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BRASIL

A fragilidade e o oportunismo do neoliberalismo: a Educação Pública resiste

Arnóbio Rodrigues de Sousa Júnior*, de Crateús, CE
Pexels.com

É sabido que o neoliberalismo é uma das fortes marcas políticas e ideológicas de nossos tempos de incertezas e de alijamento das políticas públicas e educacionais para os diversos eixos sociais, sobretudo no que diz respeito a educação superior, onde tem-se as universidades enquanto um dos principais espaços educativos de formação política, social e humana. Na atual conjuntura política e educacional de desmonte da coisa pública, bem como da tentativa de destituição das perspectivas democráticas de ensino no campo educacional, é visto os trâmites de inserção de uma pedagogia que converge com os objetivos da política neoliberal em detrimento do empreendedorismo da barbárie do sistema capitalista. 

Nas últimas décadas, mediante as lutas de resistência e (re) existência na educação pública de qualidade e frente a uma concepção pedagógica de libertação e formação crítica nos anos 2003 até 2015, assistimos o crescimento substancial da política educacional neoliberal por meio de um projeto político-conservador enraizado, hoje, nos projetos de um governo antidemocrático, avassalador da educação humanística. Em tempos de pandemia, torna-se explícito a fragilidade do neoliberalismo encrustado em uma dinâmica política para o capital. Indubitavelmente, essa ideologia política tem nos mostrado o quanto os seus objetivos são incapazes de pensar e propor a educação num sentido horizontal, democrático, plural, que possa assegurar ao educando uma educação que pense para além de uma visão propedêutica de mundo, afinal, o neoliberalismo é em si, uma política da seletividade, da exclusão e da dominação. 

 No que tange a atual conjuntura que presenciamos, é notório a incapacidade das políticas neoliberais educacionais quanto a incorporação do diálogo e da leitura epistemológica dos fatos que estão na tessitura da realidade. Sabe-se, no entanto, que essa política de suposições capitalista está alinhada a pedagogia da mordaça, de um partido único, o do autoritarismo, o qual discute a educação a partir de uma perspectiva vertical. É explícito que o projeto neoliberal de educação tem demonstrado esporadicamente o seu caráter político-pedagógico a partir das lógicas gerenciais em consonância com a ótica de órgãos multilaterais. Pensar a educação como um insumo econômico, negócio, é destituir a reflexão sociológica embasada numa formação filosófica política e a pedagogia freiriana de cunho social e político.

Infelizmente, esse pressuposto é incorporado no projeto político do atual governo que atenta a cidadania e os direitos sociais, tendo em vista a inconstitucionalidade de suas políticas que ferem a dignidade humana, em suma, dos indivíduos rotulados como periféricos. Sem dúvidas, os arautos da política educacional neoliberal defendidas fortemente pelas políticas do governo Bolsonaro, são os mesmos ideólogos que apoiaram a destituição da presidenta Dilma Rousseff em 2016. O neoliberalismo em tempos de pandemia tem demonstrado o quanto a atual política educacional do governo Bolsonaro não serve para a classe trabalhadora, pois não possibilita discutir temas que transcendem os espaços de vida e, tampouco possibilita a educação para a emancipação humana.

Contudo, no limiar da contradição entre capital e trabalho no sistema capitalista é possível efetivar práticas educativas emancipatórias que visam o empoderamento do sujeito. É necessário que nos reconheçamos enquanto sujeitos políticos. E daí, faz-se necessário que a dimensão social, política e individual do sujeito seja reconhecida pelas políticas de governo. O cenário de pandemia nos possibilita perceber criticamente as desigualdades expostas nas instituições superiores de ensino e intensificadas pelas políticas neoliberais. Assim, nota-se o oportunismo ideológico do neoliberalismo frente a educação pública de ensino superior que atende estudantes baixa renda, sendo a maioria indivíduos desassistidos pelas políticas de governo. O oportunismo da política neoliberal se dar com o objetivo de destruição do ensino presencial, público ao passo que tentam legitimar a educação EaD. 

