No último sábado ,15, (1) completou os 73 anos da Nakba (“catástrofe”) – quando ocorreu a expulsão do povo palestino de seu território, em 1948 – houve inúmeras ações de solidariedade em várias partes do mundo contra mais um capítulo da limpeza étnica perpetrada pelo Estado colonialista e racista de Israel, dessa vez na Faixa de Gaza.
No sexto dia de bombardeios feito por Israel à Gaza, provocaram que provocaram a morte de dez pessoas duma mesma família em um campo de refugiados e teve o desabamento de um prédio onde funcionavam escritórios da agência de notícias Associated Press (AP), dos Estados Unidos, e da emissora Al Jazeera, do Catar. Com os bombardeios ainda mais intensos neste domingo (16), segundo informa a Al Jazeera, pelo menos 192 palestinos, incluindo 58 crianças, morreram na Faixa de Gaza desde a última segunda-feira, 10 (2).Mas, à medida que você lê esta notícia, o número de mortos aumenta.
As manifestações de sábado, 15
O rechaço internacional para deter esse massacre que estamos vendo em Gaza e a condenação a Israel ganharam proporções inéditas. Talvez seja o primeiro aniversário da Nakba com impacto mundial. Afinal, da Austrália ao Canadá, da África do Sul a Europa, da Ásia a América do Sul, viram as ruas cheias de gente denunciando o extermínio de Israel à população civil em Gaza e se solidarizando à resistência do povo palestino.
Nos EUA, o mais importante aliado (econômico e militar) de Israel, houve manifestações em 50 cidades. Uma das mais significativas pelo simbolismo foi a ocorrida, na região do Rust Belt, nordeste industrial, coração da classe operária estadunidense.
Atos fortes em Madri e Berlim, Londres e Paris
Em Madri, cerca de 2,5 mil pessoas protestaram na capital da Espanha, contra os ataques de Israel a Gaza. “O silêncio de uns é o sofrimento de outros”, “Jerusalém, a capital eterna da Palestina” e “não é uma guerra, é um genocídio” foram algumas palavras de ordem entoadas e escritas em cartazes pelos manifestantes.
Na Alemanha, atos foram registrados em algumas cidades. O maior deles aconteceu na capital, Berlim. Ao menos três manifestações ocorreram em diferentes pontos da cidade. Palavras de ordem como “libertem Gaza!”, “vidas palestinas importam” e “salve Sheikh Jarrah”, também foram entoadas por manifestantes.
Em Paris, a manifestação, ocorreu no bairro de Barbés (zona norte) e foi reprimida. As palavras de ordem “a Palestina viverá”, a “Palestina ganhará” e “Israel assassino” foram as principais entoadas pelos manifestantes.
Já em Londres, milhares de pessoas se reuniram no centro da cidade para exigir que o governo britânico intervenha na situação e interrompa os ataques israelenses. Os manifestantes se concentraram em Marble Arch, de onde marcharam até a embaixada israelense, entoando palavras de ordem e pedindo “libertação” da Palestina. Algumas organizações que convocaram os protestos na Inglaterra foram a coalizão Stop the War e a associação muçulmana do Reino Unido. Segundo dados desses coletivos, as manifestações deste sábado reuniram 150 mil pessoas em Londres. (3)
Ainda na Europa, centenas de pessoas foram às ruas em Varsóvia, capital da Polônia, para protestar em frente à embaixada de Israel no país. Os manifestantes pediam o fim do “holocausto dos palestinos”, gritando palavras de ordem como “Palestina Livre”
Também ocorreram manifestações nos Bálcãs, na Grécia e na Turquia.
Além dos atos ocorridos em várias cidades europeias, vale destacar o exemplo de solidariedade internacionalista ocorrido, na Itália, no último dia 14 onde portuários italianos ligados à União Sindical de Base descobriram e pararam um carregamento de armas que estava indo para Israel. Os trabalhadores se recusaram a carregar o barco, demonstrando um importante apoio aos palestinos.
Em outras partes do mundo também foram registrados atos de solidariedade aos palestinos de denúncia aos bombardeios de Israel sobre Gaza.
Na Ásia, ocorreram atos no Iraque, Irã e Japão. Na África do Sul também houve uma grande manifestação.
Massivos protestos foram registrados em diversos pontos de Jerusalém Oriental e em outras cidades dentro das fronteiras de 1948 de Israel, que repudiaram os ataques israelenses.
Na América do Sul também ocorreram inúmeros atos
Foto: Scarlett Rocha | EOL
No Brasil, ocorreram manifestações em algumas cidades. Em Brasília, ocorreu um ato pela manhã em frente à embaixada da Autoridade Palestina, em Brasília. Em discurso durante a manifestação em Brasília, o secretário-geral da Liga Árabe, Ahmed Abou Al Ghaite, relacionou a escalada da violência ao avanço da ocupação israelense de territórios palestinos. “Por que essa ocupação não acaba? O direito internacional não está sendo respeitado por parte de Israel”, afirmou.
Foto: Soraya Misleh | Monitor do Oriente
Em São Paulo também ocorreu uma carreata em que se pedia o fim do massacre em Gaza e relembrava a continuidade dos 73 anos da Nakba palestina. Foi organizada pela Frente em Defesa do Povo Palestino, o movimento BDS, o espaço cultural Al-Janiah e o Fórum Latino-Palestino, entre outras organizações. Durante mais de três horas, a manifestação saiu do Al Janiah, no Bairro da Bela Vista, em direção ao Pacaembu, onde ocorreram os principais discursos (4).
