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BRASIL

Derrotar o ecocídio bolsonarista com Lula Lá, Boulos em São Paulo, mas sem Alckmin e a direita neoliberal

Desde o golpe de 2016, destruição e retrocessos

Thalles Monari, de São Paulo, SP
Foto mostra uma represa do sistema cantareira. Na frente da represa, onde deveria ter um volume de água, vemos o solo de terra seco e rachado, com uma pequena poça próximo da parede da represa. Acima, o céu azul., sem nuvens.
Divulgação / Sabesp

Sistema Cantareira durante a crise hídrica de São Paulo, no governo Alckmin

O golpe parlamentar de 2016, impulsionado pela Operação Lava Jato e orquestrado por Michel Temer, então vice-presidente do governo petista de Dilma Rousseff, alterou a correlação social de forças no Brasil e abriu caminho para um novo ciclo no país, que impôs ao conjunto dos trabalhadores e trabalhadoras sucessivas derrotas, como o avanço dos ajustes econômicos ultraliberais e a retirada de direitos históricos conquistados com a Constituição de 1988, aprofundando assim a desigualdade social e econômica.

Esse ciclo de ataques aos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, se aprofundou com a abertura de uma situação reacionária instituída em 2018 com a ascensão de uma extrema-direita violenta, organizada e com ampla capacidade de influência social e eleitoral, que alcançou maior audiência com a eleição de Bolsonaro, cujo governo desde então, está em constante ofensiva aos direitos sociais, as liberdades democráticas e contra o conjunto dos setores oprimidos da sociedade, incentivando a misoginia, o racismo, capacitismo e LGBTfobia. Esses fatores combinados, contribuíram com a localização defensiva da esquerda brasileira nos últimos cinco anos, e logo, com o retrocesso da consciência da classe.

Esse projeto de destruição em larga escala desde o golpe parlamentar, encontrou no meio-ambiente seu principal alvo, sobretudo a partir de 2018, com Bolsonaro e Salles, que se posicionaram frontalmente contra a preservação ambiental, mirando especialmente na Amazônia e nos povos tradicionais, com uma postura negacionista sobre a emergência climática que assola o planeta e com um projeto ecocida que foi implementado desde o primeiro dia de mandato, devastando de maneira elevada os principais biomas brasileiros.

Das manchas de óleo que tomaram as praias do Nordeste às queimadas massivas na Amazônia e no Pantanal, a política ambiental do governo Bolsonaro foi responsável por atingir recordes de destruição na maior floresta tropical do planeta, causando o desaparecimento da vegetação e ameaçando o futuro do nosso país e do mundo ao impactar diretamente no aumento da emissão de gases de efeito estufa. É um governo sinônimo de colapso ambiental, graças ao desmantelamento na política de defesa do meio-ambiente, marcada por cortes orçamentários, pelo desmonte de políticas públicas para fiscalização e planos de combate ao desmatamento e o enfraquecimento de órgãos ambientais. 

Parte dessa ofensiva é direcionada aos povos originários, que sofrem com as consequências da política ecocida do governo Bolsonaro, que paralisou completamente o processo de demarcação de terras indígenas no Brasil, prejudicando a proteção ambiental, a biodiversidade e o controle climático, multiplicando assim as invasões para exploração ilegal de riquezas naturais, tornando o período extremamente favorável para o agronegócio, o garimpo, a mineração, madeireiras ilegais e grileiros.

Com uma Frente de Esquerda encabeçada por Lula, teremos chances de derrotar Bolsonaro

Diante deste cenário de caos e destruição, a tarefa prioritária que se coloca para a esquerda brasileira na atual conjuntura é uma tarefa da maior importância, desde pelo menos a luta pelas Diretas Já, pois implica em interromper um governo com aspirações neofascistas e conter o avanço de uma extrema-direita que demonstra grande poder de ação, resiliência e possui no interior de sua estratégia, um programa que deseja impor ao conjunto dos trabalhadores e das organizações de esquerda do país, uma derrota histórica, através da subversão do regime democrático.

Não pode haver vacilação, tampouco outra prioridade enquanto o governo Bolsonaro estiver de pé. A situação do Brasil é grave, pois ainda estamos submetidos aos efeitos da pandemia da COVID-19 sob o risco de uma quarta onda com a nova variante ômicron, com a fome se espalhando e o país sendo castigado pela carestia de vida, uma brutal recessão econômica com alta da inflação e o desemprego atingindo níveis muito elevados, que têm deixado o povo brasileiro na miséria.

Desconsiderar a força dos neofascistas é perigoso e irresponsável a essa altura, por isso, o melhor posicionamento para a luta pela derrubada do governo Bolsonaro e o enfrentamento ao bolsonarismo, é através da Frente Única de Esquerda, como uma tática defensiva, que compreende o acúmulo de derrotas dos últimos cinco anos, combinado com o avanço da direita neoliberal e da extrema-direita sobre a consciência dos trabalhadores. É uma tática que considera ainda que não estamos em um momento de ascenso de lutas e processos de mobilizações de massas canalizadas pela esquerda, portanto, a luta política nas eleições ganha maior centralidade.

