Por Fábio José de Queiroz, de Fortaleza, CE
Nos dias sombrios que correm, nos quais os programas se afogam e as práticas se desvirtuam, não deixa de ser iluminadora a proposição de se discutir as questões do país em uma perspectiva programática que aponte “para além” do quotidiano cinza de um tempo em que certo presidente sem voto encabeça a destruição dos direitos sociais.
É assim que devemos localizar a iniciativa da Frente Povo Sem Medo de impulsionar uma “ampla agenda de debates” com o intuito de elaborar um programa que abarque “nossas necessidades e desejos”.
De imediato, forças as mais díspares voltam sua atenção para esse chamado que, de certo modo, começa a dividir águas na esquerda brasileira. De um lado, um setor da esquerda torce o nariz e trata com desdém a iniciativa.
De outro, uma parte parece vislumbrar a possibilidade de discutir as grandes questões do país sem sair do lugar.
Entre o ceticismo e a mesmice, eis as duas pontas de um fio no qual a esquerda socialista se equilibra perigosamente. Mas quem há de caminhar por um fio sem sentir a vertigem do perigo?
A questão é se é possível ter qualquer saída coerente por dentro de uma democracia apodrecida ou se é necessário ir além dos seus limites. Nesse sentido, pode-se, seriamente, cogitar uma democratização da economia? Navegar nos limites dessa estratégia não é andar em círculo e se solidarizar unicamente com os ajustes em pequena escala?
Depois de três décadas de uma democracia burguesa, com seus “males e dores temporais”, não é hora de começar a pensar como enfrentar o último combate ainda em vida? Até quando adiaremos a discussão de uma proposta programática que não tenha como ponto limite a democratização da economia? A experiência de quase uma década e meia da frente popular, no Brasil, não indica que, mais do que poderosa, essa ideia de democratizar a economia do capital é visceralmente perigosa para a esquerda?
São muitas as perguntas. De qualquer modo, qualquer boa discussão é quase sempre o resultado de indagações que cobram respostas. Indagações que afloram da necessária análise de uma realidade sobre a qual se atua, e, principalmente, se almeja mudar. Aqui está o desafio. As especificidades de uma situação política difícil para classe trabalhadora não pode ser argumento para se confinar os debates nos limites impostos pela democracia do capital mascarada de democracia sem sobrenome. Inversamente, é preciso pensar mais adiante de seus territórios e fronteiras.
Comentários