No dia 07 de outubro de 2018, ao todo, 49.276.990 brasileiros votaram em Jair Bolsonaro no primeiro turno das eleições presidenciais. Se alguém precisava de uma prova de que estamos em um período histórico de retrocessos, não precisa mais. Um ano depois, a situação continua desfavorável, mas melhorou um pouco. Precisamos saber o significado deste momento histórico sem pessimismo nem otimismo em excesso.
O tamanho do desastre
Naquele dia, aproximadamente um terço dos 147.305.155 eleitores votaram em um candidato abertamente machista, racista e homofóbico. E que além disso era defensor dos latifundiários e banqueiros, apresentando em seu programa a retirada de direitos dos trabalhadores. Se somarmos os votos em Geraldo Alckmin (PSDB), João Amoedo (Novo), Henrique Meireles (PMDB) e Álvaro Dias (Podemos), 40% de todos os eleitores votaram em candidatos da direita.
Os disparos em massa de mensagens feitos pela equipe de Bolsonaro influenciaram neste resultado. O fato de Lula, que era líder nas pesquisas, estar preso e impedido de se candidatar teve um peso importante. A comoção gerada pela facada sofrida por Bolsonaro um mês antes da votação também influenciou. Mas não podemos negar que uma boa parcela dos trabalhadores tomou a decisão de votar contra sua própria classe naquele fatídico dia.
Alguns podem dizer que se tratou de apenas confusão ou protesto. Se fosse assim, o índice de votos brancos, nulos e de pessoas que não foram votar seria alto. Afinal, com as pessoas indignadas e confusas, a decisão de não votar em ninguém tende a aumentar. Mas em 2018 a soma de brancos, nulos e abstenções foi de 27% dos eleitores na votação para presidente. O mesmo de 2014. No segundo turno, este número mudou muito pouco. O povo escolheu decisivamente dar uma vitória à direita. Isto é um fato e não pode ser negado.
Se olharmos para as eleições para deputado federal, este fato fica mais claro. 8% de todas as pessoas aptas a votar escolheram candidatos do PSL, partido de Bolsonaro, que foi o mais votado. Contando com os votos do Novo, partido criado por banqueiros para defender seus interesses, chega a 9,7% os eleitores que confirmaram sua posição reacionária também no voto para deputado federal. Além disso, 51% dos aptos a votar escolheram deputados federais do “Centrão”, o grande arco de partidos sem ideologia definida mas comprometidos com a classe dominante.
Achar que tudo está perdido é um erro
Não dá para negar que após a derrota das grandes mobilizações de 2013 a consciência da classe trabalhadora retrocedeu. A falta de organização coletiva dos atos foi a semente do desastre. A parte mais elitista e preconceituosa de nossa sociedade usou esta oportunidade para propagar sua ideologia entre os que estavam frustrados. E conseguiu ganhar audiência. O resultado foram as mobilizações reacionárias de 2015 e 2016 e o golpe que colocou Michel Temer na presidência. O caminho para o desastre de 2018 já estava asfaltado. Mas este retrocesso não destruiu a esquerda como alguns pensavam.
Voltando às eleições de 2018, 31,5% dos aptos a votar escolheram algum dos seis candidatos que se identificaram de alguma forma contra o projeto de Bolsonaro. Um número inclusive parecido com os que votaram em Haddad no segundo turno. Isto em uma eleição que não apresentou bons candidatos neste campo. Ciro Gomes, Haddad e Marina Silva não eram figuras que entusiasmaram a militância. Nas eleições para deputado federal, 14,7% dos aptos a votar escolheram candidatos de partidos do campo antibolsonarista (PT, PCdoB, PCB, PSOL, PSTU, PCO, Rede, PDT, PSB). Mais do que os votos nos apoiadores incondicionais do capitão do exército.
O termo “correlação de forças” é usado quando queremos medir nossa força em comparação com a de nossos adversários. E qual foi a correlação de forças que saiu das eleições de 2018? A direita teve uma grande vitória, elegendo um candidato com um programa extremista. Mas cerca de 30% da população se mostrou contrária ao projeto capitaneado por Bolsonaro. Fomos minoria, mas não fomos esmagados.
O que mudou desde então?
Depois de um no, a população continua dividida. Na última pesquisa Ibope, feita no fim de setembro, 34% dos entrevistados reprovava o governo, 31% aprovava e o resto respondeu “regular” ou não se definiu. Seguimos com aproximadamente um terço da população apoiando o projeto político de Bolsonaro, outro terço contrário e o último terço ainda não sabe para onde vai.
Seguimos com a população dividida em três grupos. Este quadro não mudou nos últimos cinco anos se avaliarmos as pesquisas de opinião. Mas isto não quer dizer que estamos na mesma situação que em 2018.
A militância em favor do governo perdeu o entusiasmo. Os atos chamados por Bolsonaro não tiveram força suficiente para dar poderes ditatoriais ao Presidente. Parece que a era dos grandes atos de direita acabou. E a oposição se tornou maioria nas ruas a partir das manifestações estudantis de maio.
A direita está dividida e agora tem que responder pelo desgaste do governo. A crise de desemprego e renda dos trabalhadores não dá sinais de acabar, e a cada dia o governo é mais cobrado em relação a isto. Parte dos que votaram em Bolsonaro começam a desconfiar que tomaram uma decisão errada.
Não há nada que indique que o governo vai desmoronar rapidamente. Isto pode acontecer, mas não será fácil. Eles ainda têm parte da população dando apoio, têm apoio das polícias e das Forças Armadas e a classe dominante dá aval para a política do ministro da economia, Paulo Guedes. Por outro lado, tudo indica que o desgaste do Presidente vai aumentar gradativamente.
Que fazer?
Já no segundo turno de 2018, centenas de ativistas foram às ruas pedir votos contra Bolsonaro mesmo com o resultado praticamente definido. Isto foi uma primeira demonstração de resistência. Este ano pudemos ver uma série de greves e mobilizações contra as medidas do governo.
O povo está começando a acordar. Gritar “Fora Bolsonaro” agora não vai adiantar muita coisa. A oposição não é maioria e mesmo entre aqueles que se opõem não há confiança suficiente para ir às ruas e derrubar o Presidente. Também não podemos ficar parados esperando as eleições de 2020 e 2022.
Temos que dar todo apoio às mobilizações que ocorrem contra o governo. Aumentar ao máximo possível o desgaste de Bolsonaro. Conversar com a população, criar laços de confiança com ela.
O desastre de 2018 pode ser superado. Não será a curto prazo. Vivemos um ciclo histórico difícil. Mas a realidade nos permite ter esperanças. O pesadelo vai acabar.
Comentários