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EDITORIAL

Rio de Janeiro: a crise é a nova normalidade

Editorial de 13 de outubro,

O Rio de Janeiro é a imagem concentrada do cenário nacional. É talvez a mais aguda combinação da crise econômica, política e social. A decadência que se vê por todos os lados é o verdadeiro “legado olímpico”. O esgotamento do modelo baseado na indústria do petróleo e nos estímulos fiscais quase ilimitados é patente.

Do ponto de vista político, a situação do governo Pezão (PMDB), apadrinhado de Sergio Cabral, é análoga, em muitos sentidos, a de Temer. O governo estadual tem índices de rejeição abaixo do volume morto, está inteiramente comprometido pelos escândalos de corrupção e há meses não demonstra a mínima capacidade de iniciativa. Ainda assim, não parece lhe incomodar a missão de seguir semi-vivo até as eleições de 2018. A crise no Rio é assumida pela casta política como a nova normalidade.

É nesse contexto que os atrasos nos vencimentos do funcionalismo, por exemplo, deixaram de ser uma condição de exceção para se tornarem o novo padrão. A asfixia da UERJ, principal universidade do estado, igualmente deixa de ser efeito indesejado do caos econômico e administrativo e ganha contornos de projeto. Até mesmo deixar de oferecer ensino de graduação é posto em pauta como “saída”.

Por sua vez, os efeitos sociais da crise são devastadores. O desemprego atingiu 15,7% da população economicamente ativa em setembro, segundo o Ipea, e vem em viés de alta constante há vários trimestres. Em seu conjunto, os serviços públicos fluminenses operam em um novo patamar de degradação, quer na saúde, na educação ou nos transportes. A percepção de que a vida está mais difícil beira a unanimidade.

Com todas as contradições sociais piorando, a violência urbana não poderia deixar de se agravar. A recente ocupação militar da Rocinha demonstrou, uma vez mais, o ciclo vicioso da chamada “guerra às drogas”. Há um processo de reorganização de grupos do crime organizado, ao passo que a desastrosa intervenção do estado, agora com o padrão de ocupação de comunidades pelas Forças Armadas, atinge ainda mais a população trabalhadora e negra das favelas.

Enquanto concorriam na Rocinha a tirania do crime organizado e o terror de estado via polícia ou Exército, chamou atenção a paralisia da prefeitura. Marcelo Crivella permaneceu ausente durante todo o dia de horror na maior favela carioca, só vindo a se pronunciar, da forma mais genérica possível, durante a noite. Seu sumiço desgastou sua imagem, que começa a se desbotar ainda em seu primeiro ano de mandato.

O prefeito-bispo vem buscando reorientar sua localização em direção a uma posição mais abertamente alinhada com a nova direita. Seja provocando dificuldades à preparação do Carnaval ou aos eventos culturais de rua, Crivella toma parte na ofensiva conservadora nos costumes e não perdeu a oportunidade colocar obstáculos à mostra Queermuseu no Museo de Arte do Rio, que foi censurada em Porto Alegre.

Não há perspectiva de melhora na situação de crise do Rio que não passe pelas lutas de resistência na capital e no estado. São muitas as mobilizações, embora ocorram atomizadas. Processos como a luta em defesa da Uerj, as greves e lutas dos trabalhadores da saúde pública e as lutas do setor de cultura precisam ser coordenadas e ganhar a forma de um enfrentamento unificado contra Pezão e Crivella. A resistência existe e é heróica, mas é ainda insuficiente diante da tragédia que se tornou o Rio. A jornada em defesa da educação pública, que está convocando manifestação unificada na Uerj, para o dia 19 de outubro, pode ser uma iniciativa de importância no sentido de retomar as ruas.