Soma-se a esse diagnóstico os atos pelo Fora Bolsonaro, que marcaram a retomada do protagonismo da esquerda nas mobilizações de rua no ano de 2020 e serviram para construir uma Frente Unitária nas lutas, com uma Campanha Nacional, que mesmo sofrendo pressões de liberais e de alas esquerdistas, foi um importante instrumento da vanguarda, para aglutinar os partidos de esquerda, movimentos sociais, centrais sindicais, movimento negro, coletivos de mulheres, de LGBTQIA+, a juventude, ambientalistas e demais setores que se somaram nas lutas. A Campanha Nacional Fora Bolsonaro cumpriu um papel progressivo na luta contra o bolsonarismo, porém sofreu um refluxo, dada a falta de condições objetivas para avançar com o impeachment no Congresso Nacional. Isso pode ser explicado pela limitação da esquerda e o caráter de vanguarda ampliada nas manifestações, com o peso e influência que o bolsonarismo ainda possui como demonstrado no 7 de setembro e com o compromisso que setores burgueses e forças armadas ainda têm com o governo de extrema-direita.

Neste momento, o povo trabalhador e o grosso da vanguarda depositam suas esperanças na candidatura de Lula como única chance de derrotar Bolsonaro e garantir melhores condições de sobrevivência no país. Devemos ter em 2022, eleições a quente, com as amplas massas populares se movendo junto a Lula, pois a confiança é elevada e sentem, cada vez mais, que é possível alcançar a vitória, já que em todos os cenários até o momento, Lula vence, Bolsonaro perde e a terceira via não decola. Mas há tempo até as eleições e nada está garantido. O que parece correto apostar é que a esquerda terá melhores chances de chegar em 2022 com reais condições de derrotar Bolsonaro se estiver unificada em uma Frente que seja encabeçada por Lula, mas que rejeite aliança com a direita golpista. É aí que mora o perigo…

Alckmin, o novo Temer

Nas últimas semanas, surgiu a notícia de que a direção majoritária do PT estaria articulando para que Geraldo Alckmin seja o vice de Lula na composição à chapa presidencial para o pleito de 2022. A princípio essa notícia parecia mais um blefe do que uma possibilidade real, porém nos últimos dias, o que parecia um rumor sem fundamentos, ganhou novos contornos que indicam a veracidade da notícia veiculada por Mônica Bergamo no jornal Folha de S. Paulo.

Recentemente, quatro importantes centrais sindicais do país (Força Sindical, UGT, CTB e Nova Central), se reuniram com Alckmin e três delas declararam apoio à criação da chapa Lula-Alckmin. Na ocasião, Alckmin não confirmou a intenção, mas disse que seria um bom negócio. Disse ainda que estava se preparando para disputar o governo do estado de São Paulo, mas afirmou que “surgiu a hipótese federal”, uma hipótese que caminha. Segundo Miguel Torres, presidente da Força Sindical, o olho do tucano brilhou ao falar da possibilidade de ser vice de Lula em 2022. Publicamente, tanto Lula como Alckmin não apenas não desmentiram a história, como fizeram declarações elogiosas um ao outro, alegando que suas diferenças não são irreconciliáveis. Alckmin ainda alegou se sentir honrado. Os dois se encontraram na última semana para discutir a possibilidade da formação da chapa visando as eleições presidenciais do próximo ano.

Alckmin, se aceitar ser vice de Lula, terá que buscar um novo partido. O destino pode ser o PSB, que faria essa movimentação como um gesto para Lula e Haddad cederem espaço para a candidatura de Márcio França ao Governo do Estado de São Paulo.

Mas se o objetivo é derrotar Bolsonaro e seu projeto genocida e ecocida que vem destruindo o Brasil, é necessário aliança com um dos maiores agentes da burguesia paulista, que não só apoiou o golpe de 2016 contra Dilma, como também contribuiu para a eleição de Bolsonaro?

Não podemos esquecer quem é Geraldo Alckmin

Das demissões dos metroviários como forma de retaliação por greves, ao superfaturamento nas obras do Metrô, máfia da merenda e o massacre do Pinheirinho. O legado de Alckmin em São Paulo é de profundos retrocessos e ataques aos trabalhadores, aos direitos sociais, trabalhistas, escândalos de corrupção e uma política de morte na área da Segurança Pública. Seus governos estavam a serviço da classe dominante e foram centrais na ofensiva tucana e da burguesia paulista em um projeto elitista e reacionário.

O tucano encontrou também no meio-ambiente, um flanco para aplicar sua política de desmonte e promoção de lucro para o capital, através da flexibilização no controle e proteção ambiental, privatizações, sucateamento dos parques estaduais e pouco investimento em políticas públicas voltadas ao meio ambiente, saneamento e planejamento dos recursos hídricos.

