ritmo de crescimento é mais revelador do a simples comparação dos números absolutos ou dos índices de mortes por milhão de habitantes, tendo em vista que a expansão do Covid-19 se iniciou em momentos diferentes e a pandemia encontra-se em estágios totalmente distintos.

O ritmo de crescimento mundial do número de mortes vem diminuindo de forma consistente. Há 30 dias era 86%, há 20 dias era 46%, há 10 dias era 30% e agora está em 22%, uma redução progressiva que é efeito das medidas de contenção e políticas de isolamento social adotadas de forma rigorosa em muitos países. 

O Brasil é o segundo país (o primeiro foi os Estados Unidos) a manter um ritmo de crescimento das mortes e dos novos casos superior a 100% depois de atingir 20.000 mortes, o que claramente indica que estamos muito longe do pico. Além de ter o segundo maior ritmo de expansão das mortes entre os quinze países, temos também o maior ritmo de expansão do número de casos, que teve um crescimento extraordinário de 123% em 14 dias – o que indica que nas próximas semanas o número de óbitos seguirá crescendo. Registramos na última semana 6.498 mortes e 122.538 novos casos, um número altíssimo, ainda mais se considerarmos a baixa testagem. Há 40 dias, 0,5% dos mortos eram do Brasil, e hoje este índice já chega a 6,5% (mais do que o dobro do percentual da população brasileira em relação à população mundial) e atingiu 25% no dia de ontem.

O Brasil chega a um ritmo de crescimento que é quase cinco vezes superior à média mundial em 14 dias, tendo crescido 104%, abaixo apenas do México (114%). A Índia figura pela primeira vez entre os 15 países com mais mortes, passando a um ritmo de crescimento expressivo (em especial da região de Bombaim e Delhi) depois de ter conseguido conter os casos por algum tempo. A Suécia passa a 16º, pois embora seja um dos países europeus que permanece com maior ritmo de expansão, é o país menos populoso dentre os 16 primeiros.

Os países que vêm na sequência têm ritmo de crescimento inferior: o Canadá tem 32%, os Estados Unidos (23%) e todos os demais com até 16% (sendo que dez deles com até 11%). Os Estados Unidos seguem diminuindo diariamente o ritmo de expansão e ontem tiveram o número mais baixo de mortes desde 27 de março (617), deixando de ser o país com mais mortes no dia pela primeira vez desde então (ultrapassado pelo Brasil). Exceto Brasil, México e Índia, todos os demais países vêm tendo um crescimento de novos casos suficientemente baixo para produzir uma diminuição do número de casos ativos. A China registra apenas uma morte nos últimos 27 dias e teve apenas 27 novos casos nos últimos 7 dias.

Brasil, México e Índia são, também, disparadamente os dois países com menor número de testes. O número de testes por milhão de habitantes que Brasil (3.461), México (1.674) e Índia (2.135) é absolutamente inexpressivo e várias vezes inferior aos demais países com números análogos de mortes e casos (ainda que no caso da Índia o número absoluto de testes já seja expressivo, a relação por milhão de habitantes é baixa). Na relação entre testes realizados e resultados positivos, o Brasil tem os piores números, com apenas 2 testes realizados por resultado positivo.  

O elevado ritmo de crescimento das mortes no Brasil contraria a tendência internacional de melhora da situação e indica um rápido e intenso agravamento do quadro nacional. Já tendo passado de 22.000 mortes oficializadas, o país deveria ter já um ritmo de crescimento diário de novos casos abaixo de 1% para ao menos ter a expectativa de começar a reduzir o ritmo de crescimento das mortes em duas a três semanas. No entanto, o crescimento de casos vem aumentando entre 6% e 7% ao dia. Tornam-se cada dia mais urgentes políticas efetivas de isolamento social e inclusive de lockdown em várias regiões. Medidas deste tipo foram adotadas por todos demais os países muito antes de chegarem no trágico patamar em que estamos no momento. Nosso isolamento social continua sendo relaxado e sabotado pelas autoridades federais, com cumplicidade explícita do grande empresariado, produzindo a conjunção trágica entre altas taxas de crescimento das mortes e dos novos casos, em um cenário de subnotificação generalizada. No país, os números de mortes estão aumentando a cada 13 dias e o número de casos a cada 11,5 dias, enquanto no mundo o tempo de duplicação das mortes é de 34 dias e o dos casos é de 33 dias. Fomos ontem o país com mais mortes diárias, o segundo país com mais novos casos diários (muito próximo aos EUA, que realizam dezenas de vezes mais testes), o segundo país com o maior ritmo de crescimento de mortes (depois do México, mas em um patamar mais expressivo) e o país com maior ritmo de novos casos diários.

Os Estados Unidos seguem com um elevado ritmo de aumento das mortes, ainda que com tendência de redução, estando em 23% em 14 dias, mantendo expressivo número de mortes diárias e inúmeros focos regionais. Itália, Espanha, França, Bélgica e Alemanha conseguiram reduzir a expansão dos novos casos a menos de 0,2% ao dia (índice 30 vezes menor que o Brasil). Ontem o número de mortes no Brasil (703) superou a soma dos 48 países europeus.

Outros países, situados na América Latina, África, Ásia e Oriente Médio, embora com número ainda menos expressivo de casos ou de mortes, vêm tendo crescimento bastante superior à média mundial, com perspectiva de rápido agravamento da situação. Dentre estes, tiveram crescimento do número de casos superior a 100% nos últimos 14 dias: Tajdiquistão (4.79x), Haiti (4.75), Guatemala (3.16), Sudão (2.66x), Kuwait (2.45x), Bolívia (2.43x), Afeganistão (2.4x), Chile (2.39x), Omã (2.29x), Bangladesh (2.29x), África do Sul (2,25x), El Sanvador (2.15x), Honduras (2.05), Armênia (2.01x). Outros, com crescimento abaixo de 100% no período, estão já entre os 20 com maior número de mortos: Peru (1.78x), Rússia (1.64x) e Equador (1.25x).

De outro lado, há um crescente número de países com a situação estabilizada e que praticamente não tem tido novos casos, como Coréia do Sul, Taiwan, Vietnã, Nova Zelândia, Eslovênia, Suiça, Áustria, Finlândia, Noruega, Bósnia, Cuba, Uruguai e Paraguai, todos eles com expressiva redução do número de casos ativos. 

É imprescindível e urgente reduzir o ritmo de crescimento do número de casos e do número de mortes no Brasil, pois a manutenção destes índices projeta um cenário cada vez mais terrível. Se por hipótese considerarmos que este ritmo se mantenha o mesmo (2.04 vezes a cada 14 dias), o número de mortes no Brasil atingiria 46.340 em 7/6, 95.535 em 19/6 e 192,851 em 5/7. Não se trata de uma previsão, mas de projeção do que pode ocorrer caso não sejamos capazes de diminuir o atual ritmo de forma muito mais vigorosa. Para isto, são inadiáveis medidas para ampliação do nível de isolamento individual, associadas à garantia de efetivas condições de sobrevivência ao conjunto dos trabalhadores, em especial aos mais precarizados. Um pequeno aumento ou uma pequena diminuição no percentual produz um grande efeito em cascata nos números em dois ou três ciclos, o que reforça a urgência do reforço das medidas protetivas.