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OPRESSÕES

Malcolm X em seis atos: O islamismo político e o antirracismo 

Leia a segunda parte da série de artigos sobre Malcolm X

Gabriel Santos*, de Maceió, AL

Foi na cadeia que sua vida mudou por completo. A religião foi a porta de entrada para que Malcolm passasse a questionar a desigualdade social e a violência sofrida pelos negros. Wilfred, um de seus irmãos, envia-lhe um cartaz apresentando a Malcolm àquela que seria “a religião natural para os homens negros”, se referindo ao Islã. Wilfred mostrara a Malcom textos de Elijah Muhammad, dirigente do grupo Nação do Islã (NoI), que o convence a conversão. 

O honorável Elijah Muhammad e a Nação tinham uma visão peculiar da religião islâmica misturada a ideias políticas. A NoI defendia a separação total entre brancos e negros, condenava a miscigenação e defendia que os negros norte-americanos deveriam criar um Estado separado dos brancos, que por sua vez seriam os demônios da humanidade. Elijah Muhammad afirmava que Allah era negro e que o Islã daria motivo para o povo negro se sentir orgulhoso e não ter vergonha de ser negro. Malcolm, como muitos negros que estavam jogados em presídios, entrou para a Nação. Ele adota o X em seu nome, negando seu sobrenome de origem, do período de escravidão. Após a conversão, Malcolm X se torna um leitor insaciável, um verdadeiro autodidata, o que o fez, somado com sua grande oratória, subir rapidamente nos postos da Nação. Ele comanda a construção de templos em Boston, Hartford, Filadélfia, se torna líder do templo Número 7, que ficava no Harlem, em Nova York, e logo assumia o posto de porta-voz oficial da organização. 

Em dez anos, a partir do momento que Malcolm saiu da cadeia, em 1952, até sua ruptura com a Nação do Islã, o grupo teve um absurdo crescimento, de 500 membros para 30 mil. Este sucesso se dá tanto por conta do contexto de luta política por direitos civis no país, que teve a NoI como parte mais radical de um nacionalismo negro, como deve muito ao papel pessoal de liderança exercido por Malcolm X.

Até sua ruptura com a Nação do Islã, o grupo teve um absurdo crescimento, de 500 membros para 30 mil.

Com o crescimento das tensões raciais, o discurso de Malcolm X se tornava mais firme. Ele discordava publicamente de Martin Luther King e de defensores da não violência como tática. X defendia o direito e a necessidade da autodefesa e da violência revolucionária como um meio para os negros conseguirem combater o racismo. 

Seu discurso e opinião entrava cada vez mais em conflito com o de Elijah Muhammad. Esse, por sua vez, estava preocupado com a quantidade de admiradores de X, dentro e fora da Nação. Elijah Muhammad via em Malcolm uma ameaça à sua liderança pessoal sobre a NoI. Vale ressaltar que o papel de Elijah Muhammad na Nação o permitiu ter um crescimento em seu nível social e financeiro. Usando a fé, ele havia consigo se tornar dono e sócio de negócios altamente lucrativos, e era isto que ele temia perder com a ascensão de X. 

Elijah Muhammad e Malcolm X

Malcolm criticava por um lado a confiança que Dr. King tinha nas instituições do Estado norte-americano, e por outro lado passava a ver com um olhar cada vez mais desconfiado as ações do dirigente da NoI. 

X critica as limitações que Elijah Muhammad impôs sobre ações diretas de defesa e de revide feitas por membros do grupo. Essas medidas estavam ligadas à relação do principal líder da NoI com uma crescente classe média negra. Malcolm fazia críticas duras também ao fato de a Nação não avançar em seu discurso sobre o funcionamento do modelo racista de sociedade norte-americana. 

A ruptura definitiva de Malcolm X com a Nação ocorre em dezembro de 1963. Quando o mesmo sofre uma sanção de Elijah Muhammad, ficando proibido de falar em público por 90 dias. Isso se deu por conta de uma resposta de Malcolm sobre o assassinato de John F. Kennedy, que gerou fortes críticas da imprensa do país. 

Terminado o período de silenciamento, Malcolm X anuncia sua ruptura completa com a Nação do Islã, e demonstra um desenvolvimento na crítica ao racismo que o aproxima de movimentos socialistas e operários. Criticando o sectarismo da NoI, Malcolm afirma que: “não misturamos nossa religião com nossa política. Nos envolvemos com qualquer pessoa, em qualquer lugar, a qualquer hora e de qualquer maneira que seja para eliminar os males, os males políticos, econômicos e sociais que estão afetando as pessoas da nossa comunidade”. 

*Educador popular e ativista do Afronte!

 

NO PRÓXIMO TEXTO (22/05)

Ato 3: O Hajj, o retorno e a crítica ao capitalismo