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BRASIL

Lutar não é crime!

Site O cafezinho

Por: Carlos Zacarias de Sena Júnior, de Salvador, Bahia

 Na última terça, 17, mais um episódio de reintegração de posse regado a violência virou manchete. Os motivos, contudo, não são os usuais. A truculência policial e o absurdo despejo de 700 famílias e três mil pessoas, que tiveram suas casas derrubadas após decisão judicial sobre um terreno abandonado ocupado há mais de um ano em São Paulo, repetiram as cenas da nossa barbárie cotidiana. No Brasil, segundo o censo de 2010, há mais casas vazias do que famílias sem-teto, mas a nossa secular desigualdade insiste em perpetuar a lógica que determina que uma parcela significativa de brasileiros deve morar em condições precárias ou viver em situação de rua.

Por conta desse dado alarmante, surgiram movimentos em defesa da moradia e dos sem-teto no país, cujo Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), de São Paulo, é um dos mais importantes. No episódio, Guilherme Boulos, um dos principais dirigentes do MTST, foi preso junto com o pedreiro desempregado José Ferreira Lima. Segundo informações da imprensa, no boletim de ocorrência consta que houve “resistência” por parte do líder dos sem-teto. Também é citada a teoria do domínio do fato, a mesma que foi utilizada contra José Dirceu no caso do mensalão. De acordo com esta teoria, uma pessoa pode ser responsabilizada por atos sob sua influência, mesmo que não tenha sido ela a praticar o delito. O problema é que o único “delito” havido na desocupação foi o de resistência à violência perpetrada pela polícia, que utilizou balas de borracha, jatos d´água e bombas de gás lacrimogênio, inclusive contra crianças e idosos. Então a resistência não foi individual, mas coletiva e organizada, algo que vem a ser um direito inscrito em nossa Constituição.

Ocorre que Boulos não foi detido apenas pela suposta “resistência” ou por ter lançado rojões contra os policiais, o que ele nega que tenha feito. Libertado no mesmo dia, junto com José Ferreira, o dirigente do MTST foi saudado pelos ativistas dos movimentos sociais que faziam vigília na porta do 49º DP. Interpelado por jornalistas que o aguardavam, Boulos afirmou que sua prisão teve motivação política e se deu pelo “conjunto de sua obra”. Segundo disse, o capitão que conduziu a detenção teria afirmado que o líder do MTST vinha sendo monitorado em suas atividades, inclusive pela participação em uma manifestação na porta da casa de Temer.

O fato é grave, mas não diria que o comandante da operação possa ser tomado como o personagem referido por Pedro Aleixo para justificar seu voto contra o AI-5, quando alegou não ter medo das “mãos honradas do presidente”, mas do “guarda da esquina”. Todavia, pelo andar da carruagem, poderemos estar caminhando para um estado de exceção, situação em que o simples ato de resistir ao arbítrio será tomado como atentado à ordem e à segurança pública.