Vê-se a construção de planejamentos educacionais num viés reacionário em busca da efetivação de um projeto político de educação que possa oferecer o ensino aos estudantes e as constantes narrativas ludibriosas em defesa da implantação da educação EaD. Essa visão limitada e reducionista está assentada na ótica da exclusão e do capital. Cabe destacar que, é insuficiente e anacrônico pautar um ensino a distância bem como propõe os ideólogos da privatização que estão ocupando cargos públicos de extrema importância para a educação pública alijando ações que são urgentes para o ensino público. Primeiro que os “marginais”, periféricos” e “subalternos”, rótulos políticos impostos e visto em nosso país de estrutura escravista como minorias sociais não tem acesso aos meios que possibilitem a educação a distância, que almeja em especial o lucro. É sempre bom lembrar que os estudantes da universidade pública estão, em muitas circunstâncias, localizados em um território literalmente invisibilizado pelas políticas sociais. 

Além disso, ainda somos um país marcado pelas intensas desigualdades sociais. A apropriação cultural entre alunos da rede pública e privada se direcionam em caminhos opostos. Por isso, as políticas neoliberais são tão frágeis quanto a educação ultrapassada do século XIX. A tentativa de derrubar o ensino superior público para instaurar o ensino a distância e privado parti da concepção da educação para o capital além da incoerência de leitura de mundo. Segundo que, essa lógica gerencialista da educação neoliberal em proveito do caos da pandemia do Coronavírus, reflete a não preocupação com o ensino humanístico, mas busca o amordaçamento do aprendiz uma vez que preocupa-se apenas com a emancipação política e o desenvolvimento do lucro empresarial que se instaura nesse projeto político-educacional. Por isso, pode-se afirmar que é uma educação para o capital. Nessa perspectiva, a educação é em mero instrumento de dominação bem como nos dizia Marx. 

O empreendedorismo da barbárie gerencial na educação de um governo neoliberal não reconhece as novas identidades que compõe os bancos da escola, haja vista que a educação está em constante mudança. Propondo uma analogia ao relembrar a música “velha roupa colorida” do nobilíssimo Belchior, o projeto de educação neoliberal que em proveito do isolamento social tenta se efetivar pedagogicamente, felizmente não nos serve como proposta educacional de formação cidadã, haja vista as mudanças significativas no campo educacional e no âmbito social, onde, no presente, a mente e o corpo é diferente. Assim como a velha roupa que não nos serve mais, a pedagogia neoliberal é uma pedagogia ultrapassada sem sentido para a formação de qualidade. Contudo, é de extrema importância dar vivacidade ao debate tendo em vista a inserção de suas epistemologias nos discursos da atual política neoliberal. É nesse sentido que o presente texto se justifica enquanto discussão acadêmica para além dos muros da universidade.

 Os objetivos da estrutura administrativa, pedagógica e política da educação neoliberal que defende a privatização do ensino não condiz com as reais perspectivas sociais do estudante baixa renda. Tomando o lugar de fala como ponto de partido, é afirmativo pontuar que essa proposta de educação financeira altera a matriz teórica de formação política da universidade pública comprometida com a formação social, política e humana. Em contraponto, a teoria lucrativa da educação neoliberal abona as perspectivas de emancipação do sujeito, tornando-o mais uma peça da engrenagem do capitalismo. A (re) colonização por meio da educação faz parte do projeto educacional neoliberal.

Nesse sentido, nesses tempos obscuros de pandemia do Coronavírus, não há dúvidas que o neoliberalismo é um sistema com reflexo as desigualdades sociais e oportunista ao passo que tenta massificar sua cultura política no ramo educacional. Partindo de uma leitura crítica com base nas perspectivas ontológicas do marxismo, ressalto que a pandemia do Coronavírus pode nos proporcionar um ponto positivo. Nos mostrou a tamanha fragilidade do neoliberalismo. Está nos mostrando esse processo material, desigual, explorador, ceifador das identidades rotuladas politicamente como periféricas e alijadas pelas políticas enraizadas no sistema para o capital. Como diz a companheira Sônia Guajajara, a educação é para nos curar e não para nos matar. Urge, portanto, uma educação digna embasada nos moldes da ontologia marxista e na pedagogia política e cultural de Freire. O debate precisa continuar!

 

* Estudante do curso de licenciatura em Geografia do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará Campus Crateús e militante do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). E-mail: [email protected]