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É preciso falar sobre os “partidos de aluguel” no Brasil

Crise entre Bolsonaro e PSL desnuda ainda mais a decadência do sistema político

Divulgação / PSL

Bolsonaro em evento do PSL, partido ao qual se filiou em janeiro de 2018 após passagens por outras oito legendas.

André Freire

Historiador e membro da Coordenação Nacional da Resistência/PSOL

Essa semana ganhou espaço na grande imprensa a crise envolvendo Bolsonaro e o seu partido, o Partido Social Liberal (PSL). A imprensa noticiou inclusive a declaração do presidente Bolsonaro ameaçando deixar este partido, que embalou seu projeto de poder nas eleições passadas, e levando ainda seus aliados mais fiéis.

Esta crise já se arrasta há alguns meses, e tem como um dos panos de fundo principais os escândalos dos “laranjas do PSL”, especialmente em Minas Gerais. Esquema que pode ter sido usado para “irrigar” com dinheiro ilegal, inclusive, a própria campanha presidencial.

A crise entre Bolsonaro e o PSL joga luzes em um debate importante: a proliferação de “partidos de aluguel” na política brasileira. Organizações que longe de se pautarem pela defesa de programas, projetos e propostas para o país, são na verdade empresas de fachada, para captar recursos públicos (fundo partidário e fundo eleitoral), além das doações de empresas (vigente até poucos anos atrás) e contribuições privadas de pessoas físicas.

O PSL é um típico partido de aluguel. Seu dono e presidente, Luciano Bivar (PSL-PE), o “alugou” para a família Bolsonaro em março de 2018, muito próximo ao prazo limite de filiações para concorrer a cargos públicos nas eleições do ano passado.

Mas, esta característica está longe de se restringir ao atual partido de Bolsonaro. Podemos afirmar que parte importante dos 32 partidos legalizados hoje no Brasil tem estas mesmas características, principalmente:

a – total ausência de perfil ideológico e programático;
b – pragmatismo radical, sempre ligado a interesses privados de grupos econômicos;
c- amplo envolvimento nas práticas espúrias da política brasileira – venda de voto, lobby de empresas e bancos, desvio de verbas públicas, alianças de ocasião, entre outras falcatruas.

São exemplos categóricos deste grupo de partidos: PSL, PTC, Podemos, DC, PRTB, Avante, Republicanos, PSC, PMB, PROS, Solidariedade, Patriota, entre outros. Ou seja, quase metade dos partidos existentes no Brasil.

No jogo do “toma lá da cá” que pauta as relações entre o Poder Executivo e a maioria do Congresso Nacional, estes partidos e seus parlamentares se tornam agentes diretos de interesses das distintas frações da classe dominante, muitas delas regionais, e também cumprindo o “papel sujo” de representar os interesses de setores mais lumpens da burguesia, como no caso das milícias, especialmente no Rio de Janeiro.

Eles são a banda mais podre de um sistema político em crise, marcado por características como o alto índice de personalismo na política; peso excessivo do lobby de corporações, como nos casos das chamadas bancadas da bala, do boi e da bíblia; e do apadrinhamento de filhos e parentes, próprio de uma sociedade ainda com baixo desenvolvimento cultural e educacional. Ou seja, são também produto do atraso do nosso país.

A esquerda não está imune

Embora a esmagadora maioria dos “partidos de aluguel” possa ser identificada como de direita ou extrema-direita, é uma ingenuidade pensar que este processo também não atinja partidos que se reivindicam de centro-esquerda ou até de esquerda, embora não mereçam de fato este nome.

Partidos como PDT e PSB, por exemplo, hoje, na prática, se tornaram, em muitos aspectos, legendas de aluguel, ou assumem boa parte de suas características. Estão também dominados por frações burguesas regionais e quando governam, assumem a mesma postura e práticas políticas de quaisquer partidos tradicionais da direita.

Embora tenham origem em projetos programáticos de setores da social-democracia e do trabalhismo brasileiro – origem esta que temos grandes divergências, mas merecem respeito – atualmente se degeneraram profundamente.

Basta ver as administrações que o PSB controla em Estados como Pernambuco e Paraíba. Ou, no fato de ser do PSB o ex-vice governador de São Paulo Márcio França, que conviveu muito bem com o tucano Alckmin durante dois mandatos.

Da mesma forma, com o governo do PDT no Amapá e a vinculação deste partido com o esquema do PMDB no RJ, especialmente nos governos de Cabral e Pezão, e também com sua aliança com Picianni na Assembleia Legislativa.

Para termos ideia, o último candidato do PDT ao Governo do Estado do RJ, Pedro Fernandes, virou secretário de Educação do governo de extrema direita de Wilson Witzel. E a atual pré-candidata do PDT a prefeitura do Rio de Janeiro, a deputada estadual e delegada Marta Rocha, foi a chefe da Polícia Civil quando o PMDB era governo do Estado, inclusive durante a repressão as manifestações de junho de 2013.

Não é à toa que vieram destes partidos muitos votos favoráveis a contrarreforma da previdência social, proposta por Bolsonaro e Guedes. E, vem daí também, a estratégia de Ciro Gomes (PDT-CE), que gosta de se apresentar como uma oposição “propositiva” e “responsável” ao governo Bolsonaro, querendo se distanciar da maioria da esquerda.

Partidos como estes não são aliados de fato na construção de um novo projeto político de esquerda no Brasil, que começa por ser uma oposição firme e convicta a este governo formado por uma extrema-direita neofascista.

O nosso caminho

Defendemos às liberdades democráticas dos ataques reacionários de Bolsonaro e de seu projeto neofascista. Mas, essa defesa não nos impede de nos pautarmos também por uma política que expresse uma mudança profunda e radical no atual sistema político.

É com a certeza da necessidade urgente do combate ao caráter deste sistema, que reivindicamos a aliança do PSOL com movimentos sociais combativos, como MTST e a APIB.

Acreditamos que uma alternativa efetiva ao fracasso do sistema político virá de uma nova frente política e social, que una ativistas da esquerda socialista e destes movimentos. Nossa saída é pela esquerda.

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