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MUNDO

Albert Einstein, o Socialista Pró-Palestina

Como o renomado físico começou como sionista, mas acabou se opondo à ocupação da Palestina, e por que todos preferem falar sobre sua ciência do que sobre sua política.

Billie Anania, com tradução de Davi Nunes de Carvalho

Além de revolucionar o campo da física teórica, Albert Einstein era um ávido escritor de cartas. Seja oferecendo conselhos cuidadosos a líderes mundiais ou enviando missivas incisivas a jornais mainstream, o renomado físico era um comunicador ardente e influente. Regularmente opinando sobre questões proeminentes de seu tempo, sua correspondência escrita revela uma radicalização gradual moldada por momentos decisivos na história do século XX. Einstein era, de fato, decididamente um socialista.

O legado de Einstein, no entanto, foi em grande parte despolitizado. Isso se dá pelos motivos esperados; universidades e museus ocidentais frequentemente optam por retratar figuras históricas de esquerda como Helen Keller, Mark Twain, Martin Luther King, Jr. e Pablo Picasso dentro de um enquadramento pró-capitalista. No caso de Einstein, há outros fatores em jogo: para começar, ele era um proeminente intelectual judeu que começou como sionista, mas acabou fortemente oposto à ocupação israelense da Palestina. Seus arquivos—preservados online e em Jerusalém—detalham sua tomada de consciência não apenas da situação dos palestinos, mas também da violência do colonialismo e do capitalismo global como um todo.

Essa tomada de consciência coincidiu também com seu apoio à libertação negra, e ele fez amizade com figuras revolucionárias negras como Paul Robeson e W.E.B. Du Bois. Quando Du Bois foi acusado de ser um espião comunista, Einstein lutou para que a investigação fosse arquivada. Esses eventos levariam o FBI a manter um arquivo sobre Einstein totalizando mais de 1.400 páginas.

Nenhum desses são fatos convenientes para uma cultura política ocidental que preferiria lembrar Einstein como um nerd de física distraído com um sotaque esquisito e cabelo engraçado que murmurava muitas truísmos apolíticos (muitos dos quais ele nunca disse realmente). Mas sua jornada para o socialismo ainda é muito digna de exame, assim como seus escritos políticos profundamente interessantes, especialmente quando se trata da Palestina.

Einstein, que lia e pensava sobre muito mais do que apenas física, co-fundou o Partido Democrático Alemão em 1918. Na época, ele era um defensor ativo de uma pátria judaica na Palestina. Esse sionismo inicial de Einstein, no entanto, precisa ser visto no contexto da experiência judaica na época. Einstein pessoalmente enfrentou insultos antissemitas após receber o Prêmio Nobel de Física de 1921, com outros dois vencedores alemães do Nobel rotulando seu trabalho como “ciência judaica”. Em 1922, Einstein e sua esposa Elsa viajaram para vários países, incluindo Estados Unidos, Japão e Palestina—em parte para que Albert pudesse dar palestras sobre suas teorias da relatividade, mas também para escapar dos temores de violência antissemita. Seu amigo Walther Rathenau, um político judeu-alemão e ministro das Relações Exteriores da República de Weimar, foi assassinado pouco antes de sua partida. Um grupo paramilitar de extrema-direita chamado Organização Consul assumiu a responsabilidade pelo assassinato de Rathenau, e muitos de seus membros acabariam servindo na Schutzstaffel (SS) nazista.

Os Einsteins voltariam para a Alemanha por mais uma década, apenas para serem forçados a fugir em 1933 sob ameaça de assassinato. Hitler acabara de chegar ao poder, e Einstein tinha sido um oponente aberto das políticas nazistas. Jornais alemães leais ao novo regime afirmavam que Einstein estava espalhando propaganda comunista, enquanto as forças governamentais queimavam seus documentos de pesquisa e confiscavam as contas bancárias dele e de Elsa. Os Einsteins buscaram refúgio primeiro no campo inglês e depois em Princeton, Nova Jersey, onde viveram seus dias restantes.

