Por: Karine Afonseca, de Brasília, DF
Na última semana, o governo Temer aprovou no Congresso Nacional a PEC 241, que prevê o congelamento de investimentos em serviços públicos como saúde, educação, moradia, segurança e saneamento básico. O governo afirma que é preciso reduzir os gastos públicos, pois o PT com uma política assistencialista causou um rombo e a quebra da economia no país.
A ideia de que o governo do PT gastou muito e agora é preciso apertar o cinto, retirar ou reduzir os luxos concedidos pelo governo do PT e nos sacrificar, ganha a consciência das pessoas diariamente. Partimos da ideia que os investimentos em saúde, educação e segurança pública são mais que suficientes são exorbitantes e em momentos de crise não podemos nos dar ao luxo de gastar mais, ou a mesma quantia que gastamos com serviços públicos básicos.
Afinal, o que investimos em saúde no Brasil é suficiente? Qual o real problema do SUS e por que vivemos o caos da saúde brasileira?
Para responder a essa pergunta, primeiro temos que partir da ideia de que saúde é uma necessidade básica de qualquer ser humano. Para que a humanidade continue produzindo riquezas, gerando tecnologia e desenvolvimento são necessários homens, mulheres e crianças com saúde e vitalidade para continuar contribuindo para a sociedade na produção de conhecimentos, alimentos e desenvolvimento em geral.
Somente no Brasil, perdemos mais de 5% do PIB anualmente pelo impacto das doenças crônicas degenerativas, como diabetes, doenças do coração, hipertensão e câncer. O mau controle dessas doenças aumenta absenteísmo, baixa a produtividade e causa aposentadoria precoce. Essa perda econômica é maior do que no Japão, onde a população idosa cresce de forma exponencial, ou na África do Sul, onde o acesso às condições de saúde são inferiores às do Brasil.
Poderíamos reduzir essa perda econômica com um sistema de saúde que promova esporte, alimentação saudável, garanta o acesso a medicamentos e tratamentos corretos para toda a população, independente do seu poder econômico ou região brasileira. Mas, para que essa promoção de saúde seja possível, é necessário dinheiro, investir na contração de diferentes profissionais de saúde que forneçam à população o apoio necessário para seguir um tratamento de controle de suas doenças, medicamentos em quantidade suficientes, insumos para que os profissionais possam realizar procedimentos para o controle e manejo das diferentes enfermidades que atingem a população brasileira.
Muitos governantes, gestores e políticos alegam que esse investimento em saúde já existe. Afirmam que somos o país onde mais se investe em saúde pública, mas a corrupção e a má gestão desses recursos têm levado ao atendimento falido e caótico do SUS. Concordo que existem problemas na gestão e desvio de verbas públicas da saúde, principalmente no massivo investimento público em serviços de saúde privados, que são mais caros e com serviços inferiores aos fornecidos pelo SUS. Mas, o investimento em saúde pública é insuficiente para atender com dignidade e efetividade toda a população brasileira.
Segundo a Organização Mundial de Saúde, o Brasil investe menos da média mundial em saúde pública. Enquanto a média é de R$ 1800 por habitante, o Brasil investe R$ 1468 por habitante. E enquanto países com sistema universalizado, como é o caso do Brasil, investem de 7,6% a 9% do PIB na saúde pública, o Brasil investe apenas 4,7% do PIB. Está claro que para se ter uma saúde universal de qualidade é necessário dobrar os investimentos públicos em saúde pública, caso contrário vamos continuar patinando em índices de saúde desastrosos e levando mais e mais a nossa população a situações de doenças e inatividade que podem ser evitadas e controladas.
Com a PEC 241, a perspectiva de aumentar os gastos com saúde pública são anulados. Essa ação do governo desconsidera que a população brasileira está envelhecendo, que a expectativa de vida está aumentando e, consequentemente, a incidência de doenças será crescente.
O Ministro da Saúde já anunciou planos para a saúde pública, acabar com o sistema universal e sugeriu que é necessário que cada brasileiro tenha um plano de saúde para atender às questões mais básicas, ficando a cargo do SUS o atendimento de situações mais graves, como tratamento de câncer, urgências e emergências, transplantes e demais serviços de saúde de média e alta complexidade.
Pensar na capacidade que a população possui em pagar planos privados é largar a saúde da população à própria sorte. A renda média do brasileiro é de um pouco mais de R$ 1100 por mês. Esse dinheiro tem sido insuficiente para suprir as necessidades mais básicas de alimentação, transporte, moradia e educação. Caso a universalização da saúde seja descartada, possivelmente milhares de negros, mulheres, idosos e trabalhadores que não têm condições de pagar por planos de saúde vão ficar desassistidos e doenças que têm tratamento e controle com ações simples vão gerar grandes complicações aumentando os gastos com saúde, as sequelas, as aposentadorias por invalidez, a inatividade por desgaste da saúde e a mortalidade.
Não é possível reduzir mais ainda os gastos com saúde pública, ou pensar em congelamento por 20 anos. Caso isso aconteça, o fim do SUS está dado e as consequências para a população podem ser desastrosas. A universalização da saúde é uma conquista de milhares de trabalhadores brasileiros. Com ela conseguimos conquistar uma expressiva melhora dos índices de saúde da população brasileira. É necessário melhorar a saúde pública e não sucatear mais do que já está. É necessário que todos os profissionais da saúde e suas entidades representativas, conselhos de saúde, mulheres, negros e trabalhadores fortaleçam a luta contra a PEC 241. A luta em defesa do SUS hoje é a luta contra a PEC 241.
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