O receituário apontado pelo ministro Ricardo Sales na reunião do dia 22 de abril – “passar a boiada” enquanto o mundo está voltado para o coronavírus – já começa a ser implementado no âmbito da educação. Em meio à pandemia, com mais de 26 mil mortes no Brasil e com as universidades impedidas de manter atividades presenciais, o governo encaminhou para o Congresso Nacional o projeto Future-se, que representa um brutal ataque à educação pública.
A política econômica ultraneoliberal de Paulo Guedes prevê a privatização em todos os setores numa ampla transformação da política social pública em mercadoria. O processo de privatização do patrimônio público pode ocorrer de forma clássica e não-clássica. (1) A primeira se materializa com a venda de empresas estatais que passam na sua totalidade para o domínio privado do mercado; já a forma não-clássica se operacionaliza pela mercadorização que ocorre por dentro dos serviços públicos, sendo mais aplicada às políticas sociais como por exemplo: saúde, previdência e educação.
O projeto Future-se, que teve seu primeiro formato apresentado em julho de 2019, é um exemplo de entrega da educação superior nas mãos do capital. A denominada “autonomia financeira” traduz-se na realidade em diminuição dos investimentos públicos nas Instituições Federais de Ensino Superior (IFEs), obrigando-as à captação externa de recursos. Esse movimento materializa uma privatização por dentro das universidades e institutos federais, à medida que sua sobrevivência estará condicionada à injeção de recursos privados para manutenção das atividades. Ainda nesse aspecto privatizante, o projeto dá margem para a cobrança de mensalidades, bem como autoriza a utilização de prédios públicos das IFEs por empresas privadas.
Gostaríamos de destacar também o caráter de perseguição ideológica que tem sido a marca desse governo, com características fascista e genocida. O enquadramento das IFEs em novo formato de funcionamento também vem acompanhado da possibilidade de um controle maior dos conteúdos e matérias a serem discutidas no ensino superior.
uma ampla campanha difamatória contra as universidades públicas e institutos federais, na explícita tentativa de desqualificar o ensino superior público
Todas essas questões vêm em conjunto com uma ampla campanha difamatória contra as universidades públicas e institutos federais, na explícita tentativa de desqualificar o ensino superior público. Essa desqualificação passa por acusações feitas pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, que expõe as universidades públicas e institutos federais como local de balbúrdia, de ineficiência, de doutrinação ideológica, dentre tantas outras acusações falaciosas e absurdas. Essa farsa montada pelo ministro da Educação tenta impor a pecha de má gestão dos recursos da educação pública em contraposição a uma suposta eficiência do setor privado na gestão do mercado e do lucro. Assim, defende também que a educação receberia muitos recursos, mas que esses não seriam bem utilizados, o que justificaria corte e contingenciamentos no orçamento destinado às universidades públicas e institutos federais.
A outra ponta dessa história é a comprovação de que a educação tem se transformado numa mercadoria das mais caras no mundo inteiro e, por isso, os grandes empresários da educação e seus conglomerados que dominam esse mercado são os principais interessados em destruir as universidades públicas.
Na concepção de educação superior já defendida pelo Ministério da Educação, elitista e excludente, o ensino superior deve ser destinado para um punhado de privilegiados. Põe por terra todo o acúmulo do processo de interiorização da educação superior, bem como a expansão do acesso que permitiu a milhares de filhos e filhas da classe trabalhadora e parte da juventude negra o direito à educação pública, gratuita, laica, de qualidade, socialmente referenciada e emancipadora.
Ademais o encaminhamento do Future-se nesse momento em que as atividades presenciais nas universidades públicas e institutos estão suspensas, demonstra o caráter extremamente autoritário e desrespeitoso do governo Bolsonaro. Na surdina e sem nenhum debate com a comunidade acadêmica, passa o trator nas universidades públicas e institutos federais, numa explícita demonstração de destruição da educação pública federal. O autoritarismo se expressa ainda no fato de que a versão do projeto Future-se encaminhada sequer foi apresentada publicamente. É um verdadeiro desrespeito com o(a)s estudantes, docentes e demais funcionários das instituições federais de ensino público.
Na Amazônia passa-se o trator para transformar tudo em pasto, nas universidades públicas e institutos federais abre-se as portas para que os empresários sentem à mesa principal
Na Amazônia passa-se o trator para transformar tudo em pasto, nas universidades públicas e institutos federais abre-se as portas para que os empresários sentem à mesa principal e se deleitem do conhecimento produzido e posto à serviço do lucro. Assim, a política econômica nefasta do governo Bolsonaro ganha concretude em todos os âmbitos. Nas palavras do ministro Paulo Guedes, é mais uma granada no bolso daqueles que o governo Bolsonaro considera seus inimigos, a classe trabalhadora. Esta brutal ofensiva contra a universidade pública serve para agregar a base obscurantista e os empresários mercadores da educação. Contra estes precisamos unir esforços dos que lutam pela educação pública, por uma sociedade igualitária e pela vida. É urgente e vital para sobrevivência das universidades públicas, institutos federais e da própria educação pública o fim do governo Bolsonaro e Mourão. Defender a vida e a educação pública neste momento passa fundamentalmente pela derrubada do governo genocida, obscurantista e ultraneoliberal de Bolsonaro/Mourão e toda sua tropa.
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