Valério Arcary, de São Paulo (SP)
As aparências enganam
(Sabedoria popular portuguesa)
Já são 20 pré-candidatos à Presidência em 2018. A lista deve diminuir em função de acordos para coligações, mas, por enquanto, é grande. Os critérios para a classificação dos candidatos são, evidentemente, polêmicos. De forma sumária, podemos dizer que se situam na extrema direita: 1. Bolsonaro (PSL) Partido Social Liberal; 2. Levy Fidelix (PRTB). No espaço da direita com um programa econômico-social liberal radical: 3. João Amoêdo (Novo); 4. Flávio Rocha (PRB); 5. Paulo Rabello de Castro (PSC); 6. Henrique Meirelles (MDB); 7. Fernando Collor de Mello (PTC). Na centro-direita conservadora: 8. Geraldo Alckmin (PSDB); 9. Rodrigo Maia (DEM); 10. Álvaro Dias (Podemos); 11. José Maria Eymael (PSDC). No centro, ou talvez em órbita do centro: 12. Marina Silva (Rede). Na centro-esquerda: 13. Ciro Gomes (PDT); 14. Joaquim Barbosa (PSB);15.Aldo Rebelo(Solidariedade). Na esquerda moderada ou reformista: 16. Haddad, ou outro nome do PT; 17. Manuela D’Ávila (PCdoB); 18. João Vicente Goulart (PPL), ou Pátria Livre. Na esquerda radical: 19. Guilherme Boulos (PSOL); 20. Vera Lúcia (PSTU).
Ao que parece, o PCO e o indefectível Rui Pimenta ainda não decidiram se irão apresentar uma candidatura. Provavelmente, sim. Potencialmente poderão ser, portanto, 21 candidatos, embora improvável.
A primeira evidência é que não existem vinte e um projetos políticos diferentes, portanto, a maioria destas vinte candidaturas não corresponde a vinte programas, e se explicam por outras razões. Uma enorme parte delas é social e politicamente artificial.
A segunda evidência é que esta pulverização de candidaturas é momentânea, e devermos assistir a negociações que poderão ou não resultar em coligações. Quem entre os pré-candidatos irão desistir? Serão quatro os critérios principais, na tradição da política burguesa no Brasil: (a) peso da biografia ou trajetória e força da representação social, ou seja, organicidade das relações de classe; (b) força do partido, ou seja, implantação nacional, candidaturas a governadores, possibilidade de eleição de senadores e deputados federais; (c) recursos financeiros, em especial, para o marketing; (d) tempo de televisão e rádio.
Considerada a atual relação social de forças estamos em situação defensiva, embora não tenha acontecido uma derrota histórica como em 1964. Em que medida esta situação política desfavorável irá se expressar na votação de outubro dependerá de uma luta político-social terrível. Uma luta pela consciência de cem milhões de eleitores que terá consequências graves. Na verdade, as eleições de primeiro turno são, neste momento, imprevisíveis. Isto posto, dez observações rápidas sobre a pesquisa DataFolha publicada em 15 de abril:
1. É possível que nem o PSDB, nem o PT cheguem ao segundo turno. Nas últimas seis eleições presidenciais, em 1994, 1998, 2002, 2006, 2010, e 2014, um intervalo de um quarto de século, prevaleceu um padrão de alternância entre dois campos políticos: PSDB e PT. Ele pode se repetir, mas o segundo turno está em aberto e pode ser, também, entre outros candidatos.
2. À excepção de Lula, nenhum candidato tem lugar garantido no segundo turno, e é possível, senão provável que uma votação um pouco inferior a 20% seja suficiente para colocar os dois candidatos melhor colocados no 2º turno. Lula não perdeu influência com a prisão, ao contrário, conquistou simpatia com a tática de “martirização”, inspirada no episódio da prisão de Chavez, e diminuiu sua rejeição. Já foi confirmado, em 2010 e 2014, um padrão de transferência de votos. Mas colocar Hadadd ou outro candidato do PT, no segundo turno, vai ser uma façanha difícil. Lula estará dentro de uma prisão. Mas é, sem comparação, a liderança mais influente no país. A defesa de seu governo terá muita audiência, quando em comparação com os últimos dois anos de goveno Temer. E qualquer candidato contra Bolsonaro tende a ser favorito em um segundo turno.
3. Surgiu uma extrema-direita com influência minoritária de massas, mas que já mantém relações de confiança com círculos minoritários da burguesia. A pesquisa revela uma consolidação do voto no neofascismo entre aqueles com renda mensal superior a dez salários mínimos. Vai ser necessária uma luta dura para que uma candidatura de centro-direita consiga impedir que Bolsonaro chegue ao segundo turno, em especial se conquistar o apoio de igrejas evangélicas. Uma parcela da votação acaudilhada, historicamente, pela candidatura do PSDB migrou. Bolsonaro terá somente quinze segundos de cada bloco de 12 minutos e meio de propaganda (serão seis blocos por semana, durante 35 dias de campanha). Mas com dez deputados do PSL Bolsonaro vai poder participar de debates na televisão. Já existe uma investigação da PGR que o criminaliza, mas não é ainda perceptível se será suficiente para desinflar sua expectativa de votação. Talvez sim, talvez não.
