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BRASIL

Através de manobras, UNIRIO indica reitor não aprovado pela comunidade universitária

Alexandre Aguena*

“Ricardo golpista, capacho de fascista” era a palavra de ordem que ecoava no auditório da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) durante a cessão do colégio eleitoral de 11 de abril. Estudantes, técnicos e professores denunciavam um episódio de ataque à democracia universitária: a escolha de um reitor não eleito pela comunidade acadêmica para ocupar o primeiro lugar na lista tríplice a ser enviada para a nomeação pelo Presidente da República. Ricardo Silva Cardoso, o candidato escolhido pelo Colégio Eleitoral, não havia, sequer, participado da consulta paritária à comunidade universitária. Além dele, um outro candidato que não estava nas cédulas das urnas se apresentou ao colégio eleitoral: Helton Setta, que é professor de medicina e militar.  O candidato mais votado pela universidade Leonardo Villela de Castro (72% dos votos válidos) foi o segundo nome da lista e a candidata Cláudia Aiub(28% dos votos válidos), o terceiro. Segundo nota do DCE da Unirio, 10 dias antes do colégio eleitoral o reitor Luiz Pedro San Gil Jutuca nomeou conselheiros sem eleições, mas por indicação.

Esse episódio rompe com uma tradição democrática consolidada na universidade pelo menos desde 1980, segundo a ex-reitora Malvina Tuttman. A existência de uma consulta pública à comunidade é prevista no próprio estatuto da UNIRIO e é uma importante garantia da democracia e autonomia universitária.

UNIRIO: mais um exemplo dos retrocessos democráticos anunciados pelo Bolsonarismo

Em dezembro de 2018, o MEC encaminhou a nota técnica Nº400/2018. A nota aprovada contém uma nova orientação para a formação das listas tríplices para a nomeação de reitores de universidades federais. A mudança mais notável é a orientação de se rejeitar processos de consulta que não tenham o peso de 70% do corpo docente. Caso a consulta não siga essa regra, orienta-se que ela seja dispensada e, inclusive, que se retire dos estatutos das universidades. Durante os primeiros meses de governo, o ex-ministro Ricardo Vélez Rodrigues afirmou em entrevista ao jornal Valor que “as universidades devem ficar reservadas para uma elite intelectual”. Recentemente, Bolsonaro declarou, em entrevista à rádio Jovem Pan, que poucas universidades têm pesquisa e que grande parte estaria nas universidades privadas. Bolsonaro e seu gabinete demonstram, além de pouco conhecimento sobre o desenvolvimento de pesquisas no país, um desprezo pela democracia universitária e pela própria universidade pública.

Para legitimar a escolha antidemocrática da lista, o reitor Luiz Jutuca citou a nota técnica do MEC uma vez que a consulta pública era paritária, enquanto o colégio eleitoral era composto de 70% professores, 15% estudantes e 15% de técnicos estando de acordo com a normas da nota.

Na situação política em que vivemos, o caso da UNIRIO não é isolado, mas a consequência de iniciativas do governo Bolsonaro para ampliar a intervenção sobre as universidades e que, infelizmente, vêm encontrando apoio de reitorias. Outro exemplo recente no Rio de Janeiro foi a nomeação de um capitão de mar-e-terra para a assessoria da reitoria da Universidade Federal Fluminense (UFF). Nesse última caso, a medida foi revogada após forte reação da comunidade universitária.

Todas as vozes em defesa da autonomia e democracia universitária

No mesmo dia da escolha da lista tríplice no colégio eleitoral, os estudantes da UNIRIO realizaram um ato na Avenida Pasteur (Urca) com destino à reitoria. Entidades e sindicatos dos profissionais das instituições de ensino superior emitiram notas e matérias em defesa da democracia na UNIRIO. As entidades estudantis e sindicatos de professores e técnicos devem unir forças para defender a democracia na universidade das intervenções do governo Bolsonaro. Também é papel das reitorias defender o princípio constitucional da autonomia universitária, posicionamento da própria Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES).

 

*Alexandre Aguena é do Afronte Niterói