A Nakba continua
A Nakba não é um evento que culminou naquele 15 de maio de 1948, mas é parte de um processo que continua até hoje com o avanço da colonização israelense nos territórios ocupados. Isso se materializa no confisco de territórios, demolindo casas, aprisionando sua população, controlando suas fronteiras e recursos naturais e substituindo a população palestina nativa por colonos judeus, que estão instalados nos chamados “assentamentos”, em total violação das normas internacionais. Assim, tentativas estão sendo feitas para eliminar a presença palestina e expandir a presença ilegal de colonos por meio de roubo de terras e políticas discriminatórias no planejamento, habitação e orçamentos.
O recente despejo de famílias palestina do bairro de Sheikh Jarrah, em Jerusalém Oriental (ocorrido há 10 dias e que gerou a reação palestina e a consequente onda de aumento desproporcional da violência por parte de Israel), e que faz parte da política de judaização sistemática da parte palestina da cidade é apenas o mais recente capítulo da tragédia que assola a vida dos palestinos. (5)
Mas é na Faixa de Gaza que estamos acompanhando (há uma semana) as terríveis imagens que chegam dos ataques aéreos, navais e, mais recentemente, das bombas de tanques e artilharia pesada israelenses contra a população civil daquela que é áreas com uma das maiores densidades populacionais do mundo, com 2 milhões de habitantes. Preocupado com o levante sincronizado inédito da população palestina nas fronteiras de 1948, Israel reposicionou as tropas normalmente estacionadas na Cisjordânia ocupada, a chamada “polícia de fronteira”, dentro da Linha Verde.
Até a noite desse domingo, o resultado de uma semana de ataques em Gaza é a morte de 192 pessoas, das quais 58 crianças (na Cisjordânia, 13 palestinos foram assassinados ao protestarem contra esses abusos). Somado ao massacre, vários ataques a zonas residenciais, destruindo quase integralmente o sistema elétrico, a distribuição de água e o abastecimento de bens de primeira necessidade.
Além dessa terrível tragédia é importante observar a importante (e preocupante) informação do Programa Mundial de Alimentos que diz que “68,5% dos palestinos em Gaza sofrem de insegurança alimentar e 53% vivem na pobreza, enquanto todos os setores produtivos, serviços sociais básicos e infraestruturas entraram em colapso, devido ao impacto cumulativo de 12 anos de bloqueio marítimo, terrestre e aéreo que está privando” (6). E que toda essa situação estaria privando os habitantes de Gaza “dos recursos essenciais para lidar com a propagação de doenças, incluindo o surto da COVID-19”.(7)
Heroica resistência palestina + solidariedade global: uma combinação que pode dar resultados
Atualmente, os palestinos estão reivindicando seus direitos nas ruas em todos os lugares. Mas para que essa luta pela reparação de direitos não seja invisibilizada (como frequentemente a cobertura internacional insiste) somente a solidariedade ativa e global poderá imediatamente deter mais essa barbárie que Israel comete contra a população palestina em Gaza. Essa deve ser a primeira tarefa. Pois se trata da vida de milhões de palestinos.
Mas também a solidariedade precisa ser estendida contra os muros do apartheid israelense e pela recuperação dos direitos de todo o povo palestino, pois não é possível falar de paz sem falar de justiça ao povo palestino que foi expropriado de suas próprias terras e teve seu território fragmentado com o surgimento do Estado de Israel em 1948 mas que, como vimos, representou a Nakba para os palestinos.
Nesse sentido, a advertência feita por Maurice Khamis, Presidente da Comunidade Palestina de Chile, tem um profundo significado ao afirmar:
“Setenta e três anos é muito tempo. Como sociedade, demoramos muito para condenar o genocídio armênio, o holocausto judeu e o apartheid da África do Sul. Quanto mais os palestinos terão de esperar?” (8)
* Professor de História da rede municipal do RJ e militante da Resistência/PSOL
NOTAS
(1) Agradeço a leitura atenta, a parceria e as informações relevantes de Waldo Mermelstein, histórica referência do socialismo internacional e da solidariedade a causa palestina.
(2) https://www.aljazeera.com/news/2021/5/16/more-deaths-gaza-israel-launches-most-intense-raids-yet (Consultado 16.05 às 20h30)
(3) https://operamundi.uol.com.br/politica-e-economia/69747/manifestacoes-ao-redor-do-mundo-condenam-ataques-de-israel-contra-gaza (Consultado em 14.05.2021)
(4) Para maiores informações do ato em São Paulo, inclusive com o registro de vídeos, ver https://www.monitordooriente.com/20210515-carreata-em-sao-paulo-e-atos-no-brasil-apoiam-a-resistencia-palestina/ (Consultado em 15.05.2021)
(5) https://esquerdaonline.com.br/2021/05/11/uma-nova-intifada-palestina-esta-surgindo-notas-sobre-a-resistencia-contra-o-plano-de-judaizacao-sionista-de-jerusalem-oriental/ (Consultado em 15.05.2021)
(6) https://www.wfp.org/countries/palestine (Consultado em 14.05.2021)
(7) Idem, ibdem
(8) https://www.federacionpalestina.cl/opinion-a-73-anos-de-nakba-la-gran-catastrofe-palestina-que-no-ha-dejado-de-extender-sus-efectos/?fbclid=IwAR3Ea5x8ebxUvs6SJXUK28ITQGBnofqjox9xadkfF_foXnOX7HjggScKdl0 (Consultado em 15.05.2021)
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