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EDITORIAL

Economia mundial: Retomada?

Por Michael Roberts, 19/08/2017

Tradução de Caio Dias Garrido

Os últimos dados econômicos mostram que o crescimento da economia nos principais países capitalistas foi retomado na primeira metade de 2017.

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A economia do Japão cresceu no maior ritmo dos últimos dois anos entre abril e junho, com a aceleração do consumo interno enquanto o país se prepara para as olimpíadas de Tóquio em 2020.

 

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Na zona do Euro o crescimento do PIB aumentou a uma taxa de 2,5% ao ano, tendo os países do grupo de Visegrád (República Tcheca, Polônia, Hungria e Eslováquia) crescido 5,8% no segundo trimestre deste ano.

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Tendo a economia americana crescido lentamente, pouco mais que 2% ao ano, as maiores economias parecem estar melhor no que toca ao crescimento, ao menos quando comparadas à queda da taxa de crescimento de 2015-6.

Qual seria a razão para esta ligeira melhora? Ao meu ver, é a relativa recuperação da economia Chinesa, considerada pela maioria dos observadores, pelas evidências, como o carro chefe do crescimento da economia mundial (na periferia) desde 2007. Como apontou o FMI na última pesquisa sobre a economia chinesa, “enquanto as várias economias avançadas do ocidente se debatiam nos anos subsequentes à crise econômica mundial de 2007-09, a China atuou como o  motor da economia global,  sendo responsável por mais da metade do crescimento do PIB mundial nos últimos anos.”

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A produção industrial na China cresceu 6,7% em julho em níveis anuais, continuando uma leve recuperação em 2017 depois de atingir o ponto mais baixo em 2016 após o ápice acima de 11% ao ano em 2013. Como resultado, a produção industrial na Eurozona cresceu, particularmente na Alemanha, Holanda e Itália à medida que estes exportaram mais para China. Nos EUA a produção industrial também reverteu sua queda em 2016. Já no Japão, o setor deu um salto de 6,7% comparado a 2016, em função da demanda de obras para as Olimpíadas.

Tudo parece estar bem melhor. Mas devemos nos lembrar que a maioria destas grandes economias ainda estão crescendo por volta de 2% ao ano, ainda bem abaixo do que eram as taxas antes de 2007 ou mesmo da média comum do período pós 1945. As economias de capitalismo “desenvolvido” estão em seu menor crescimento em décadas. Ruchir Sharmar, um estrategista global, chefe da equipe para mercados emergentes na gerência de investimentos da Morgan Stanley, observou em um recente ensaio na  revista “Foreign Affairs que, “nenhuma região do mundo está crescendo tão rápido quanto antes de 2008, e nenhuma deve esperar por isto. Em 2007, no auge do boom pré-crise, a economia de 65 países – incluindo muitos grandes, como Argentina, China, Índia, Nigéria, Rússia e Vietnã – cresciam a uma  taxa de 7% ou mais. Hoje apenas seis economias crescem assim, e a maioria delas é de países pequenos como Costa do Marfim e Laos”.

Ainda assim, todas os índices de gerentes de compras, que fornecem o melhor guia de “alta frequência” para a atitude e a confiança da burguesia de cada país, mostram que o crescimento ainda está se consolidando – ao menos no ritmo de 2013-14. Novamente a chave é a recuperação do PIB chinês.

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O que tudo isso nos diz sobre as probabilidades ou prognósticos de uma nova recessão econômica global nos próximos dois anos? Algo pelo qual eu esperava ou previa. Os dados mais recentes não parecem apontar para isto.

Os principais analistas se mantêm otimistas sobre o crescimento, com a condição de que a China não entre em colapso. Pesquisas do FMI usam o conhecido argumento de que a dívida [chinesa] total é tão grande que vai eventualmente levar à falência e ao calote, produzindo uma profunda recessão e o enfraquecimento da economia mundial. A dívida total quadruplicou desde a crise financeira e chegou a 28 trilhões de dólares no fim do ano passado.

Eu discordo, por duas razões. A primeira, quando o crescimento chinês diminuiu bruscamente no início de 2016, os analistas tradicionais argumentaram que a China poderia derrubar a economia mundial. Eu opinei que apesar de quão importante fosse a economia chinesa não seria suficiente para derrubar as economias americana e europeia. Estas economias avançadas ainda são fundamentais para haver ou não uma depressão. E isto se provou.

Segundo, o tamanho da dívida chinesa é grande, mas a economia chinesa é diferente das grandes economias capitalistas. A maior parte desta dívida foi feita pelos bancos e empresas estatais. O governo chinês pode resgatar essas entidades usando suas reservas e  confiscar as poupanças das famílias chinesas. O Estado tem o poder econômico para fazer isto, diferente dos EUA e da Europa durante a crise de crédito de 2007. Naquele momento os governos eram os que deviam aos bancos e companhias, não o contrário. Então, qualquer crise de crédito na China será resolvida sem um colapso maior da economia, ao meu ver.

Isso significa então que uma nova recessão está descartada? Não, de forma alguma. Um dos indicadores-chave que uso para ver a saúde das economias capitalistas, como os leitores deste blog bem sabem, é a movimentação de lucros do setor capitalista. O lucro das empresas em nível mundial (uma média ponderada das maiores economias) também teve uma recuperação significativa depois do colapso no final de 2015. Certamente, o lucro total das corporações parece crescer na mais rápida taxa desde a recuperação que houve após o fim da Grande Recessão.

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Mas esta cifra geral é conduzida pela recuperação chinesa e pela retomada no Japão (devido às obras para as Olimpíadas?). O crescimento do lucro de grandes corporações nos EUA, Alemanha e Reino Unido está novamente diminuindo após a rápida retomada no fim de 2016.

Para mim, o cerne ainda é a saúde da economia americana e, em particular, seus lucros e investimentos.   A alta do mercado de ações americano destoa dos níveis de ganhos das grandes empresas. O ajuste cíclico de preços e ganhos da S&P 500 só foi maior em uma ocasião, no final da década de 90. Está atualmente igual aos níveis que precederam a Grande Depressão.

Os lucros das grandes empresas americanas se recuperou nos últimos trimestres depois de terem caído (embora agora estejam novamente desacelerando), e, junto disso, os investimentos em negócios melhoraram. Veremos se isto se sustenta no decorrer de 2017.

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O total dos lucros da economia doméstica americana cresceu em uma taxa anual de apenas 0,97% nos últimos 5 anos. Antes deste período, o crescimento quinquenal foi de 7,95%. Com 8,6 trilhões de dólares o nível da dívida empresarial é 30% maior hoje do que no pico anterior, em setembro de 2008. Em 45,3%, a razão entre a dívida empresarial e o PIB atingiu um pico histórico, tendo recentemente ultrapassado os níveis que precederam as duas últimas recessões. Se há um problema nos níveis da dívida, este é um problema americano, não Chinês.