Quem corre com medo, não pergunta por caminho.
A razão espanta o medo.
O medo faz mais tiranos que a ambição.
(Sabedoria popular portuguesa)
Ao final de uma reunião de pauta da revista do Psol na Fundação Lauro Campos, na semana passada, um bom camarada me procurou e perguntou como lidar com o medo. No último fim de semana, participando de uma reunião da Resistência, uma camarada tinha me comentado que muitos jovens estavam vivenciando intenso sofrimento psíquico.
Não se trata de suspeitas excessivas, desconfianças infundadas. Muitos ativistas estão adoecendo porque se sentem inseguros. Chegaram à vida adulta depois do fim da ditadura. E o medo é, perigosamente, contagioso. Não se trata de paranoia. A angústia é indissociável da lucidez.
É muito compreensível que seja assim, se considerarmos as circunstâncias. As recentes ameaças do candidato Bolsonaro e do seu filho são estarrecedoras. Em gravação em um cursinho preparatório para exames de acesso à Polícia Federal em Cascavel no Paraná, Eduardo Bolsonaro não titubeou em chantagear os membros do Supremo Tribunal Federal com a disposição de prender os juízes.
Em mensagem filmada Jair Bolsonaro não hesitou em fazer intimidações e lançar ultimatos atrozes. O palavreado fascistóide foi até à aberração de defender a “limpeza” dos vermelhos, a criminalização do MST e do MTST, a prisão do candidato Fernando Haddad, do líder do PT no Senado Lindbergh Farias, e por aí vai. Bolsonaro discursou como se já tivesse sido eleito, o que é ainda mais preocupante.
Esta última semana de campanha começa de forma, extremadamente, grave para toda a esquerda brasileira. Organizações políticas são correntes nas quais nos organizamos para defender um programa. O que nos une em uma organização política, em primeiro lugar, são as ideias, o projeto. Mas como em qualquer coletivo humano estabelecemos relações uns com os outros. A dimensão subjetiva deste pertencimento tem, também, importância. São os vínculos pessoais. O crescente medo nas fileiras da esquerda e, em consequência, as enfermidades psíquicas devem nos preocupar. Claro que há boas razões para temer o que poderá significar uma vitória de Bolsonaro.
Quem luta sozinho se sente, por suposto, mais vulnerável. Mas nem mesmo quem se organiza se sente seguro. E as pessoas são, afinal, o mais importante. Esse processo responde a pressões objetivas avassaladoras: o avanço do neofascismo neste segundo turno. A omnipotência dos neofascistas produz ansiedade, angústia, desassossego. O medo cresce porque aumenta o sentimento de impotência. E esta dor é contagiosa. Mas não deve nos paralisar.
Porque é bom lembrar que há sentimentos mais poderosos do que o medo.
O amor e o ódio são mais fortes. Preferimos lutar para transformar o mundo inspirados pelo amor, a esperança e a solidariedade. Mas enganam-se os fascistas se pensam que deixaremos o medo disseminar entre nós, como uma epidemia, sem resposta. Seremos prudentes. Não responderemos a provocações. Agiremos coletivamente. Nossa luta vai exigir mais organização, e mais compromisso.
Nenhuma situação reacionária se mantém, indefinidamente. O nosso campo representa os interesses da ampla maioria. A situação é defensiva, mas a derrota em 2016 não foi uma derrota histórica. No dia 29 de setembro quase um milhão de mulheres, jovens e trabalhadores saíram às ruas. Aqueles que subestimaram a força da luta pelo que é justo sempre terminaram derrotados. Aqueles que subestimaram a fúria popular foram sempre derrotados. A hora das lutas decisivas não é aquela que ficou para trás. Ela está, ainda, à nossa frente. Há razões para termos esperança. E não estamos sozinhos no mundo. Em muitos países a solidariedade com nossa luta pela defesa das liberdades democráticas tem aliados sinceros.
Aconteça o que acontecer, o medo ainda vai mudar de lado.
Mais importante, nós sabemos qual é a cura.
Os que morreram pela liberdade nos ensinaram.
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