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Entrevista com Jean Luc Melènchon, candidato de França Insubmissa à presidência francesa

Por: Editoria Internacional

A principal surpresa, nessa última semana da campanha eleitoral francesa é, sem dúvida, Jean Luc Mélenchon, o candidato da France Insoumise (França Insubmissa) com o apoio do Partido Comunista Francês. A chance de Mélenchon chegar ao segundo turno é grande, já que as pesquisas apontam empate técnico entre os quatro primeiros candidatos. Hoje fez um comício em Dijon e a novidade foi que houve uma réplica por holograma em seis outras cidades.

Mélencho, que foi militante trotskista, da corrente lambertista na França, ministro durante o governo de Lionel Jospin nos anos 1990, rompeu com o PS para formar o Parti de Gauche (Partido de Esquerda) em 2009. Participou nas eleições presidenciais de 2012, ficando em quarto, com 11,1% (quase 4 milhões de votos).

A entrevista que traduzimos foi realizada com eleitores selecionados pelo jornal Le Parisien. Reproduzimos as principais questões e respostas dadas pelo autor. A entrevista completa pode ser encontrada aqui.

MARTINE BERTRAND. Eu fui sindicalista durante trinta anos, sempre votei na esquerda e em você em 2012. Porém estou decepcionada com a esquerda. Como você pensa que pode convencer os indecisos como eu para votar em você?

Jean-Luc Mélenchon. Você diz que está decepcionada com a esquerda…. Mas eu não chamo isso mais de esquerda. No poder, ela se negou, traiu de todas as maneiras possíveis. Desgastaram-se consideravelmente frente a pessoas que sempre lhes deram confiança. Isso gerou uma angústia, um desgosto, e as pessoas não querem mais ir votar. Eu tento virar a página, mas fazendo outra coisa: não juntando os pequenos e os grandes grupos de esquerda, mas organizando o povo. A prova de que não estou errado são as pesquisas que me dão 20% de intenção de votos.

SOPHIA GHARNOUTI. Você se lamenta de não ter feito aliança com Benoît Hamon?

Eu estou, sobretudo, bastante contente de não a ter feito! Veja onde ele está…. Benoît Hamon não é a causa, ele é um rapaz interessante e simpático. O problema é o PS. Eu não me sinto capaz de ver e lhes dizer: eu vou apoiá-los, mas numa embalagem diferente.

MATTHIEU MARCAIRE. Mas não há uma parte de ego na sua recusa?

Ter saído do PS, organizado a France Insoumise, seria só uma questão de ego? Não, são problemas políticos de fundo: Hamon quer fazer uma maioria presidencial com deputados que votaram o contrário do que está escrito em nosso programa. Eu não posso considerar concebível a revogação da Lei El Khomri com a Ministra El Khomri! Esse governo enganou as pessoas, martirizou os pobres.

MARTINE BERTRAND. Se no próximo domingo, Macron e Le Pen forem para o segundo turno, você dará uma consigna de voto?

Isso não vai acontecer. Eu estarei no segundo turno.

Frente a frente, você quer verdadeiramente ser presidente?

Essa é uma questão engraçada. Eu não sou da cultura da minoria permanente. Quando eu me apresento numa eleição, é para ganhar. Eu me comporto como um homem que está pronto para governar. Eu conheço bem meus dossiês, se eu for eleito presidente, eu saberia exatamente pelo que começar. Isso nunca esteve tão perto de se realizar, o que seria um acontecimento mundial. Eu escuto ou leio que me retrataram como alguém da extrema esquerda. Se este for o caso, eu pergunto o que é Poutou [candidato do Nova Partido Anticapitalista]…. Não, eu não sou da extrema esquerda.

ÉRIC ANGIBOUST. Com quem você governará?

Haverá eleições legislativas e logicamente os franceses me darão uma maioria. Governarei com aqueles que quiserem participar, mas sobre um programa a ser aplicado. Eu tenho o suficiente para montar cinco, seis governos com pessoas de todas as áreas e perfeitamente capazes de dirigir o Estado.

(…)

OPÉLIE MENDES. Eu sou estudante, mulher, de uma minoria étnica…

Que é uma minoria na República?

Eu sou uma mulher negra, afrodescendente e isso é um obstáculo para conseguir um emprego… O que você pensa em fazer para os jovens diplomados ou sem diploma, precarizados, que buscam um emprego?

