Alimentar-se no Brasil de Bolsonaro está cada vez mais difícil. Segundo dados da FAO (Organização para a Alimentação e Agricultura), a insegurança alimentar no país entre os anos de 2019 e 2021 atingiu 61,3 milhões de pessoas (praticamente três a cada 10 habitantes), sendo que 15,4 milhões enfrentavam um nível grave de insegurança alimentar. Comparando com a pesquisa anterior (2014 – 2016) 24 milhões de pessoas a mais passaram a sofrer com este tipo de insegurança. Uma verdadeira catástrofe humanitária, confirmada pela pesquisa Datafolha, que mostrou que uma a cada três pessoas passam fome no Brasil – o total de entrevistados que afirmaram ter menos comida em casa do que o necessário saltou de 26% em maio para 33% em julho.
A fome cresce à medida que o brasileiro empobrece e os preços dos alimentos sobem.
Segundo a PNAD Contínua do IBGE para o trimestre abril, maio e junho de 2022, em um ano a renda média real advinda do trabalho do brasileiro caiu 5,1%, e está no menor patamar para este período desde que o IBGE começou a contabilizá-la desta forma, em 2012. Tem cada vez menos salário para comprar comida.
Já a inflação de alimentos se intensificou desde o início da pandemia. Em 2020 a inflação de alimentos e bebidas foi de 14%, em 2021 foi de 7,9% e até julho de 2022 (IPCA-15) é de 9,7%. Isto é, em dois anos e sete meses os preços de alimentos e bebidas no Brasil subiram 35%.
Alguns itens do carrinho ficaram como casos mais exemplares. Os óleos e gorduras (incluso o óleo de soja) mais do que dobrou de preço desde 2020 (+109%). Os cereais, leguminosas e oleaginosas (como arroz, milho e feijão) aumentaram 48% neste mesmo período. A carne subiu 19%. E agora o que anda chamando mais a atenção é o preço do leite, que acumula alta de 61% desde 2020, sendo que neste ano a inflação do leite e derivados já é de 30%. Segundo o IBGE, os preços do leite e derivados, das frutas, do feijão e do pão francês foram os que mais subiram em julho.
Para sermos mais precisos, isto não é um problema só do Brasil. Segundo o FAO Food Price Index, nunca os preços globais dos alimentos estiveram tão altos. No ano de 2022, o índice atingiu o patamar de 148 (a FAO utiliza como base os anos de 2014-2016, ou seja, a média de preços daquele ano é igual a 100, sendo assim já que 2022 o número índice é de 148, ele está 48% acima do valor real daqueles anos). A última vez que os preços dos alimentos chegaram a um patamar próximo foi no ano de 1974 (índice de 137). Estamos em um momento em que o mercado capitalista global gera mais fome do que a média.
Gráfico – Variação do índice Fao Food Price (1962 a 2022)
Fonte: FAO. *Neste gráfico, o período 2014-2016 equivale a 100.
Com a deterioração cambial, o cenário local piora ainda mais. Desde que Paulo Guedes assumiu o Ministério da Economia o Real já desvalorizou 29%. Os preços globais subiram, mas em reais aumentaram ainda mais.
Brasil, um país produtor de alimentos
No entanto, o Brasil não é um país não-produtor de sua própria comida, que deve pagar necessariamente o preço internacional para importar carne, arroz, soja, feijão e outros alimentos do dia-dia do brasileiro. À exceção do trigo, o Brasil produz a maior parte do que é considerado básico na nossa alimentação cotidiana. Inclusive é grande produtor de todos os itens citados anteriormente neste texto.
Sendo assim, é possível fazer política pública para atacar a inflação de alimentos e garantir que menos brasileiros passem fome. Não só possível, como necessário e urgente.
Por exemplo, desde a virada liberal da política econômica (2015-2016), a política de estoques de alimentos por parte da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) foi sendo abandonada, e hoje ela é praticamente inexistente para a maioria dos itens. São produtos como arroz, feijão, milho, soja, trigo e café que tinham seus grandes estoques liberados quando os preços estavam muito elevados, com o objetivo de impactar na oferta, e assim diminuir preços. Hoje isso simplesmente não existe mais.
Além disso, as políticas de produção de agricultura familiar também foram sendo escanteadas. Este tipo de agricultura, que é responsável por três quartos do que os brasileiros têm à mesa, poderiam sustentar uma rede de distribuição, em alternativa aos grandes conglomerados, para facilitar o escoamento da produção local e garantir comida na mesa a preços justos e sem o risco à saúde de quem consome, representados em alimentos transgênicos e com agrotóxicos.
É urgente o debate de um programa na esquerda brasileira para ser apresentado neste ano a fim de impedir que a fome continue a alastrar em um dos países que mais produz comida no mundo.
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