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Como derrotar os golpistas? Quatro apontamentos sobre a luta pelo Brasil

Manifestantes invadem Congresso, STF e Palácio do Planalto.
Marcelo Camargo/Agência Brasil

Manifestantes invadem Congresso, STF e Palácio do Planalto.

Gabriel Santos

Garbriel Santos é alagoano, estudante da UFRGS, militante da Resistência-PSOL (RS), vascaíno e filho de Oxóssi.

1. A situação política do país ainda não foi totalmente definida.

As eleições mostraram que o Brasil estava dividido. Por pouco, Bolsonaro não venceu o segundo turno. A câmara e o senado elegeram uma maioria reacionária, com grande presença bolsonarista e da extrema direita. Lula ganhou, mas não venceu.

A situação política reacionária instaurada após o governo Dilma busca ser revertida. A vitória eleitoral de Lula e a formação de seu governo vem neste objetivo: criar condições mais favoráveis para a classe trabalhadora.

Toda análise sobre uma situação política é feita a partir de um grau de abstração, mas que busca responder: qual classe social consegue impor seu projeto de país? Qual agrupamento de classes está na ofensiva, e qual agrupamento está na defensiva durante um período significativo de tempo?

Uma situação política favorável significa que quem dita a pauta política são as forças populares. Que o grupo social que tem maioria social, e força para pressionar o congresso, são as forças populares.

A vitória do Presidente Lula a partir da Frente Ampla, é um marco para a inversão da situação reacionária. Porém, essa inversão ainda não se deu por completo.

Eu diria que no atual momento da luta de classes o que vemos é as forças populares lideradas por Lula e seu governo de Frente Ampla, disputando com a extrema direita as condições na qual essa nova situação favorável a classe trabalhadora irá surgir.

A extrema direita tenta, a todo custo, impedir que uma situação favorável às forças populares surja, e por isso, avança rumo à ruptura institucional. Porém, ao mesmo tempo, ao fazer isto, cria uma situação onde mostra sua força e atua sobre o governo, impedindo que uma situação ainda mais favorável a nosso campo de abra.

Eles buscam impor uma correlação de forças que esteja sempre em disputa, assim impedindo Lula de realizar as medidas necessárias para a reconstrução do país.

2. A extrema direita é mais ampla que Bolsonaro e uma peça do tabuleiro da política brasileira 

A extrema direita é um polo atuante da luta política no Brasil, e isso não pode ser normalizado. Ainda não está dado qual será sua forma de atuação nem sua representação no governo Lula.

O bolsonarismo é uma frente entre diversos grupos de extrema direita e foi sua máxima representação política desde o Golpe contra Dilma.

Bolsonaro tem capital político e base partidária para ser o representante e organizar a extrema direita através do bolsonarismo. Porém, outras figuras podem assumir o papel de liderança deste setor, como o General Mourão.

A invasão ao Planalto no domingo e os acampamentos golpistas nos quartéis mostram que a extrema direita está organizada, se radicaliza para a ruptura institucional e recebe apoio financeiro.

Os rumos que a extrema direita e seu papel na política nacional dependem das próximas horas, dias e semanas. Ou seja, da resposta institucional que o governo Lula dará às tentativas de golpe. Assim como, da capacidade de resposta das forças populares nas ruas.

Vale apontar ainda, que a extrema direita brasileira, é uma expressão política da formação social do Brasil. Do colonialismo, racismo e violência que nos ergue enquanto tentativa de Nação. E que ela responde aos avanços sociais conquistados nas últimas décadas pelas camadas populares, em especial por negros, favelados e mulheres. É também uma resposta do capital para acabar com esses direitos e aumentar a taxa de lucro da burguesia. Por isso, tem como base social a classe média urbana, o agronegócio e uma nova burguesia, como empresários da fé e do ramo do comércio.

3. A batalha de ideias

Fidel Castro durante os anos 90, após a queda do Muro de Berlim e avanço do neoliberalismo em todo o planeta, dizia que era preciso que os revolucionários se esforçassem para realizar uma batalha de ideias.

Acredito que a única forma de garantir que Lula consiga terminar seu mandato, aplicar o programa pelo qual foi eleito, consiga avançar na desbolsonarização do Brasil, e enfrentar o neoliberalismo, vai ser com apoio popular.

Apoio no sentido de ter uma base popular organizada. De uma forma na qual as forças populares consigam ter uma maioria da população defendendo suas ideias. Acreditando na necessidade de enfrentar as privatizações, defender o meio ambiente, não entregar anistia e punir os criminosos que estiveram no governo durante os últimos quatros anos.

Os próximos dias mostrarão como a ação golpista de domingo foi recebida na população, inclusive em setores da classe que votaram em Bolsonaro. A disputa de narrativa será necessária.

Somente as ações institucionais para punir os golpistas não basta. As pressões pela institucionalização serão enormes, porém, as experiências anteriores do governo petista já mostraram que a luta institucional sozinha é insuficiente.

É preciso que a luta institucional no aparato do Estado se combine com a luta social, e auto organização popular.  Se faz necessário ter ação de massa, grupos organizados, se formar uma nova maioria social em defesa da democracia e de pautas progressivas para o novo governo.

A batalha no campo das ideias, como falou décadas atrás Fidel Castro, é uma trincheira decisiva. Sem vencê-la não teremos maioria.

4. Os caminhos para a esquerda

Para se construir uma nova maioria é preciso que as forças populares realizem duas coisas.

A primeira delas é abandonar o método fratricida das disputas laterais. Ou seja, a forma destrutiva de fazer disputas políticas entre si. As esquerdas brasileiras precisam abandonar o sectarismo mesquinho, as disputas intermináveis por aparato, a briga infrutífera por entidades. O inimigo agora é outro. Não temos tempo pra perder se matando entre nós.

As diferenças que existem precisam ser expostas e valorizadas, mas não são incontornáveis. Aqueles grupos que preferem o auto isolamento, e são incapazes de perceber quem é o adversário da vez, terão o esquecimento e a insignificância como destino.

A segunda coisa que se faz necessário é realizar justamente o anunciado por Marighella em sua histórica transmissão pela Rádio Libertadora: é necessário trabalhar mais e mais pela base.

De fato, essa é uma frase simples mas que traz complexidades gigantescas. Só nos tornaremos maioria social quando deixarmos de falar para nos mesmos e buscarmos organizar outros setores que ainda não conseguimos.

Temos que ganhar as batalhas em cada esquina, erguer muralhas em cada bairro. Não existe saída fora do trabalho de base.  Só venceremos a batalha de idéias se convencemos outras pessoas de nossas ideias.

Os milhares de comitês e grupos de campanha que vimos surgirem ano passado, precisam se transformar em comitês políticos permanentes. Formas de elaborar e fazer política nos locais por moradia ou trabalho. Seja para organizar a defesa da democracia, ou tratar de outros temas relacionados ao governo, ou as especificidades políticas de cada local. O que precisamos é organizar pessoas, para mobilizar pessoas, para organizar mais pessoas.

Cada militante precisa se multiplicar. Se na década de 60 a tarefa era fazer “um, dois, três Vietnãs”. Hoje a tarefa é sermos “um, dois, três de nós”. Sermos o melhor de nós.

Derrotar a extrema direita é a tarefa central de nossa geração. Não existe vitória por fora da luta de classes. Não existe luta de classes sem organização.

Podemos vencer, precisamos vencer.