A primeira condição é de retomar a geração de emprego. Quando há trabalho, os pedidos estão cheios e o empregador contrata. Mas é necessário também penalizar o trabalho precário. Encorajá-lo significa reduzir as pessoas à condição de escravos. Eu proibirei os postos precários em todos os lugares onde for possível. No serviço público estatal, eu desejo tornar permanentes todos os contratos precários, notadamente na saúde. No setor privado, eu limitarei o trabalho precário a 5% nas grandes empresas e a 10% nas menores. Enfim, lamento que os jovens sejam obrigados a trabalhar ao mesmo tempo em que estudam. É por isso que implementarei um seguro de autonomia de 800 € para os universitários como teste. Salvo para os jovens, o ensino profissionalizante, de que poderão todos se beneficiar a partir dos 16 anos: eu não aceito mais que a metade da juventude da França que está como aprendiz ou no ensino tecnológico seja mal paga ou trabalhe no domingo ao invés de estudar.

ANISSA BEKKAÏ. Você irá suprimir a Lei El Khomri ?

Sim, pois ela destruiu a ordem pública. O acordo de empresa pode revogar o acordo coletivo e a lei trabalhista em condições que ele seja mais favorável. Não deve se deixar tudo para a negociação nas empresas: isso faria com que se tivesse um código de trabalho por empresa. É o que propõem Macron e Fillon. Veja o que se passou na Conti: eles negociaram o rebaixamento dos salários e o aumento da jornada de trabalho. E quando eles tinham chupado muito sangue, eles disseram: fecharemos! Eu digo ainda que a Lei El Khomri contém medidas brutais como o tempo do aviso prévio, que reduz para três dias a mudança dos horários [nos acordos que modificam a jornada de trabalho]. Esta lei retira as mulheres do mercado de trabalho. Ela deve ser revogada.

ÉRIC ANGIBOUST. Os sindicatos politizados não representam mais que 7% dos trabalhadores. Nós, empresários, não conseguimos discutir com sindicalistas que defendem seus interesses, mas apenas com aqueles que defendem seus mandatos. O que propõem você para melhorar o diálogo social?

Os sindicalistas são tratados duramente em nosso país. São os únicos que são objetos de condenação à prisão fechada. Sobre a representatividade, o Medef [principal sindicato patronal] sempre fala que eles representam todas as empresas da França, mas isto não é verdadeiro: representam somente 12% das empresas. Não há eleição para validar a representatividade dos patrões. Se eu for eleito, haverá novamente eleições sindicais patronais. Todas as organizações patronais poderão concorrer e aqueles que obtiverem o nível de representatividade poderão assinar as convenções coletivas. O Medef pode dizer adeus a sua onipotência. Eu abolirei sua monarquia.

DAVID FIÈVRE. Qual é o seu projeto em relação aos impostos?

Aqueles que ganham menos de 4000 € por mês, verão seus impostos baixar e, evidentemente, aqueles que estão no outro lado, pagarão. Eu criarei 14 níveis de impostos para repartir a arrecadação e parar de jogar tudo sobre as costas da classe média. Sim, eu sou pela redistribuição da riqueza. E ela terá lugar se votarem por mim. Não esperem que eu possa me assustar ou que tremerei a mão no momento de decidir.

ANISSA BEKKAÏ. Como financiará a aposentadoria aos 60 anos?

Antes de fazer as contas, é necessário pensar no mecanismo econômico global. Nós temos necessidade de duas vezes menos tempo de trabalho que em 1870 para produzir trinta vezes mais de riquezas. A baixa do tempo de trabalho é um fato objetivo. Devemos reduzir o tempo de trabalho de cada um para trabalharmos todos. É necessário reduzir na semana e eu sou a favor do retorno às 35 horas reais. É necessário reduzir no ano e eu proponho de generalizar a sexta semana de férias pagas pois ela já existe em vários ramos econômicos. E é necessário reduzir o tempo de trabalho na vida. Eu penso que há um momento onde devemos parar de trabalhar e digo que é aos 60 anos. Parar de trabalhar significa parar com o trabalho assalariado, isso não quer dizer que vão parar de fazer tudo, que ficarão trancados em casa. Se ocuparão de seus netos, de seu jardim… ou farão política.

(…)

OPÉLIE MENDES. Houve o caso Adama Traoré, o caso Théo… Que pensa fazer contra as violências policiais, que afetam as minorias, da qual eu faço parte?

Jean-Luc Mélenchon. Eu queria dizer que corta meu coração de ver uma jovem francesa se pensar enquanto uma minoria. Eu estou consciente do que você descreve, mas essa não é minha ideia da França. Suas origens, não é meu tema. Trocamos canções, receitas de cozinha… Ainda você, que deve ser da geração McDo…

Opélie Mendes (cortando-lhe) : não, eu sou vegetariana, quase vegana!