Em 2015, São Paulo enfrentou a maior crise hídrica de sua história, obrigando a SABESP a sobrecarregar outros sistemas produtores como Guarapiranga, Alto Tietê e Rio Grande, deixando o sistema Cantareira à beira de um colapso, com os níveis mais baixos já registrados, prejudicando o abastecimento de água para a população paulista. Essa sobrecarga gerou contaminação por todo o sistema de abastecimento da região metropolitana do Estado, obrigando a um racionamento de água, que atingiu a população de maneira desigual, afetando os trabalhadores residentes dos bairros periféricos de forma mais drástica, deixando-os sem água por dias, já que os bairros mais pobres dependiam exclusivamente do abastecimento direto por não possuir um sistema de reserva disponível. Foram esses trabalhadores, que estiveram na linha de frente lidando diretamente com o caos instalado em São Paulo, dando conta das obras e manobras emergenciais para contenção da crise e atendimento à população em geral.

Um ano antes, o então governador Geraldo Alckmin, ocultou informações da real situação de crise de abastecimento, durante as eleições de 2014. Além disso, priorizou seus acordos junto à iniciativa privada em detrimento do investimento em políticas públicas, inserindo a lógica de mercado sobre a SABESP, colocando o lucro acima da universalização do saneamento e ignorando a necessidade de novos sistemas de reservas e o controle e redução da perda de água.

A gestão do tucano foi marcada pelo sucateamento dos parques estaduais, com o aprofundamento das terceirizações, ausência de novos concursos e o esvaziamento do corpo técnico da CETESB (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo). Com isso, os parques estaduais foram dos mais afetados, ficando em situação de abandono e degradação. Em 2013, foi aprovado um projeto de lei que autorizava o governo estadual chefiado por Alckmin, a conceder à iniciativa privada, 25 parques estaduais, além de áreas de manejo e de conservação florestal no interior do Estado. Isso abriu caminho para a exploração dos parques e das matas, deixando trabalhadores responsáveis pela preservação e combate ao desmatamento ainda mais vulneráveis contra caçadores e a mineração clandestina. 

Sem o controle dos órgãos fiscalizadores, o descarte residual irregular, aterros clandestinos e a contaminação da água se tornaram recorrentes. Também foi Alckmin quem passou como um rolo compressor por cima do CONSEMA (Conselho Estadual de Meio Ambiente), onde conseguiu aprovar a licença para a construção do trecho norte do Rodoanel em plena Reserva da Serra da Cantareira.

O que queremos? Uma Frente de Esquerda com Lula e sem a direita, para reverter o legado do golpe!

Perante o duro quadro de retrocessos e destruição do nosso país, precisamos lutar por uma candidatura que unifique a esquerda sob um programa de combate às injustiças sociais e a desigualdade. Isso implica objetivamente na reversão da EC 95 do Teto de Gastos e das contrarreformas trabalhista e da previdência, que possa abrir caminho para a garantia do direito à moradia digna, à soberania alimentar, enfrentamento ao projeto de segurança pública amparado no racismo estrutural, acesso à arte e cultura para o povo trabalhador e o fortalecimento do SUS e da educação pública.

Precisamos de um programa que supere o erro de tratar o ambientalismo como mero enfeite em suas pautas e compreenda a crise ecológica global e a emergência climática que ameaça o futuro do planeta, dando centralidade para as políticas de proteção ambiental, da biodiversidade nacional, das terras indígenas, de quilombolas, ribeirinhos, trabalhadores rurais e camponeses. Um projeto político que enfrente a ofensiva do agronegócio e busque promover políticas de justiça socioambiental e climática.

Mas não será possível alterar a correlação social de forças e avançar com um programa de combate às injustiças sociais, com um vice golpista. Só uma unidade eleitoral das esquerdas, em torno de um programa profundamente antineoliberal, construído a partir dos movimentos sociais, terá capacidade de avançar no enfrentamento às desigualdades. E é justamente em São Paulo, lugar que Alckmin governou e deixou um legado de destruição, que essa unidade tem potencial e terreno para avançar, com Lula lá e Boulos aqui. 

Com uma trajetória marcada pelo enfrentamento ao golpe de 2016, aos abusos da Lava Jato e a defesa intransigente de #LulaLivre, Guilherme Boulos já possui moral e autoridade política suficientes para liderar uma Frente das Esquerdas em São Paulo. Em 2020, foi porta-voz de um movimento de ampla unidade nas eleições municipais, com um programa de enfrentamento ao bolsonarismo e à direita tradicional, que o levou ao 2º turno na capital paulista.

A tentativa de Lula e da direção majoritária do PT de ampliar seu leque de alianças, para fazer gestos a burguesia e viabilizar sua candidatura, se mostra equivocada, pois impede que um programa de esquerda seja apresentado, que consiga enfrentar a herança do golpe de 2016 e os principais problemas que castigam o povo trabalhador. Além disso, corre o risco de ferir as expectativas e o entusiasmo dos setores de massas. Enfrentar o bolsonarismo, em aliança com a burguesia, nos marcos da luta política eleitoral é um erro. Devemos lutar por uma Frente de Esquerda encabeçada por Lula, com Boulos governador em São Paulo, mas sem Alckmin e a direita neoliberal.

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