Como tudo o que envolve o Brasil nos últimos anos, tivemos um clima de Copa bem diferente. Nada mais parece sagrado em solo brasileiro, o que não poupou nem a Copa, nem a amarelinha, nem os craques da Seleção.
Eu, como militante socialista e torcedor de futebol, as duas coisas ao mesmo tempo, fiz campanha contra a ideia, pra mim equivocada, de que os lutadores e ativistas, que dedicam as suas vidas à militância e à luta social devem escolher entre uma coisa ou outra. A Copa também é reunião da família, reunião entre amigos, churrasco, cerveja e bolão, e não há mal nenhum em viver isso intensamente. Festejar em tempos difíceis também é uma forma de resistência.
No entanto, o desenrolar dos jogos, em especial após os dois gols nos acréscimos contra a Costa Rica, fez de novo o país respirar a expectativa do Hexa, apesar de não esquecer por nenhum momento a gravidade do momento em que vivemos. Não vi nada de alienado na torcida pela Seleção. Desde 2014, fico tranquilo em dizer que a ideia da Copa como ópio do povo não condiz com o nível de politização da torcida brasileira, à direita, mas também à esquerda.
Há 4 anos vivíamos o nosso pior pesadelo futebolístico. Em uma Copa realizada no Brasil após 64 anos, que tinha tudo para tornar-se motivo de orgulho, nos restaram estádios bilionários e vazios, cidades cada vez mais caras expulsando a população mais pobre e negra para bairros cada vez mais distantes, ou na melhor das hipóteses, para as ocupações urbanas, e um 7 a 1 desmoralizante.
Uma geração de jogadores ficou marcada, e diversas gerações de torcedores se viram diante do inexplicável.
A resposta da CBF foi condizente com o que dela se espera, criminosa: a recontratação de Dunga, Gilmar Rinaldi encarnando a raposa tomando conta do galinheiro, e a manutenção da seleção como algo completamente desconectado da vida do país. Amistosos contra seleções sem prestígio, em estádios sem torcedores brasileiros, fora do país.
Tite chegou já depois do fiasco da Copa América pra salvar a lavoura, e em dois anos foi capaz de reerguer a Seleção a um patamar de disputa do título da Copa do Mundo. E isso sem contar com um grande planejamento, ou mesmo um ciclo completo entre Copas.
Cai o mito da geração fraca do futebol brasileiro. Neymar, Coutinho, Gabriel Jesus, William, Douglas Costa, Firmino, Renato Augusto. Todos craques de seus times, com participação importante na Copa de 2018 onde Messi, CR7, Kroos, Iniesta, James Rodríguez não conseguiram ser protagonistas e nem passar das Oitavas com seus respectivos países.
O Brasil perdeu da Bélgica, time com o melhor ataque da competição, e que demonstrou num jogo decisivo que era mais do que uma aposta. A virada contra o Japão mais que expor a fragilidade de sua defesa, já evidenciava a força mental e a capacidade técnica dos belgas. Mesmo um segundo tempo inteiro martelando, com atuações, senão brilhantes, acima da média de Douglas Costa e Neymar, não foi suficiente.
Do lado belga, Hazard jogou muita bola, e Lukaku pode reivindicar a co-autoria do golaço de De Bruyne. Chadli e Meunier muito bem. E Courtois foi brilhante. O seu destaque só evidencia aquilo que todos puderam ver: o ataque brasileiro funcionou. Diferentemente do 7 a 1, o time cresceu quando em desvantagem. Soube manter a cabeça no lugar e não seria nada injusto arrancar o empate nas bolas de Renato Augusto, Coutinho, ou no chutaço derradeiro de Neymar, pra defesa espetacular de Courtois.
Aqui é preciso uma pausa pra estender toda a solidariedade a Fernandinho, vítima de ataques racistas nas redes sociais. Que os autores sejam identificados e punidos, e Fernandinho possa seguir a sua brilhante trajetória no City. Como Lukaku disse recentemente, quando ele ganha, é belga. Quando perde, é congolês. O racismo é Internacional, e somente com uma luta em igual escala vamos derrotá-lo.
Não há terra arrasada. Só uma seleção pode ser campeã, e já o fomos 5 vezes: às vezes é necessário lembrar o óbvio.
França, Bélgica, Inglaterra ou Croácia. Considero França e Bélgica equivalentes, enquanto a Inglaterra mostrou uma campanha superior à da Croácia. Por isso, considero bastante provável que os ingleses farão uma final após 52 anos.
Para os racistas, França, Inglaterra e Bélgica tem entre seus protagonistas jogadores negros, filhos ou netos de imigrantes. Mbappé e Pogba, Sterling e Lingard, Lukaku e Kompany. Pra quem não reparou, Lingard e Dele Alli, jogadores da Inglaterra, comemoraram seus gols com a coreografia de Childish Gambino em This Is America. Porque nunca foi só futebol.
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