Novamente, é dentro desse contexto que o sionismo inicial de Einstein deve ser entendido. Enquanto na Palestina, os Einsteins—hospedados por líderes sionistas em parceria com a Grã-Bretanha—conheceram vários líderes políticos judeus e árabes, viajando para Tel Aviv, Jerusalém e Haifa, bem como vários assentamentos agrícolas. Essa turnê deixou uma profunda impressão em Albert, resultando em anos de apoio sionista. Uma carta ao Manchester Guardian em 1929 o encontra aplaudindo o “calibre intelectual e moral” dos primeiros colonos. Sempre moralista, Einstein desenvolveu uma justificação ética com base em séculos de despossessão judaica. Embora ele pudesse ter se oposto ao colonialismo em outros lugares, ele exibiu uma compreensão bastante limitada do fato de que um estado israelense significaria necessariamente a colonização da Palestina.

O ato de fugir da ocupação nazista 11 anos depois, no entanto, mudou as visões de Einstein sobre o assunto. Ele interpretara o sionismo pré-1948 no espírito dos profetas hebreus, que advogavam por chesed—uma palavra que representa amor entre pessoas e piedade para com Deus. Seu artigo de 1938 intitulado “Por Que Eles Odeiam os Judeus?” discutiu o “elo que tem unido os judeus por milhares de anos, e que os une hoje… o ideal democrático de justiça social, aliado ao ideal de ajuda mútua e tolerância.” Essa concepção da natureza fundamental do judaísmo estava em desacordo, Einstein percebeu, com o projeto colonial sionista pós-1948, que continha elementos do preconceito e nacionalismo dos quais ele acabara de escapar. Naquele mesmo ano, em um discurso dado ao Comitê Nacional do Trabalho para a Palestina na cidade de Nova York, ele explicou seu medo do que um estado sionista significaria para a alma judaica:

“Além das considerações práticas, minha consciência da natureza essencial do judaísmo se opõe à ideia de um estado judeu com fronteiras, um exército e um grau de poder temporal, não importa o quão modesto. Eu tenho medo do dano interno que o judaísmo sofrerá, especialmente pelo desenvolvimento de um nacionalismo estreito dentro de nossas próprias fileiras, contra o qual já tivemos que lutar sem um estado judeu. Não somos mais os judeus do período dos Macabeus. Um retorno a uma nação no sentido político da palavra seria equivalente a se afastar da espiritualização de nossa comunidade que devemos ao gênio de nossos profetas.”

Neste ponto, Einstein ainda era sionista em um sentido: ele ainda apoiava uma pátria para judeus na Palestina, mas apenas um onde eles pudessem coexistir pacificamente com os palestinos, não um estado etno-judaico. Esse estado etno-judaico nasceu, no entanto, em maio de 1948, e em uma carta de dezembro de 1948 ao New York Times, Einstein e mais de 20 outros intelectuais judeus expressaram preocupação com a visita planejada do político ultra-sionista Menachem Begin aos Estados Unidos, alegando que o partido de Begin, Herut (ou o “Partido da Liberdade”, antecessor do nacionalista de extrema-direita Likud), estava promovendo “uma mistura de ultranacionalismo, misticismo religioso e superioridade racial.”

O próprio Begin tinha uma história particularmente feia: ele estava intimamente associado à organização paramilitar Haganá e havia ascendido nas fileiras do grupo terrorista sionista Irgun, que ganhou reputação por atacar as autoridades do Mandato Britânico na Palestina. Irgun e a Gangue Stern, liderados por Yitzhak Shamir, também assassinaram centenas de palestinos no massacre de Deir Yassin em abril de 1948. “É inconcebível”, disseram Einstein e outros na carta ao Times, “que aqueles que se opõem ao fascismo em todo o mundo, se devidamente informados sobre o registro político e as perspectivas do Sr. Begin, pudessem acrescentar seus nomes e apoio ao movimento que ele representa.”