4. Alckmin é a candidatura mais orgânica da classe dominante, em especial de sua fração paulista. Este é o seu principal trunfo. Representa o projeto de levar até o fim o ajuste fiscal do Estado para atrair capitais estrangeiros e voltar a crescer. Mas se situa embolado no segundo pelotão, neste momento, apesar de ser conhecido por 85% dos eleitores do país. Terá que buscar alianças maiores para desobstruir o caminho. Ambiciona uma frente com o DEM de Rodrigo Maia, o PSD de Kassab, o PTB de Roberto Jefferson e Campos Machado, o PPS de Roberto Freire, e o Solidariedade de Paulinho da Força Sindical. Com essas siglas, o tucano ocuparia 4min27s de cada bloco da propaganda, pouco mais do que um terço do espaço total. As negociações são por ora inconclusivas, mas envolvem, também, Álvaro Dias, e o próprio MDB. Porque a pesquisa Data Folha confirmou que nem Temer nem Meirelles têm um mínimo patamar de votação competitiva.
5. Alckmin deverá pressionar, também, os candidatos do liberalismo radical que defendem o mesmo projeto, mas não têm, tampouco, votos: Amoêdo (Novo), Flávio Rocha (PRB), que é o Partido Republicano Brasileiro de Crivella, da IURD e de Edir Macedo, e Paulo Rabello de Castro pelo PSC (Partido Social Cristão). Além de Collor pelo Partido Trabalhista Cristão (PTC) que é o antigo Partido da Reconstrução Nacional (PRN)
6. Ciro Gomes herdou uma parcela dos votos do PT, mas essa dinâmica não está consolidada, porque a máquina do PT ainda não está em movimento. Por outro lado, disputa o espaço de centro-esquerda com a candidatura de Joaquim Barbosa, que se posicionou contra o impeachment de Dilma, e é duplamente favorecida pelo seu papel no mensalão, e pela imagem de um homem negro que nasceu nas fileiras do povo, e não fez parte da “velha” política.
7. Marina Silva se beneficiou da memória popular que se lembra de suas candidaturas em 2010 e 2014. Disputa o espaço do centro: nem de esquerda, nem de direita, contra a corrupção, e pela justica. Marina vive do recall, mas seu desempenho na luta e debate político é frágil. Um terço do eleitorado é muito fortemente “pró-Lula” e outro terço é muito “anti-Lula”. No um terço restante, Marina terá que disputar a votação moderada em condições difíceis, porque a Rede não tem capilaridade, seu tempo de TV e rádio será muito pequeno, e a maioria da classe dominante estará trabalhando para fazer de Alckmin o candidato da reconciliação nacional.
8. Manuela D’Ávila obteve um bom desempenho porque desperta simpatia na juventude e entre as mulheres, mas pode retirar antes do fim do primeiro turno.
9. Boulos expressa a luta social direta dos que não se dobram, nem se rendem, um povo sem medo. Representa um projeto independente da classe dominante e um programa radical de defesa das liberdades democráticas e dos direitos sociais do povo. Será porta-voz da reorganização da esquerda, diferenciando-se da candidatura do PT com a ideia chave de que não é possível “governar para todos”. Pontuou somente 1% porque é ainda pouco conhecido, mas é uma novidade como um líder popular de um movimento social autêntico; é muito inteligente e rápido e deve ganhar muito destaque nos debates; tem respeito entre os eleitores da esquerda, e a aliança do MTST com o PSOL pode abrir um caminho entre os trabalhadores organizados e na juventude com, provavelmente, a maior militância autêntica e engajada, e a intelectualidade de esquerda.
10. O aumento de votos nulos e brancos é, por enquanto, circunstancial, e responde ao desgaste da forma partido provocado pela LavaJato, e a impossibilidade legal da candidatura de Lula. Não se deve concluir que haverá um boicote “espontâneo” ao processo eleitoral. Tudo sugere que o desenlace político do processo aberto pelo impeachment deve passar pelas eleições.
Em resumo, a pesquisa foi uma foto antes de estarem definidos quais serão os times que vão entrar em campo, e qual a escalação. Tudo permanece imprevisível.
Na Espanha a primeira divisão do campeonato de futebol, conhecida como a Liga tem vinte clubes, mas a competitividade reduziu, há décadas, a disputa a três: Barcelona, Real Madrid e Atlético de Madrid. Na Inglaterra são quatro: dois de Manchester, o United e o City, e dois de Londres, o Chelsea e o Arsenal. Na Itália são três: Juventus, Internazionale e Milan. Em Portugal são três: Sporting, Porto e Benfica. Na Argentina já é diferente, e são pelo menos cinco os grandes: Boca Juniors, Independiente, Racing Club, River Plate e San Lorenzo de Almagro. Isso sem considerar outros cinco como o Lanús, Rosário Central, Estudiantes de La Plata, Velez Sarsfield, Newell´s Old Boys, que podem ser competitivos. No Brasil são doze times. Quatro de São Paulo, quatro do Rio de Janeiro, dois de Minas e dois do Rio Grande do Sul. O Brasil é muito grande e muito complicado.
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