Oh diabo, eu poderia não saber (risos)! Quando tinha 20 anos, era trotskista. E eles, veganos! Eles são revolucionários, como nós éramos, pois eles queriam mudar o mundo banindo o sofrimento animal. Mas, voltando a sua questão: os casos de violência que se repetem não podem mais continuar. Há franceses que têm medo da polícia. Nós estamos num grande país, podemos fazer melhor que isto, não? Começamos por nos perguntar por que determinados comportamentos são criminosos, como de enfiar um cassetete no ânus de um jovem. Eu lamento a política absurda dos números. Eu quero dissolver as equipes especiais de terreno, como os BAC (brigadas anti-criminalidade) que estão impregnadas com uma mentalidade de cowboys. Eu quero também estabelecer a polícia de proximidade… você sabe, aqueles guardas da paz que Sarkozy tirou sarro dizendo que eles eram pagos para jogar futebol com os jovens enquanto eles estava lá gratuitamente. Graça ao reforço dos recrutas (NdT: Mélenchon defende o serviço cívico obrigatório), a polícia estará mais junta a população e você verá que as relações não serão mais as mesmas. Enfim, eu eliminarei o controle de identidade por motivos raciais: se você é branco como eu, jamais será enquadrado. Um jovem da periferia será quatro ou cinco vezes, à força, e ele fica furioso. Todo mundo deveria ficar furioso.

(…)

DAVID FIÈVRE. Sobre a Europa, você pensa numa saída estúpida como Frexit ou numa reconstrução europeia? E como convencerá os parceiros em modificar as regras?

Evidentemente que nós temos necessidade da Europa. A construção europeia está na matriz da esquerda há um século. Mas nós somos dirigidos por ideólogos iluminados, num liberalismo absoluto. Todo mundo compreendeu que a Europa estava no caminho do fracasso. Comigo, o governo alemão terá a surpresa da sua vida: eles verão um francês que lhe diz não. Merkel é racional, mas os presidentes franceses não o são. Schäuble (Ministro alemão da Economia) sabe muito bem que eu não sou Alexis Tsipras: não ficarei dezessete horas num escritório com alguém que me insulta. Eu represento a França, vamos, portanto, discutir. Serei o iconoclasta que destrói tudo? A discussão de um novo tratado já está na ordem do dia. Juncker (o presidente da Comissão) fez quatro propostas. Haverá uma a mais: mudar os tratados, criar critérios de convergência pela harmonização social e fiscal. Eu diria que nós somos a segunda potência da Europa e que sem nós, não há Europa. Esta é minha arma. Os alemães não têm nenhum meio de nos dizer não. Os espanhóis, os italianos, os portugueses, os poloneses, toda uma série de países começam a se cansar! Se os alemães não querem mudar, eu digo que o plano B seria sair com aqueles que estão de acordo para fazer uma refundação.

MATTHIEU MARCAIRE. Você prevê sair da OTAN, de fato da UE, para se juntar à Aliança Bolivariana. Eu não compreendo!

Está é uma invenção pura e simples, fabricadas por um jornalista que precisa publicar sobre a campanha. De início, nem o Irã, nem a Rússia estão na ALBA (Aliança bolivariana para as Américas). Como se pode tomar a sério um imbecil que fala que deixaríamos a UE para entrar na ALBA? Eu proponho que a França se posicione enquanto nação universal: nós estamos instalados sobre os cinco continentes, nós temos o segundo maior território marítimo do mundo. Então falemos sobre as ações. No Caribe e na América Latina, se perguntamos onde está a França, em particular a Guiana Francesa e as Antilhas. Em nenhuma parte! É uma vergonha! Daí o interesse de entrar na ALBA, uma simples aliança de cooperação. É necessário parar de semear o medo! Os mesmos [jornalistas] não disseram uma palavra quando Hollande participou ao conselho de cooperação do Golfo com a Arábia Saudita e o Catar.

A Venezuela é um modelo para você? A imprensa, os sindicatos não são respeitados….

Sim, eu conheço toda a propaganda sobre o tema.

Se trata de propaganda?

Sim. Eu não tenho modelo, a França é bastante grande para isso! Porém eu tenho parceiros. Eu discutirei com o diabo se for necessário para o meu país. Essa sempre foi a política de De Gaulle [comandou parte da resistência francesa durante a segunda Guerra e foi presidente do país] e Mitterrand [ex-presidente pelo PS entre 1981-1995]: não discutimos com os regimes, mas com os países. Pouco nos importa quem os dirige.