Begin e Shamir mais tarde se tornariam primeiro-ministros por múltiplos mandatos; o tipo de nacionalismo violento e racista que Einstein criticou era parte fundamental e aceita da política israelense. Em 1952, o primeiro-ministro David Ben-Gurion ofereceu a Einstein a presidência de Israel após a morte de seu primeiro presidente, Chaim Weizmann. Entre as razões de Einstein para rejeitar a oferta estava o fato de que ele teria que “dizer ao povo israelense coisas que eles não gostariam de ouvir.” Essas “coisas” provavelmente incluíam a crença de Einstein de que a ocupação da Palestina era fundamentalmente antitética à natureza do judaísmo.

Além de sua crença na imoralidade da ocupação, Einstein também parecia acreditar que ela seria insustentável a longo prazo. Como evidência, veja um artigo recente para o Middle East Monitor, onde Yvonne Ridley aponta outra carta de 1948 que Einstein escreveu para os American Friends of the Fighters for the Freedom of Israel (Amigos Americanos dos Lutadores pela Liberdade de Israel). O grupo havia escrito para Einstein solicitando sua ajuda para legitimar o estado de Israel após o massacre de Deir Yassin. Em um telegrama curto, Einstein respondeu: “Quando uma catástrofe real e final nos atingir na Palestina, o primeiro responsável por isso será o britânico e o segundo responsável por isso serão as organizações terroristas formadas de nossas próprias fileiras. Eu não estou disposto a ver qualquer pessoa associada a essas pessoas enganadas e criminosas.”

Ridley argumenta que essa condenação abrupta funciona como uma previsão do eventual declínio de Israel. “O cientista judeu mais famoso da história sabia desde sua concepção sangrenta que um Israel criado e administrado por fanáticos armados de direita não era viável”, ela observou. “Não deveria ter sido necessário um gênio para nos dizer isso.”

Nos últimos anos de sua vida, expandindo-se a partir de suas visões em relação a Israel, Einstein argumentaria que o colonialismo gera fascismo, e o capitalismo prospera com o sacrifício humano. Essas ideias são melhor expressas em seu ensaio intitulado “Por que Socialismo?”, que apareceu no primeiro número da revista socialista independente Monthly Review. No ensaio, ele argumentou que o mundo desenvolvido existe em grande parte devido à “conquista” e que a economia ocidental se sustenta fabricando consentimento. Como ele escreveu:

“A anarquia econômica da sociedade capitalista como ela existe hoje é, em minha opinião, a verdadeira fonte do mal. Vemos diante de nós uma enorme comunidade de produtores cujos membros estão constantemente se esforçando para privar uns aos outros dos frutos de seu trabalho coletivo—não pela força, mas em conformidade fiel com regras legalmente estabelecidas. Neste aspecto, é importante perceber que os meios de produção—ou seja, toda a capacidade produtiva necessária para produzir bens de consumo, bem como bens de capital adicionais—podem legalmente ser, e na maior parte são, propriedade privada de indivíduos.”

Ele então levou essas afirmações um passo adiante, afirmando que a “sociedade socialista do futuro” deve avançar além dessa “fase predatória do desenvolvimento humano.” A ciência pode introduzir novas ideias e os meios de alcançá-las, disse ele, mas não pode “criar fins”, demonstrando assim ser insuficiente quando se trata de resolver questões sociais. “Por essas razões”, argumenta ele, “devemos estar atentos para não superestimar a ciência e os métodos científicos quando se trata de problemas humanos, e não devemos assumir que os especialistas são os únicos que têm o direito de se expressar sobre questões que afetam a organização da sociedade.”

Esta é uma afirmação significativa para um cientista trabalhando dentro de um discurso que exalta a supremacia da objetividade, e ela se opõe radicalmente aos neoliberais contemporâneos que promovem seu compromisso com a ciência enquanto se opõem a uma reestruturação radical da sociedade. A suposição subjacente por parte deles é que a ciência deve trabalhar para manter a ordem capitalista dominante, apesar de qualquer evidência que possa minar sua legitimidade. Richard Dawkins, no espírito de Milton Friedman, argumentou que a seleção natural é um processo inerentemente individual e, portanto, uma sociedade não competitiva nunca poderia existir. Neil deGrasse Tyson, enquanto isso, critica regularmente a filosofia e a religião, enquanto aparentemente evita uma crítica estrutural da economia. O que é necessário, diz ele, é simplesmente mais pesquisa:

“Sempre que os cientistas discordam, é porque temos dados insuficientes”, disse Tyson. “Então podemos concordar sobre que tipo de dados obter; obtemos os dados; e os dados resolvem o problema. Ou eu estou certo, ou você está certo, ou estamos ambos errados. E seguimos em frente. Esse tipo de resolução de conflitos não existe na política ou na religião.”

