Como todo ano os aumentos da tarifa de ônibus já pipocaram por todo o país, assim como as encenações, onde prefeitos “peitam” empresários ou dão um jeito (mais dinheiro público) para subir “menos” a tarifa do que o que as empresas “precisariam”.
No entanto, para além do já previsível reajuste quase que anual das tarifas de transporte coletivo, quero chamar a atenção para um aspecto específico e esquecido por empresários, prefeitos e mesmo pelos movimentos sociais: o bilionário subsídio dado pelo governo federal em meio às manifestações de Junho de 2013 e que perdura até hoje.
Como todos lembram, as Jornadas de Junho começaram por conta do aumento de 20 centavos no transporte coletivo paulistano. Os atos, espalhados pelo restante do país, também começaram por conta deste tema, antes de infelizmente desembocar naquela coisa sinistra anti-partido e anti-esquerda. Como resposta, à época, Dilma decretou uma grande isenção para o empresariado do transporte coletivo municipal para que estes segurassem os preços cobrados nas catracas dos ônibus e metrôs pelo país, a Lei 12.860/13. Esta isenção foi, mais especificamente, a redução a zero das alíquotas do PIS/COFINS sobre o transporte público coletivo municipal de passageiros, e sua duração é de tempo indeterminado.
De lá pra cá estes empresários já deixaram de pagar R$ 9,8 bilhões ao governo federal para “manterem” preços mais baixos no transporte coletivo. Este valor vem aumentando ano após ano como pode ser visto no gráfico 01. Motivo de alguma repercussão no ano de 2013, desde então não se falou mais nisto e foi oportunamente esquecido pelos que se beneficiaram desta isenção. Parece que, assim como em todos os outros setores que o governo Dilma deu isenções, os empresários embolsaram este subsídio como mais lucro.
Gráfico 01 – Isenções tributárias para empresas municipais de transporte coletivo (em bilhões de reais)
Fonte: Demonstrativos dos Gastos Tributários da Receita Federal
No entanto, de forma contra-intuitiva houve aumentos reais (quando descontamos a inflação) do preço da passagem em inúmeras cidades, mesmo com estas isenções bilionárias. Pegando como exemplo SP, Curitiba, Porto Alegre, Recife e Rio de Janeiro todas tiveram aumentos reais do preço da passagem de ônibus, indo desde 2% (SP) até 22% (Curitiba), se contarmos a partir do ano de 2012.
Além dos aumentos em si também houve uma série de cortes de benefícios dos passageiros, como o fim da domingueira em Curitiba (pagava-se R$ 1,50 aos domingos em 2013) e o retorno da cobrança de 50% da segunda passagem (quando a viagem começar após 30 minutos da primeira) em Porto Alegre. Ou seja, os empresários tiveram outras formas de compensação financeira para além do preço normal da tarifa, sem contar o dinheiro que várias prefeituras já pagam a estas empresas como forma de “complemento” do preço da passagem.
Gráfico 02 – Variação acumulada real das tarifas de transporte coletivo de 2013 a 2019 por cidade
Fonte: O autor
Ironicamente, ignorando os maiores protestos da história recente do Brasil, o empresariado brasileiro continua a destruir qualquer forma de mobilidade popular nas grandes cidades. Como mostra levantamento do Mobilize.org.br, nas capitais brasileiras os trabalhadores desembolsam uma parte muito maior da sua renda do que moradores de cidades como Paris, Tóquio e Santiago. Em Belo Horizonte e Florianópolis, por exemplo, se gasta mais de 16% da renda só com passagem de ônibus/metrô. Este é justamente um dos motivos da crise geral da mobilidade no Brasil.
Segundo pesquisa da Confederação Nacional do Transporte (CNT), nos últimos 20 anos o número de passageiros no sistema de ônibus urbanos no Brasil já caiu 30%, e a tendência não é de interrupção desta queda.
Ou reestatizamos as empresas de transporte coletivo e as colocamos a serviço dos que dependem deste serviço ou em alguns anos teremos todos que cruzar as grandes cidades brasileiras a pé, como muitos já fazem.
Comentários