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BRASIL

Futuro do Pretérito: 7 pontos sobre o ocaso de Bolsonaro

José Mello*, de Ribeirão Preto, SP
Marcelo Casal Jr. / Agência Brasil

Jair Bolsonaro fala à imprensa no Palácio da Alvorada

1 – O governo Bolsonaro poderá cair nos próximos meses. Infelizmente, ao que parece, isso não acontecerá devido a mobilização popular e dos trabalhadores, os mais atacados e prejudicados em seus 16 meses de desgoverno. Sua sustentação dependia de três pilares: Paulo Guedes executor das políticas de superexploração da classe trabalhadora e destruidor do patrimônio público, Sérgio Moro que concedia o verniz “ético” e dos militares. O elemento Guedes perdeu serventia na medida em que a economia precisa ser socorrida pelo Estado e, uma visão liberal monocórdica como a de Guedes, passa a atrapalhar. O cerco realizado pelo STF e pelo STJ as ilicitudes de sua família levaram Bolsonaro a tentar blindar-se assumindo o controle da Polícia Federal. Para executar esta manobra foi necessário implodir o segundo pilar de sustentação, Moro.

2 – O Mercado está nervoso e buscando alternativas. Está claro que o modelito neoliberal em época de bancarrota não serve para nada. O capital quer o socorro do Estado e, nesse momento a alternativa disponível a instabilidade de Bolsonaro seria transferir o bastão ao vice Mourão. Para isso concorrem diversas frações da burguesia: o agronegócio, preocupado com os ataques do governo Bolsonaro a China, seu maior cliente. Parte do setor industrial ávido por novos subsídios e a burguesia paulista, ligada a Dória, Fernando Henrique e ao PSDB. Ou seja, dois dos três setores mais importantes da burguesia nacional, faltando apenas o setor financeiro – que Guedes ainda representa.

3 – As camadas médias que já o abandonavam devido ao terraplanismo usado no combate a pandemia, o repudiam devido a saída de Moro. Restaram os trolls, setor mais fascista e aguerrido, o bolsonarismo raiz. Algo entre 10% a 15% da sociedade – minoria. Pesquisa realizada pela XP no meio desta crise, indica que o apoio sólido ao governo está em 18% e a rejeição já chega a 49%. Os pequenos empresários que o apoiavam fervorosamente, já demonstravam dissenções devido a política de ajuda pífia implementada por Guedes, o aprofundamento da crise descola também esse setor.

4 – A esquerda tem defendido o Impeachment, PSOL, PT, PCB, PCO, PSTU, UP. O PCdoB também está aderido e a oposição burguesa já tem o PDT e a Rede engajados e deve trazer em breve o PSB. Centrais como CUT, CTB, CSP-Conlutas e as Intersindicais já chamam os panelaços. As Frentes Brasil Popular e Povo sem Medo estão se somando. Porém, essa concertação é ainda pontual e desordenada. A Frente Única da classe trabalhadora não consegue tomar forma, mas precisa. Uma saída a frio, por cima, como a renúncia ou o afastamento por um processo no supremo, darão muita força ao sucessor e tratarão apenas de critérios judiciais excluindo do debate a desastrosa política econômica e seus desdobramentos. É necessário que as organizações de esquerda se reúnam urgentemente e criem uma coordenação pelo afastamento de Bolsonaro. Essa coordenação deve ter expressão ao menos nas 500 maiores cidades do país, com um centro que produza a política e forneça comunicados comuns e a agenda de ações como panelaços, lives, shows virtuais, um PRIMEIRO DE MAIO que consolide esta unidade. Tal articulação deve lutar pela derrubada de Bolsonaro, mas também denunciar o que vem depois, apresentando um programa alternativo.

