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Colunas

E agora, MDS? Vai desrespeitar o CNAS e financiar Comunidades Terapêuticas?

Saúde Pública resiste

Uma coluna coletiva, produzida por profissionais da saúde, pesquisadores e estudantes de várias partes do País, voltada ao acompanhamento e debate sobre os ataques contra o SUS e a saúde pública, bem como às lutas de resistência pelo direito à saúde. Inaugurada em 07 de abril de 2022, Dia Mundial de Luta pela Saúde:

Ana Beatriz Valença – Enfermeira pela UFPE, doutoranda em Saúde Pública pela USP e militante do Afronte!;

Jorge Henrique – Enfermeiro pela UFPI atuante no DF, especialista em saúde coletiva e mestre em Políticas Públicas pela Fiocruz, integrante da Coletiva SUS DF e presidente do Sindicato dos Enfermeiros do Distrito Federal;

Karine Afonseca – Enfermeira no DF e mestre em Saúde Coletiva pela UnB, integrante da Coletiva SUS DF e da Associação Brasileira de Enfermagem, seção DF;

Lígia Maria – Enfermeira pela ESCS DF e mestre em Saúde Coletiva pela UnB. Também compõe a equipe do Programa de Interrupção Gestacional Prevista em Lei do DF;

Marcos Filipe – Estudante de Medicina, membro da coordenação da Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina (DENEM), militante do Afronte! e integrante da Coletiva SUS DF;

Rachel Euflauzino – Estudante de Terapia Ocupacional pela UFRJ e militante do Afronte!;

Paulo Ribeiro – Técnico em Saúde Pública – EPSJV/Fiocruz, mestre em Políticas Públicas e Formação Humana – PPFH/UERJ e doutorando em Serviço Social na UFRJ;

Pedro Costa – Psicólogo e professor de Psicologia na Universidade de Brasília;

Por Pedro Henrique Antunes da Costa

Nesta quarta, 24/04, o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) publicou a Resolução CNAS/MDS nº 151, de 23 de abril de 2024. Nela, o CNAS dispõe sobre “o não reconhecimento das comunidades terapêuticas e entidades de cuidado, prevenção, apoio, mútua ajuda, atendimento psicossocial e ressocialização de dependentes do álcool e outras drogas e seus familiares como entidades e organizações de assistência social e sua não vinculação ao Sistema Único de Assistência Social (SUAS)”. Repetimos: o CNAS não reconhece as Comunidades Terapêuticas (CTs) como entidades da assistência social e do SUAS.

Como temos denunciado, uma das artimanhas do financiamento público às CTs pelo governo federal é fazê-lo pelo Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), e não pela saúde, supondo-as instituições da assistência social. Esse tem sido o principal mecanismo de avanço da Contrarreforma Psiquiátrica brasileira no presente, ou seja, o principal meio de ataque à saúde mental brasileira, à Reforma Psiquiátrica e ao SUS, só que “por fora” da saúde e do SUS.

Contudo, a partir de agora, caso queira continuar a financiar estes novos-velhos manicômios (que também têm sido prisões, senzalas e perpetradores de violência religiosa), o MDS terá que desrespeitar a decisão do CNAS. Cabe ressaltar que o CNAS é o órgão máximo de participação e controle social da Política Nacional de Assistência Social (PNAS) e do SUAS.

Logo no Art. 2º, o CNAS reitera que o “reconhecimento das entidades e organizações de assistência social como integrantes da Rede Socioassistencial do SUAS ocorre em dois níveis obrigatórios”, a saber: I – inscrição nos conselhos de assistência social dos Municípios e Distrito Federal; e II – cadastro concluído no Cadastro Nacional de Entidades de Assistência Social (CNEAS). Além disso, a “certificação de entidade como beneficente de assistência social, nos termos da Lei Complementar nº 187, de 2021, do Decreto nº 11.791, de 2023, e da Portaria MDS nº 952, de 2023, não constitui nível obrigatório para o seu reconhecimento como integrante da Rede Socioassistencial do SUAS, nos termos do caput”.

No Art. 4º, o CNAS também explicita que “[a]s comunidades terapêuticas e/ou entidades de cuidado, prevenção, apoio, de mútua ajuda, atendimento psicossocial e ressocialização de dependentes do álcool e de outras drogas e seus familiares, por não atenderem ao disposto nos arts. 1º, 2º e 3º, não integram o SUAS e não devem ser inscritas nos conselhos de assistência social dos Municípios e Distrito Federal nem ter CNEAS.

Ou seja, as recentes medidas do MDS favoráveis ao financiamento público das CTs – e a possibilidade de certificação das CTs pelo MDS com intuito de imunidade tributária – não asseguram às CTs o caráter de organizações da assistência social e integrantes do SUAS. De maneira direta e objetiva: as CTs não compõem o SUAS; não são serviços da Política de Assistência Social. Temos uma mensagem sem tergiversação do CNAS: se as CTs não são instituições do SUAS, não cabe ao MDS financiá-las, já que ele é um ministério cuja competência e rol de atribuições se referem à Política de Assistência Social e ao SUAS.

Para que a mensagem fique ainda mais compreensível, no Art. 7º, §2º, temos que: “Por não cumprirem os requisitos para atuação no SUAS, as comunidades terapêuticas e/ou entidades de cuidado, prevenção, apoio, mútua ajuda, atendimento psicossocial e ressocialização de dependentes do álcool e de outras drogas e seus familiares não podem ser financiadas com recursos destinados à política de assistência social, por meio dos fundos de assistência social”.

Por fim, se as CTs não podem ser financiadas pelo MDS com recursos dos fundos de assistência social, conclui o CNAS no Art. 8º: “Inscrições como entidades ou organizações de assistência social e CNEAS de comunidades terapêuticas e/ou entidades de cuidado, prevenção, apoio, mútua ajuda, atendimento psicossocial e ressocialização de dependentes do álcool e de outras drogas e seus familiares deverão ser canceladas pela instância local responsável, no prazo de 90 (noventa) dias a contar”.

Frente ao exposto, indagamos: e agora, MDS? E agora governo? Continuarão a financiar as CTs e desrespeitar o CONAS?