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BRASIL

O Brasil na contramão do mundo: expansão da pandemia em ritmo quatro vezes superior à média mundial

Gilberto Calil

O quadro reúne os dados dos 15 países com maior número de mortes registradas. Tomamos como referência principal o ritmo de crescimento do número de mortos, tendo em vista que o patamar de subnotificação dos casos no Brasil inviabiliza qualquer comparação da evolução do número total de casos. Entendemos que o cálculo do ritmo de crescimento é mais revelador do a simples comparação dos números absolutos ou dos índices de mortes por milhão de habitantes, tendo em vista que a expansão do Covid-19 se iniciou em momentos diferentes e a pandemia encontra-se em estágios distintos.

O ritmo de crescimento mundial do número de mortes vem diminuindo de forma consistente. Há quatro semanas era 147%, há duas semanas era 50% e agora está em 28%, uma redução que comprova a efetividade das medidas de contenção através de política de isolamento social adotadas de forma rigorosa em muitos países. 

A situação do Brasil piora a cada dia. Além de dividir com o México o maior ritmo de expansão das mortes, tem também o maior ritmo de expansão do número de casos, que aumentou 141% em 14 dias. Registrou ontem 816 mortes e 14.919 novos casos, um número altíssimo, considerando-se a baixa testagem. Há 45 dias, 0,5% dos mortos eram do Brasil, e hoje este índice já é de 5%. Pior ainda, 18,7% dos mortos registrados no mundo ontem eram do Brasil.

Brasil e México, embora em patamares absolutos distintos, mantém-se com um ritmo de crescimento perto de cinco vezes superior à média mundial em 14 dias, tendo crescido respectivamente 132% e 142%, ritmo muito superior ao dos países que vem a seguir: Canadá (59%), Suécia (38%) e Estados Unidos 34%). O único país que não diminuiu o ritmo de expansão em relação ao levantamento de dois dias atrás foi a Suécia, que se destaca como único país europeu a resistir a medidas centralizadas de restrição das atividades. Os Estados Unidos seguem diminuindo diariamente o ritmo de expansão, mas mantém o maior número de mortes diárias, e não consegue impedir a crescente interiorização do contágio. A grande maioria – nove dentre os quinze países – teve um crescimento do número de mortes entre 11% e 23% no período de 14 dias, associado a uma clara redução dos novos casos e diminuição do número de casos ativos. A China não registra nenhuma nova morte há 21 dias.

Brasil e México são, também, disparadamente os dois países com menor número de testes. O número de testes por milhão de habitantes que Brasil (3.462) e México (1.271) é absolutamente inexpressivo. Na relação entre testes realizados e resultados positivos, o Brasil tem números ainda piores, com 3,15 testes realizados por resultado positivo, muito inferior ao mínimo recomendado pela OMS).  

O elevado ritmo de crescimento das mortes no Brasil contraria a tendência internacional de melhora da situação e indica um enorme agravamento do quadro nacional. Já tendo passado de 15.000 mortes oficializadas, o país deveria ter já controlado o número de novos casos para ao menos ter a expectativa de começar a reduzir o ritmo de crescimento das mortes a partir do início de junho. Mas para isto seriam necessárias políticas efetivas de isolamento social e inclusive de lockdown em algumas regiões. Medidas deste tipo foram adotadas por todos demais os países antes de chegarem no trágico patamar em que estamos no momento. Nosso isolamento social continua sendo relaxado e sabotado pelas autoridades federais, com cumplicidade cada dia mais explícita do grande empresariado, produzindo a conjunção trágica entre altas taxas de crescimento das mortes e dos novos casos, em um cenário de subnotificação generalizada. No país, o número de mortes e o número de casos estão dobrando a cada 11 dias, enquanto no mundo o número de casos dobra a cada 28 e o de morte a cada 29 dias. Somos já o segundo país com mais mortes diárias, o segundo país com mais novos casos diários (depois dos EUA, mas com número que rapidamente se aproximam e que não fosse a baixa testagem já estariam à frente dos EUA), o segundo país com o maior ritmo de crescimento de mortes (depois do México), o país com maior ritmo de novos casos diários, o segundo país do mundo com maior número de pacientes internados em estado grave (19% do total mundial, mesmo com números não atualizados há vinte dias).

Os Estados Unidos seguem com um elevado ritmo de aumento das mortes, ainda que com tendência de redução, estando em 34% em 14 dias, mantendo expressivo número de mortes diárias e inúmeros focos regionais, seguindo com aproximadamente um quarto do total de novos casos e do número de mortos do mundo. Itália e Espanha conseguiram reduzir a expansão dos novos casos a menos de 1% (0,7% e 0,4%), já tendo conseguido reduzir muito o número de novas mortes. Dividindo-se o período em duas semanas, temos que nos EUA o número médio de mortes por dia diminuiu levemente, de 1.634 para 1.439, na Espanha diminuiu de 197 para 155, na Itália diminuiu de 239 para 195, enquanto no Brasil subiu de 558 para 715 (5.007 mortes em sete dias). Nos últimos dias, o número de mortes no Brasil já foi superior a Espanha, Itália e França somados.

Outros países, situados na América Latina, África, Ásia e Oriente Médio, que ainda não estão entre os 15 primeiros em número de casos ou de mortes, vêm tendo crescimento bastante superior à média mundial, com situação se agravando rapidamente. Alguns tiveram crescimento do número de casos superior a 100% nos últimos 14 dias: Kuwait (2.99x), Gana (2.64x), Afeganistão (2.59x), Bangladesh (2.39x), Índia (2.28x), Chile (2.25x), Rússia (2.19x), África do Sul (2.12x), Catar (2.08x), Colômbia (2.05x), Arábia Saudita (2.04x) e Omã (2.03x). Dentre eles, Índia, Equador e  Rússia já estão entre os 20 países com mais mortes. 

É imprescindível e urgente reduzir o ritmo de crescimento do número de casos e do número de mortes no Brasil, pois a manutenção destes índices projeta um cenário cada vez mais terrível. Se por hipótese considerarmos que este ritmo se mantenha o mesmo (2.32 vezes em 14 dias), o número de mortes no Brasil atingiria 36.268 em 30/5, 84.143 em 13/6 e 195.211 em 27.6. Não se trata de uma previsão, mas de projeção do que pode ocorrer caso não sejamos capazes de diminuir radicalmente o atual ritmo. Para isto, são inadiáveis medidas muito mais rigorosas de isolamento social, associadas à garantia de efetivas condições de sobrevivência ao conjunto dos trabalhadores, em especial aos mais precarizados. Um pequeno aumento ou uma pequena diminuição no percentual produz um grande efeito em cascata nos números em dois ou três ciclos, o que reforça a urgência do reforço das medidas protetivas.