5 – O afastamento de Bolsonaro tem 4 hipóteses possíveis, a renúncia, o impeachment, um afastamento devido a processo no STF e a cassação da chapa. A renúncia parece ser o desejado pelos setores burgueses um acordo por cima no qual, como moeda de troca, sua família seria preservada de investigações, algo já insinuado em alguns artigos da mídia. Um processo no Supremo aberto após denúncia da PGR, seria uma alternativa que permitiria seu afastamento  por até seis meses, essa opção daria tempo para combater a pandemia e preparar sua saída, quer pela condenação no STF ou por um posterior processo de impeachment, mas após a denúncia esta opção precisa da aprovação de 2/3 da Câmara para prosseguir. Das possibilidades na mesa o impeachment, a mais ruidosa e propagandeada, apresenta o problema de ser muito demorada, sobretudo em época de pandemia e crise econômica e, por isso, uma hipótese ainda difícil de se concretizar. Também depende do apoio de 2/3 da Câmara e Bolsonaro se movimenta para garantir seu 1/3.  A cassação da chapa, possibilidade desejável e que deve ser o objetivo da esquerda, permitiria eleições gerais e dependeria da força das mobilizações populares e da mudança radical da correlação de forças. No momento essa é a hipótese menos provável. 

6 – O fator militar é o pilar que ainda sustenta o governo e aquele que poderia lhe dar algum fôlego, estendendo sua agonia para os momentos mais críticos da pandemia. As informações que aparecem na imprensa, bastante dispersas e contraditórias, indicam que os generais da ativa estão descontentes e que parte da cúpula militar do governo se sente traída e começa a perceber a impossibilidade de tutelar Bolsonaro. Mas por outro lado continuam ao lado do tenente, pois compartilham do apoio da mesma base social e não querem ser identificados como traidores para o futuro poder que vislumbram. A saída Mourão, é confortável para este setor que manteria o poder se livrando de um elemento estranho e instável, Bolsonaro e sua família miliciana. Seria o “sonho positivista” de um governo militar, institucional e tecnocrático e ainda com o apoio de uma base social. Riscos existem, a pandemia e o aprofundamento da crise econômica. Por isso se movimentam escanteando Guedes ao proporem plano econômico de inspiração keynesiana. Não desejam retornar precocemente à caserna ou aos sofás. Sabem, entretanto que esse risco é ainda maior com Bolsonaro. Por isso, a saída racional dos militares seria o empoderamento de Mourão um de seus pares, não muito amado, mas que poderia ser tutelado. Essa armação precisa ser construída com calma e dependerá da crescente pressão social que crescerá nos próximos dias reduzindo o apoio ao governo apenas ao seu núcleo mais duro. Existe munição pesada a ser compartilhada por Moro com a imprensa e órgãos do judiciário. Aos militares não interessa confrontação com Moro, precisarão do apoio dos lava jatistas em um possível governo Mourão. É certo que Bolsonaro não cairá sem que haja uma convergência de diversos setores da sociedade para derrubá-lo, a recente aproximação com setores do Centrão demonstra que a batalha será dura, mas as condições para sua derrota estão postas.

7. O cenário torna urgente, imprescindível, necessário que a esquerda consiga se unir, não apenas nas intenções, ou declarações de lideranças, mas nas ações que devem armar uma coordenação nacional que também se expresse em cada localidade importante do país. É necessário apresentar uma ALTERNATIVA DOS TRABALHADORES A SAÍDA INSTITUCIONAL QUE ESTÃO ARMANDO. Essa coordenação deveria ecoar pelas redes e sacadas do país o FORA BOLSONARO, mas também um programa ALTERNATIVO para a saída da atual situação catastrófica. Esse programa deve em primeiro lugar proteger a vida, mantendo a QUARENTENA, mas também precisa cobrar que os milionários paguem a conta da crise. Isso será possível com o estabelecimento de um programa permanente de renda mínima e com a cobrança progressiva de impostos sobre lucros e fortunas. A falta de articulação, inação e sectarismo, cobrarão um preço muito caro à esquerda no pós-Bolsonaro. Ainda há tempo. Precisamos agir.

 

* Militante da Resistência-PSOL

 

 

* O artigo representa as opiniões do autor e não necessariamente as opiniões do Esquerda Online. Somos um portal aberto às polêmicas da esquerda socialista.