No domingo (11/07) tomamos conhecimento, pelas redes sociais, dos casos de agressão praticados pelo DJ Ivis contra sua ex-esposa, Pamella Holanda, o episódio gerou grande comoção em todo o país. Porém, Pamella não é a única, infelizmente. É só mais uma entre milhares de mulheres, que nesse Brasil governado e estruturado por homens misóginos que estão dirigindo a política, a economia, o sistema judiciário e tudo mais que estrutura nossas vidas, nos fazem vítimas de muitas violências. Não a toa os agressores nos isolam de convivência social e nos querem como dependente financeira deles. O mais cruel porém para nós é a dependência emocional: somos aprisionadas em relações abusivas.
As violências contra Pamella iniciaram ainda com poucos meses de relacionamento e quando estava grávida. Pamella teve que interromper sua vida (estudos, trabalho, acesso a dinheiro, etc) para dedicar-se a um agressor que poderia matá-la a qualquer instante. Traições também faziam parte do pacote de violências contra Pamella. O medo a paralisava e a levava à submissão. Um elemento muito presente na vida dela assim como nas de todas nós foi o de acreditar e desejar que o agressor pudesse mudar, acreditando num falso ideal de que a ‘família feliz’ é construída como responsabilidade fundamentalmente da mulher e nunca do homem, o que permite uma dominação absurda do homem sobre a mulher.
São tantos os elementos que normalizam e permitem as violências que fica difícil não cair nessas relações. Crescemos ouvindo que “em briga de marido e mulher, não se mete a colher”, o que leva ao abandono e a falta de apoio às vítimas. Somos facilmente conduzidas à dominação. No caso de Pamella, de nada adiantou a mãe do agressor morar com o casal e ser testemunha das agressões que o filho praticava, por exemplo.
Pamella procurou ajuda da vizinha, da polícia, denunciou e felizmente tinha provas contra ele e mesmo assim seu agressor segue solto. Felizmente, porque na medida que nós mulheres não provamos materialmente que somos as vítimas, nossa voz não tem valor algum nessa sociedade machista, sempre somos questionadas.
Pamella procurou ajuda da vizinha, da polícia, denunciou e felizmente tinha provas contra ele e mesmo assim seu agressor segue solto. Felizmente, porque na medida que nós mulheres não provamos materialmente que somos as vítimas, nossa voz não tem valor algum nessa sociedade machista, sempre somos questionadas.
Onde e como nos fortalecer, encontrar acolhimento, nos encorajar? Mesmo com provas, a atitude do agressor foi de tentar mudar a narrativa, tentando se passar de vítima nas redes sociais, entrou com um processo contra Pamella no dia 11/07 e o mais estarrecedor é saber que o desgraçado ganhou mais de 200 mil seguidores. Por essas e outras, agressores continuam fazendo esse movimento de mentir na cara de pau. A lista de famosos que estupram, batem, matam e ficam ainda mais famosos só cresce no Brasil(goleiro Bruno, Neymar, Kadu Moliterno, Dado Dolabella, Frank Aguiar, etc).
Atitude semelhante fez Marcius Melhem, o assediador de Dani Calabresa, que depois de denunciado pela vítima amedrontada, foi às redes sociais culpar a vítima, deu entrevista e ainda entrou com processo na justiça e teve ganho de causa contra quem se solidarizou com Dani Calabresa, como os colegas Marcos Veras, Felipe Castanhari e até Rafinha Bastos. Por pouco o machista Danilo Gentili, que fez um comentário no twitter em favor de Calabresa, não foi obrigado a pagar indenização ao assediador Marcius Melhem.
Como acreditar ou confiar nessa justiça carregada de machismo? Como não falar em (in)justiça e não lembrar das violências sofridas por Mari Ferrer. E olha que são casos de mulheres brancas, as vezes famosas e bem financeiramente, comparadas a maioria das mulheres, em geral pobres e negras que são obrigadas a seguir adiante nas relações abusivas.
O que justifica o comportamento desses homens agressores se não uma formação cultural de séculos que conta com o apoio de outros muitos e de instituições que banalizam denúncias e até fortalecem os agressores e não as vítimas?
Sim, nosso inimigo é secular mas nossa luta também vem de longe. Ainda que monstruoso e gigantesco não está escrito na pedra que não possa ser vencido. E mesmo que estivesse, nossa luta seguiria merecendo ser lutada porque são de nossas vidas e das vidas de nossas mães, filhas, irmãs, primas, amigas, vizinhas entre tantas outras de que estamos falando. O feminismo nos fortalece e precisa ser abraçado por todas nós e todos nós. Não existe a possibilidade de construção de qualquer mundo justo que seja sem que a justiça chegue a todas as mulheres. É preciso dotar os movimentos sociais organizados de uma forte posição feminista para ao mesmo tempo tornar o feminismo um forte movimento enraizado sobretudo entre as mulheres e homens de nossa classe. Estamos cansadas há tempos de tantas violências, mas se enganam os que pensam que seremos vencidas pelo cansaço.
*Anna Karina Cavalcante – feminista, professora, militante da Resistência Feminista/PSOL
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