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BRASIL

O mecanismo é outro. Cinco coisas que a série da Netflix não conta

Por: Ademar Lourenço*

É besteira cancelar a Netflix. A série “O mecanismo” do diretor José Padilha não é exatamente um “manifesto fascista” como parte da militância do PT fala. Na verdade, até compensa ver a série, mas com um olhar crítico.

Ao contar a história de um grupo de policiais que participam da operação Lava-Jato entre 2013 e 2014, o diretor mistura ficção com realidade de maneira irresponsável e acaba fortalecendo alguns mitos sobre a operação. Apesar disto, o seriado mostra um equilíbrio bem maior que o filme “Polícia Federal – a lei é para todos”, que passou nos cinemas no ano passado.

O maior problema da série  é que ela reforça o mito de que a operação Lava-Jato desvenda o “mecanismo” que faz com que o Brasil seja um país corrupto. É aí que entra a falha. A operação Lava-Jato de fato nunca foi fundo no verdadeiro “mecanismo” que atrasa o Brasil. Vejamos algumas coisas que nunca foram contadas em uma série da Netflix e não foram investigadas por operações da Polícia Federal:

1 – O desvio de 10 bilhões da Petrobras é um absurdo. Mas é um troco se comparado ao quase um trilhão dado aos bancos todo ano para o pagamento da dívida pública. Esta dívida nunca passou por uma auditoria, como manda a Constituição. Esse repasse sim, é o grande “mecanismo”, de acordo com a ex-auditora da Receita Federal Maria Lúcia Fattorelli, que viaja o mundo estudando o tema.

2 – Calma que tem mais “mecanismo”. Todo ano mais de 500 bilhões de reais em impostos deixam de ser pagos. Quem dá este calote em sua maioria são os grandes empresários. Segundo a CPI da previdência, os empresários devem mais de R$ 450 bilhões ao INSS e R$ 56 bilhões são perdidos todo ano da autarquia por causa de fraudes. Esses desvios nunca foram investigados por nenhuma Lava-Jato.

3 –  Quem mais lucrou com a bagunça política gerada pela Lava-Jato foram os bancos e os investidores internacionais. O governo que tomou posse depois do impeachment de Dilma promoveu a aprovação da PEC 55, que retira dinheiro dos gastos sociais para aumentar o pagamento aos bancos. Também são os bancos os maiores beneficiários da reforma da previdência que Temer tentou fazer. Isto porque a venda de planos de previdência privada gera bilhões a eles. Os bancos estão entre os maiores financiadores de campanha do país, mas nunca foram investigados. As multinacionais do petróleo também ganharam: receberam de presente a exploração do pré-sal  e um trilhão de reais em isenção de impostos.

4 – Já em 2014 havia manipulação política das denúncias da Lava-Jato. Em maio daquele ano, o canal “TV Revolta” teve o maior crescimento mundial do Facebook. Esse crescimento foi claramente pago, mas até hoje não se sabe quem bancou isto. O canal foi o primeiro que lançou a moda de espalhar boatos e usar um discurso de ódio irracional para mostrar que o PT era o grande problema. Antes disso, grupos de juventude financiados por grandes empresas já atuavam no país. Esses dois fenômenos antecederam os atos que pediram o impeachment da presidente Dilma em 2015. O resultado foi Temer assumir o poder em 2016.

5 – A série até mostra as articulações de Michel Temer para tomar o poder. Mas não mostra para quem ele iria governar. Meses antes do impeachment, Temer lançou seu programa de governo, chamado “Ponte para o Futuro”.  No documento, ele se comprometeu a fazer um governo 100% comprometido com os bancos e as grandes empresas. Foi na mesma época em que os movimentos que antes gritavam “Fora Dilma e Temer” começaram a gritar apenas “Fora Dilma”. Entre as promessas estava a retirada de direitos trabalhistas, que ele realmente promoveu em 2017.

*Esse artigo representa as posições do autor e não necessariamente a opinião do Portal Esquerda Online. Somos uma publicação aberta ao debate e polêmicas da esquerda socialista