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Golpe de Bolsonaro ou vitória do Lula no 1º turno?

Lula
ANDRÉ RIBEIRO/FUTURA PRESS/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

Gabriel Casoni

Gabriel Casoni, de São Paulo (SP), é professor de sociologia, mestre em História Econômica pela USP e faz parte da coordenação nacional da Resistência, corrente interna do PSOL.

Quando Bolsonaro lança ameaças golpistas, soam as trombetas da terrível derrota que se aproxima: o golpe fascista no Brasil que bate à porta.

Quando o Datafolha aponta que Lula pode vencer no 1º turno, agita-se a vitória espetacular que se avizinha: a derrota humilhante de Bolsonaro que bate à porta.

Nem os alarmistas da derrota final nem os proclamadores da vitória triunfal estão totalmente errados, nem totalmente certos. Mas erram mais do que acertam, pois são unilaterais – há certa dificuldade de observar as contradições conjugadas da realidade. Há inúmeras evidências de que Bolsonaro se enfraqueceu politica e socialmente desde a eclosão da pandemia. Há uma maioria no povo que o rejeita fortemente, sobretudo entre os trabalhadores de menor renda, negros, jovens, nordestinos e mulheres.

Se não houvesse ocorrido essa inflexão positiva dentro de uma situação política ainda reacionária (portanto, um momento de transição na correlação de forças, cujo desfecho está em disputa), não haveria como explicar racionalmente porque Lula saiu da cadeia, recuperou os direitos políticos e lidera as pesquisas com possibilidade de vitória em primeiro turno.

Qual a base material dessa mudança positiva? A experiência concreta das massas trabalhadoras e oprimidas com a tragédia social e econômica provocada pelo governo Bolsonaro (fome, miséria, desemprego, genocídio na pandemia, violência, carestia etc.), além de fatores internacionais, como a derrota de Trump nos EUA. Essa experiência concreta impacta a consciência.

Acontece, no entanto, que Bolsonaro, embora enfraquecido, ainda não está derrotado. E isso faz muita diferença. O neofascista ainda tem cerca de 30% de apoio na sociedade (número minoritário, mas expressivo), maioria no empresariado (pequena e média burguesia), suporte em setores militares e policiais e todo tipo de conexão com bandos criminosos, além de deter o controle da máquina do governo federal e contar com a aliança com o centrão no Congresso.

Porém, o mais importante não são esses elementos de forma isolada. É a capacidade de combate do bolsonarismo acionando esses fatores de força, especialmente o potencial de mobilização de sua base social (característica própria do fascismo). Por isso, a força política e a estratégia golpista de Bolsonaro não podem ser, de modo algum, subestimadas nesse ano crucial.

A vitória estratégica de 2022 — a retirada de Bolsonaro da Presidência — pode ser alcançada. As condições para isso estão colocadas: há maioria social no país contra o miliciano e Lula consolidou-se como a alternativa eleitoral para vencê-lo. Mas a vitória precisa ser conquistada na luta, não virá sem o combate. E a luta vai ser dura e perigosa: Bolsonaro não abdicará do poder sem confronto.

O duplo desafio nos próximos meses

Por um lado, é preciso assegurar a vitória de Lula nas urnas, se possível já no primeiro turno. Por outro, é necessário formar e organizar um setor de massas para derrotar o golpismo por meio da mobilização direta. A campanha de Lula, portanto, precisa ir além da importante batalha pelo voto das pessoas, precisa se converter também num instrumento de luta contra o fascismo nas ruas.

Nesse sentido, a estratégia de giro “ao centro” da campanha de Lula, de forma a ampliar as concessões políticas e programáticas às elites econômicas, não bastando a indicação de Alckmin como vice, é uma orientação equivocada e perigosa também no plano tático. Pois não leva seriamente em conta que essa será uma disputa eleitoral anormal. Lula enfrentará um fascista com um plano golpista, capacidade de mobilização de massas e apoio social e militar considerável.

Lula precisa, sim, ampliar sua campanha, mas no sentido de converte-la num amplo movimento de massas para derrotar o fascismo e lutar pelos interesses mais sentidos pelo povo trabalhador e oprimido (combate à carestia, emprego, salário, educação, saúde, fim da violência racista e machista etc.).

A ferramenta para assegurar a derrota de Bolsonaro não será a conquista da da simpatia de um setor da classe dominante para com a candidatura de Lula, e sim a capacidade que a esquerda terá para colocar milhões em movimento nessa campanha. Se setores amplos da classe trabalhadora e da juventude entrarem em cena nessas eleições, não só por meio do voto em Lula, mas também com os pés nas ruas, a derrota de Bolsonaro será inevitável e qualquer tentativa de golpe estará fadada ao fracasso.

E a batalha eleitoral deve ser combinar, nesse momento, com a luta imediata pelas condições de vida do povo. Seja a luta por aumento salarial dos trabalhadores diante da inflação, seja a mobilização contra com os seguidos atos de extermínio policial de vidas negras.

Obs.: Até agora (sexta, dia 27, às 17h) Lula não se pronunciou sobre a tortura e a execução de Genivaldo por policiais da PRF em Sergipe. Atraso indesculpável.