O mundo físico só se tornou mais misterioso graças ao trabalho de Einstein, e muitas das questões centrais em física permanecem sem solução. Enquanto isso, os problemas da política e da religião não foram resolvidos ignorando-os como “irracionais”. Contradizendo a mentalidade supostamente “racional” liberal-capitalista, Einstein exemplificou como uma visão de mundo socialista está enraizada nas virtudes não científicas da compaixão e da moralidade, e ele fez grandes esforços para corrigir seus erros com base em novas informações morais.

Isso foi particularmente o caso depois que ele ajudou a influenciar o desenvolvimento do Projeto Manhattan, uma decisão amplamente divulgada que ele acabou lamentando. Segundo a história, o colega cientista Leo Szilard visitou a casa de verão de Einstein em Long Island em 1939 e explicou a possibilidade de Hitler desenvolver uma bomba atômica. Szilard então redigiu uma carta ao presidente Franklin Delano Roosevelt com essas preocupações, co-assinada por Einstein. Os nazistas falharam em produzir uma arma nuclear (embora não por falta de tentativas), enquanto os EUA usaram seu novo poder de fogo contra o povo de Hiroshima e Nagasaki. Einstein viu esses bombardeios no Japão como uma tragédia, escrevendo em seu livro de 1950 Fora dos Meus Últimos Anos: “Se eu soubesse que os alemães não teriam sucesso em construir uma bomba atômica, nunca teria movido um dedo.”

Com Albert Schweitzer e o colega socialista Bertrand Russell, Einstein fez lobby para interromper os testes nucleares e o desenvolvimento futuro de bombas. Dias antes de sua morte, ele assinou o Manifesto Russell-Einstein, uma declaração que exortava os líderes mundiais a buscar resoluções pacíficas para os conflitos internacionais (e também levou às ainda em andamento Conferências Pugwash sobre Ciência e Assuntos Mundiais): “Diante de nós, se escolhermos”, dizia o manifesto, “está o progresso contínuo na felicidade, conhecimento e sabedoria. Devemos, em vez disso, escolher a morte, porque não podemos esquecer nossas disputas? Apelamos como seres humanos a seres humanos: Lembrem-se de sua humanidade e esqueçam o resto. Se puderem fazer isso, o caminho estará aberto para um novo Paraíso; se não puderem, o risco de morte universal estará diante de vocês.”

O tempo percorreu seu curso na história de vida de Einstein, destilando seu legado em nostalgia por um gênio científico singular. A Guerra Fria e os ideólogos neoliberais também garantiram que a história do socialismo permaneça confusa na cultura americana. Mas o longo padrão de pensamento humanista de Einstein, informado por seu judaísmo, fala sobre os tipos de revelações políticas que podem surgir através da fé e da compaixão. Em “Por Que Socialismo?”, Einstein escreveu:

“O indivíduo tornou-se mais consciente do que nunca de sua dependência da sociedade. Mas ele não experimenta essa dependência como um ativo positivo, como um laço orgânico, como uma força protetora, mas sim como uma ameaça aos seus direitos naturais, ou mesmo à sua existência econômica… Todos os seres humanos, independentemente de sua posição na sociedade, estão sofrendo com esse processo de deterioração. Sem saber, prisioneiros de seu próprio egoísmo, eles se sentem inseguros, solitários e privados do desfrute ingênuo, simples e não sofisticado da vida. O homem só pode encontrar significado na vida, curta e perigosa como é, dedicando-se à sociedade.”

No final das contas, parece que Albert Einstein acreditava que a investigação científica deve ter seu equivalente em um amor altruísta pelo próximo. Em qualquer discussão sobre sua carreira e seu legado, é fundamental observar que sua política permanece inseparável de sua obra de vida.”

Texto original em Current Affairs.